O Globo
Aliados admitem que Lula precisará colaborar,
na retórica, com o esforço do ministro da Fazenda
Um diagnóstico curioso parece ter se
consolidado em diferentes gabinetes de Brasília, nos três Poderes, no raiar
deste 2025 que abre o segundo biênio de Lula 3: trata-se de um governo de
minoria, e assim terá de navegar até a eleição.
A lógica que conduzirá a reforma ministerial
será a de tentar virar esse jogo, mas os mais realistas com quem se conversa
não acreditam que isso acontecerá, por vários motivos.
O principal deles é o que os mais
experimentados nos meandros do poder chamam de parlamentarismo de fato — que
teria sido implementado com a captura de um naco substancial do Orçamento pelo
Congresso.
Nem Rosa Weber nem Flávio Dino conseguiram, com suas sucessivas decisões tentando disciplinar as emendas parlamentares, fazer o gênio voltar para a lâmpada.
Diante disso, ministros de Lula e do STF coincidem no receituário realista que deveria ser adotado pelo presidente para seguir nos dois próximos anos: tentar encontrar um mínimo de equilíbrio para o futuro e deixar que a Polícia Federal cuide dos escândalos sobre o que foi derramado em estados e municípios sem nenhum controle até agora.
Também existe na capital federal um clima de
otimismo meio ingênuo, de que a saída de Arthur Lira e sua substituição pelo
mais afável Hugo Motta vá mudar a tática de faca permanentemente no pescoço do
Executivo para que se vote qualquer coisa na Câmara.
Pode até ser — embora não se deva esquecer
que Motta só se viabilizou quando foi colocado debaixo da asa de Lira. Mas não
se pode ignorar que, na Casa ao lado, sai Rodrigo Pacheco, que sempre procurou
manter uma aura de estadista, e entra Davi Alcolumbre, que pode fazer qualquer
um suspirar de saudades de Lira, dada sua voracidade por poder e recursos
orçamentários.
Como, então, fazer com que vigore a lógica de
governabilidade mais comezinha, aquela que determina que a um ministério
ocupado por um partido correspondam os votos daquela sigla nas duas Casas do
Legislativo?
Ninguém sabe ao certo, e o risco real é que a
reforma troque seis por meia dúzia, e Lula siga tendo uma maioria nominal
folgada, que não existe na hora em que se abrem os placares de votação.
Só uma ampla reforma constitucional, admitem
próceres do Judiciário e da política, poderia reverter a anomalia implantada na
gestão orçamentária pelo menos desde Dilma Rousseff, agravada sob Jair
Bolsonaro. Mas fazer esse tipo de mexida num governo de minoria, apontam os
mesmos observadores, pode resultar num desastre ainda maior.
Melhor ir tocando a bola de lado, então, e
apostar que a economia estará bem em 2026 para levar os partidos que estão
ganhando muito e entregando pouco a subir no palanque de Lula 4 ou de quem o
presidente escolher, caso decida não ser candidato ou não tenha saúde para
tanto.
A aposta, nesse ponto, recai sobre o sucesso
das medidas de Fernando Haddad no sentido de demonstrar aos agentes econômicos
que o governo é fiscalmente responsável. Aliados admitem que Lula precisará
colaborar, na retórica, com o esforço do ministro da Fazenda, até para não
agravar um cenário externo a cada dia mais turbulento, que pode jogar por terra
esse mesmo trabalho de convencimento e manter o dólar nas alturas e em fuga
acelerada do Brasil.
Portanto é como se ao presidente restasse um
cenário de ceder ao Centrão muito para obter um apoio sempre incerto, e medir
as palavras diante de um mundo cada vez mais complexo e refratário ao charme
que ele já exerceu no tabuleiro global.
Parece um receituário ortodoxo que, se levado
ao sempre mercurial Lula, capaz de fazer uma metáfora machista até num ato em
defesa da democracia, será rasgado. A mudança de comunicação anunciada não vai
nessa linha, e sim na de vender realizações do governo que uma parcela da
sociedade simplesmente não enxerga. Se for isso, parece algo fadado a atingir
apenas os já convertidos, o que, para um governo minoritário e que tem apoio de
apenas metade da sociedade, pode ser insuficiente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário