terça-feira, 30 de setembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Fachin acerta ao pregar Supremo longe da política

Por O Globo

Novo presidente do STF faz bem em fugir dos holofotes, mas não poderá se esquivar de questões espinhosas

Na cerimônia de posse como novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Edson Fachin deu o tom que pretende imprimir a sua gestão. “Assumo não um Poder, mas um dever: respeitar a Constituição e apreender limites. Buscaremos cultivar a virtude do discernimento”, afirmou. “Ao Direito, o que é do Direito. À política, o que é da política.” A tônica de seu discurso foi a institucionalidade e o chamado ao diálogo republicano entre os Poderes, sem que o Judiciário fique submetido a populismos. Sua discrição já ficara nítida quando ele recusou qualquer badalação e festa de celebração. É sem dúvida positivo que tente desviar do Supremo os holofotes que, nem sempre com razão, se voltam para a Corte e seus ministros. Mas será preciso agir com determinação quando necessário. O STF não pode se esquivar de enfrentar questões espinhosas que volta e meia acabam por desaguar lá.

A linguagem do dinheiro. Por Merval Pereira

O Globo

As negociações entre Brasil e Estados Unidos têm de deixar a política de lado e focar nas trocas comerciais

Como a política brasileira é muito fluida, essa afirmação é arriscada, os tempos recentes estão aí a nos mandar não ter pressa para afirmações definitivas. Se Lula cometer erros grosseiros, ou se a saúde não permitir, ele voltará a pôr em risco sua provável vitória. A pouco mais de um ano das eleições, sua proverbial sorte lhe deu uma saída magnífica com a desastrada ação de agentes de Bolsonaro em solo americano, desvelados como agentes antinacionais a serviço de Trump.

Se a aparente vitória de Lula nessa disputa permitir que ele aja como estadista, e não como reles politiqueiro, terá um caminho aplainado pela frente, pois a direita submissa ao ex-presidente erra dia sim, outro também. Caso contrário, a hubris, palavra grega que significa confiança desmesurada que leva alguém a superestimar suas capacidades, fará com que perca essa oportunidade rara que ganhou. Brincar dizendo que levará a primeira-dama, Janja, ao encontro com Trump pode sugerir esse estágio de soberba.

País precisa de um Congresso renovado. Por Fernando Gabeira

O Globo

Agora ficou mais evidente que Lula será reeleito, porque a oposição pisoteou algumas de suas próprias bandeiras

Semana passada, um hater me chamou de Matusalém. Só para contrariá-lo, farei algumas previsões sobre o futuro. Não um futuro distante, mas os poucos anos que me restam.

Minha filosofia é a do poema “Quando vier a primavera”, de Fernando Pessoa: Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem./Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele./Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.

Por enquanto, ainda há o que fazer. Vejo o Brasil numa encruzilhada e o mundo como um espaço absurdo, onde a mensagem do homem mais poderoso é sobre uma escada rolante emperrada, e algumas aberrações como o perigo das energias alternativas.

O mundo que as redes criaram. Por Pedro Doria

O Globo

Os grupos se fecharam no entorno da identidade comum e passaram a ver o resto da sociedade como rival

O período que se seguiu à morte do ativista de direita americano Charlie Kirk foi intenso. Muita gente foi demitida, muita gente foi cancelada, muita gente foi calada — e não só nos Estados Unidos, também aqui no Brasil. A maioria era, essencialmente, responsável pelo terrível crime de mau gosto. Dizer coisas fora do tom, desagradáveis, porque não gostavam de Kirk. Não faltou quem comparasse o comportamento das massas canceladoras da direita aos muitos canceladores de esquerda. Porque, afinal, o comportamento foi rigorosamente o mesmo.

Pois é, nos tempos da internet, uma das coisas que viraram tabu é comparar esquerda com direita. Afinal, a extrema direita no Brasil tentou um golpe de Estado, nos Estados Unidos promove o descrédito do sistema eleitoral, na Europa o partido alemão AfD quer vestir roupa nova no velho nazismo, e a xenofobia corre solta. Assim, para qualquer tentativa de fazer comparação, alguém tira da manga a carta da falsa equivalência. Isso não muda o fato à nossa frente. A direita trumpista se comportou igualzinho à esquerda woke. Tem explicação. Uma explicação que envolve redes sociais e ajuda a compreender a crise democrática.

Recados da posse de Fachin. Por Míriam Leitão

O Globo

Em sua posse no STF, Fachin deixou claro que defesa da democracia e dos direitos de grupos discriminados serão centrais em seu mandato

A posse do ministro Edson Fachin na presidência do Supremo Tribunal Federal foi um momento de forte defesa da democracia, e de tudo o que compõe um regime constitucional, a garantia dos direitos de populações discriminadas e vulneráveis. Não houve meias palavras. Elas foram ditas inteiras, em todos os discursos, principalmente no da ministra Cármen Lúcia, e no do juiz que, nos próximos dois anos, será o chefe do poder Judiciário brasileiro.

— Ao Direito o que é do Direito, à política o que é da política — disse Edson Fachin, demarcando o terreno que tem estado dominado pelo conflito e pela acusação recíproca de invasão de áreas de competência.

— A espacialidade da política é delimitada pela Constituição. A separação dos poderes não autoriza nenhum deles a atuar segundo objetivos que se distanciem do bem comum. O genuíno estado de direito conduz à democracia — completou Fachin.

Autocontenção de Fachin não resistiu à posse. Por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Se alguma contenção haverá, será nos modos e costumes da Corte e não nos propósitos ou no poder de agenda e pauta daquele que a conduzirá por dois anos

A promessa de autocontenção do novo presidente do Supremo Tribunal Federal se desmanchou na largada. Com 19 páginas, além de uma nominata dobrada, o discurso de posse do ministro Edson Fachin durou uma hora. E mostrou que se alguma contenção haverá, será nos modos e costumes da Corte e não nos propósitos ou no poder de agenda e pauta daquele que a conduzirá por dois anos.

No lugar de intérpretes da música popular brasileira cantando à capela no plenário, o hino nacional ficou por conta do “Supremo encanto”, o coral da Corte posicionado numa abertura lateral com todos os integrantes de meia-idade vestidos com uma longa bata azul. No lugar das festas de posse financiadas por associações de magistrados, entrou café e água. Mal deram conta do calor de um plenário superlotado mas suscitam algum alento à expectativa de que Fachin coloque o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que também presidirá, no combate à magistocracia (“Antes mesmo dos direitos, temos deveres a cumprir”) com a criação de um Observatório de Integridade e Transparência.

O ‘novo STF’ com Fachin. Por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Fachin: sem festas e política, com pragmatismo, diálogo e muita discrição

“Ao Direito o que é do Direito, à política o que é da política.” Com essa frase machadiana, o novo presidente do Supremo, Luiz Edson Fachin, disse a que veio e mandou um recado claro para Legislativo, Executivo e o próprio Judiciário, que vivem às turras e driblando a Constituição, que determina independência e convivência pacífica entre os Poderes e que todos juram respeitar.

Fachin nasceu em berço simples, veio da magistratura e traz o vício, ou melhor, a cultura da discrição e de falar “para dentro”, diferentemente de seu antecessor Luís Roberto Barroso, que tem origem na elite e vem da advocacia, pratica a eloquência e fala “para fora”. Um vive no mundo do Direito, o outro vive no mundo do Direito, da política, da sociedade.

Fachin não vai cantar. Por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

O cronista tem baixíssima expectativa sobre a gestão de Luiz Edson Fachin à frente do Supremo e celebra somente a certeza, a única certeza, de que o novo presidente do tribunal não cantará. Fachin não vai cantar. Já é muito. Tampouco será visto saracoteando na Sapucaí. Sai o passista credenciado Luís Roberto Barroso. Entra um juiz. Juízes erram. Errado é um juiz que derrota algo – hoje o bolsonarismo, amanhã (de novo) o petismo.

Ninguém aguentava mais ser salvo por Barroso. Custa caro. Fachin se beneficia por contraste. Não que não tenha suas relações e preferências. Nós não as conhecemos. Não lhes somos expostos. Não sendo conhecidas, mais dificilmente se expandirão. Chamam isso de discrição – o mínimo que se espera de um magistrado. Não dará entrevistas, não terá atividades empresariais, não irá a festas bancadas pela corporação (para beija-mão de advogados), nem discursará sobre a nossa miséria e como nos protegeu de nós mesmos. Já é muito.

Fachin assume a Presidência do Supremo para encerrar um ciclo. Por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Discreto, firme e avesso a encontros sociais, muito frequentes em Brasília, o paraíso dos advogados, nem sempre o novo presidente do Supremo votou com a maioria dos colegas

A posse do ministro Edson Fachin na Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta segunda-feira, representa uma mudança de estilo no comando da Corte, pois deve adotar uma postura mais discreta do que Luís Roberto Barroso, que enfrentou um dos momentos mais difíceis da história da instituição: o inédito julgamento de um ex-presidente de República e seus generais por tentativa de golpe de Estado. Fachin, porém, deve promover uma contenção da atuação do STF, que se aproxima da conclusão dos julgamentos dos acusados de tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro.

Fachin é esperança de autocontenção do Supremo. Por Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de S. Paulo

O Supremo vem tomando um papel sempre maior na sociedade e não é de hoje

A base de todo poder e também dos limites ao poder vem do consentimento dos governados

O discurso de Fachin ao tomar posse como presidente do Supremo trouxe uma profunda verdade da filosofia política: "A fé antecede as instituições —e digo isso não necessariamente em sentido religioso, e sim na perspectiva da ciência política. A mensagem é simples: só há autoridade verdadeira quando há confiança coletiva no que é justo."

Com sua fala, o ministro se coloca na tradição filosófica de Etienne de la Boétie e David Hume, que colocou de forma sucinta: "É, portanto, apenas sobre a opinião que o governo se funda". Sejam reis e déspotas ou as modernas Constituições democráticas, cada um deles só tem o poder de moldar a sociedade e comandar obediência porque uma massa crítica da população aceita e acredita —ainda que passivamente— nesse poder.

Novo presidente do Supremo enxerga "exaustão constitucional". Por Ayle quintão

O novo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Édson Fachin, empossado nessa segunda-feira (29),  deve passar a  frequentar  cada vez mais as missas em Brasília.   Devedor dos conselhos da mãe; quando jovem,  vendedor de laranjas nas ruas de Curitiba com o avô , conseguiu cursar e exercer a advocacia e chegar a Presidência  das mais alta Corte de Justiça  do Brasil,   nomeado  pela então presidente Dilma Roussef,  após a aposentadoria do ministro Joaquim Barbosa,  relator do Mensalão. A relatoria do escândalo  o alcançou também, depois da  emblemática morte do então relator, Teori Zavaski.  Nessa mesma condição foi ainda protagonista  no   tal "Joesleygate" -  delitos do governo Michel Temer  - e, ombreando-se com o ministro, Dias Tófoli , ajudou a  enterrar a  corrupção ativa e passiva da Lava Jato..., de intrigante memória. 

O lado bom da briga. Por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Atritos entre Câmara e Senado são produtivos quando impedem que acordos espúrios prosperem

Deputados que prometem retaliação a senadores não parecem satisfeitos com a traulitada levada nas ruas

No conflito de interesses entre a Câmara e o Senado, o melhor lado ainda é o da briga. Ao menos enquanto as divergências interditarem acordos espúrios e preservarem o mínimo de decência na condução dos trabalhos no Congresso.

Não é o que parecem pretender deputados que dizem estar preparados para retaliar os senadores por causa da derrubada da PEC da Blindagem e do freio imposto à anistia travestida de dosimetria.

E se Bolsonaro morrer na cadeia? Por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Na pandemia, ex-presidente não se sensibilizava com agravos sanitários e óbitos

STF precisa estar atento à saúde de custodiados, mas não pode violar igualdade republicana

A anistia ampla aos golpistas parece ser carta fora do baralho na agenda política nacional. Uma mudança legislativa que resulte em redução de pena ainda é viável, mas não evitaria que o ex-presidente começasse a cumprir sua sentença em regime fechado.

O caminho menos tortuoso para aliviar a situação do capitão reformado seria o benefício da prisão domiciliar, por causa dos problemas de saúde que ele desenvolveu após a facada que levou em 2018.

Concessão de espaços públicos à iniciativa privada domina o Rio. Por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Estimadas em R$ 120 milhões, obras no Jardim de Alah dividem a população

Prefeitura construções no Passeio Público, mais antigo parque da América Latina

De olho no voto evangélico, a ponto de dizer que "mexeu com Malafaia, mexeu comigo", Eduardo Paes toca o projeto que vai substituir a Cidade das Crianças pela Terra Prometida. O visitante do parque, com 198 mil metros quadrados, em Santa Cruz, na zona oeste, poderá se perder na Torre de Babel e atravessar o Mar Vermelho.

O custo do milagre não foi divulgado. Mas terá o dedo da iniciativa privada, no modelo de concessão, com empresas explorando o espaço público. Foi assim no parque Monarco, em Madureira, e em outras praças da zona norte. Nada contra. A questão é estabelecer urgência, benefícios e limites do negócio.

Edson Fachin toma posse como presidente do STF

 

Fachin discursa como novo Presidente STF

 

Poesia | Quem sabe um dia, de Mário Quintana

 

Música | Beth Carvalho e Zeca Pagodinho - Camarão que dorme a onda leva / São José de Madureira / Dor de amor

 

segunda-feira, 29 de setembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Solução para os Correios é privatizar enquanto é tempo

Por O Globo

Modelo está pronto e ainda há interessados. Com acúmulo de prejuízos, em breve não haverá mais

Uma das primeiras medidas de Luiz Inácio Lula da Silva ao voltar ao Planalto foi retirar os Correios da lista de privatizações. A justificativa alegada foi a opção pelo saneamento da Empresa de Correios e Telégrafos (ECT), de modo que pudesse ser mantida como empresa pública para cumprir sua “função social”. Diante da previsível resistência corporativa numa estatal com 85 mil funcionários, profundamente deficitária, cujos cargos são loteados politicamente, nada foi feito. A atividade postal básica — entrega diária de correspondência em todo o território nacional — não é cumprida sequer em bairros de elite do Rio.

Na mesma toada: mais gastos, mais impostos. Por Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

O governo ainda está precisando de truques para cumprir a meta de déficit zero neste ano

O noticiário tem sido dominado pela política. Faz sentido. Não é todo dia que um ex-presidente é condenado a 27 anos de prisão num julgamento televisionado ao vivo. Além disso, já está na pauta a eleição nacional de 2026, com os eventuais candidatos em plena campanha.

As questões econômicas tornam-se secundárias, e isso até ajuda o governo na busca por mais arrecadação. Mas basta olhar mais de perto, e lá está a equipe econômica naquela mesma toada: elevando os gastos e procurando impostos para fechar as contas, tanto as deste ano como as de 2026.

Temos alguns exemplos.

Dentro do bunker. Por Demétrio Magnoli

O Globo

Eleitorado democrata nos EUA praticamente circunscreve-se às elites detentoras de diploma de educação superior

‘A classe trabalhadora é um grupo racista, xenófobo, misógino, ultrarreligioso e ignorante. A esquerda só pode recapturá-lo incorporando seus pontos de vista e desistindo de seus próprios valores de tolerância, equidade e empatia. O fato de que isso é intragável é a razão por que a humanidade sempre regressa a seu estado mais vil, autoritário e patriarcal.’

Os diagnósticos acima não partem de algum conhecido pensador, mas de um leitor de esquerda, no espaço de comentários do New York Times, junto a uma coluna de opinião sobre a perda da classe trabalhadora pelo Partido Democrata. São relevantes precisamente porque o leitor afirma com clareza aquilo que quase nunca fica explícito nos textos coreografados de líderes ou ideólogos. O leitor delineia uma visão profundamente pessimista sobre o futuro e reconhece implicitamente que os valores da esquerda pós-moderna a inviabilizam eleitoralmente.

COP30, o clima e a favela. Por Preto Zezé

O Globo

Transição ecológica, para ser justa e efetiva, deve começar onde o Estado não chega, ou só chega com repressão e descaso

As mudanças climáticas são, antes de tudo, uma crise urbana. Nas cidades se concentram os efeitos mais visíveis e violentos da emergência climática: enchentes arrastam vidas e histórias, ondas de calor sufocam bairros sem verde, deslizamentos escancaram o abandono das favelas, e a precariedade do saneamento se transforma em vetor de doenças.

Se o impacto é urbano, a solução também precisa ser. O problema é que muitas cidades ainda tratam a pauta ambiental como distante, técnica, restrita a conferências e relatórios em inglês. Mas ela está no esgoto a céu aberto, na rua que alaga, na falta de sombra, no transporte precário, no lixo acumulado onde deveria haver praça, cuidado e vida.

A crise climática tem CEP. E esse CEP costuma ser de favela.

Busão 0800: de Beagá para o Brasil. Por Bruno Carazza

Valor Econômico

Viabilidade financeira de projeto de gratuidade de transporte público tem grande potencial eleitoral se nacionalizado em Brasília

“Eu pego meu balaio lá pra Zona Norte, com mais uma hora estou chegando lá. É o meu único meio de transporte, com sorte eu consigo até sentar. Ai, seria tão bom, se eu morasse no São Bento, na Savassi, no Anchieta ou no Sion.”

“No Balanço do Balaio” é um samba cheio de suingue lançado pelo cantor e compositor mineiro Vander Lee, falecido precocemente em 2016. Narrada de modo cômico, a canção retrata as agruras do usuário de ônibus (“balaio”, na gíria belorizontina) no deslocamento entre a região central e a periferia da cidade: a superlotação, a falta de conforto, o trânsito pesado, a qualidade precária dos veículos e o tempo de vida perdido no transporte casa-trabalho-casa diário.

Com alívio nos preços de alimentos, melhora poder de compra do mínimo. Por Sergio Lamucci

Valor Econômico

Aumenta o poder de compra do salário mínimo em relação ao valor da cesta básica, mas nível de preços da comida continua elevado

Com o recuo dos preços de alimentação no domicílio, o poder de compra do salário mínimo em relação ao valor da cesta básica tem melhorado nos últimos meses. A deflação de alimentos é um alívio em especial para os mais pobres, que gastam uma parcela maior da renda com esses produtos. Essa trégua dos preços da comida parece contribuir para a moderada recuperação recente da popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No entanto, como as cotações de alimentos subiram muito de 2019 para cá, o impacto pode ser modesto, dado o elevado nível de preços desses produtos, mesmo com a queda de junho para cá.

O mito da pacificação. Por Carlos Pereira

O Estado de S. Paulo

A democracia não elimina crises ou conflitos; garante é que sejam resolvidos sem violência

Pacificação do quê? Pacto entre quem? Redução de penas em troca do quê? Anistia que beneficia apenas uma das partes faz sentido? O esquecimento de malfeitos só se justifica quando há ganhos mútuos e equilíbrio entre os lados em conflito.

Há exemplos virtuosos de pactos que envolveram anistia para assegurar a estabilidade em momentos de transição democrática: as negociações entre De Klerk e Mandela pelo fim do apartheid na África do Sul; o Pacto de Punto Fijo na Venezuela, entre AD, Copei e URD; ou a anistia de 1979 no Brasil. Em todos esses casos, havia riscos, ganhos e concessões recíprocas.

Há algo de novo no front. Por Roberto Amaral*

A última semana teve início promissor no domingo, 21 de setembro, pois se ouviu, a lembrar outros eventos, a voz do povo: livre, espontânea, alegre, mas trazendo para as ruas um grito reprimido de inconformismo, um rotundo não! à atonia política que parecia dominar o país, receoso de fazer frente à maré montante da extrema-direita, apresentada como história já acontecida, cantada nas ruas, recitada na imprensa, nos púlpitos, nas portas dos quartéis. As ruas e as praças, o espaço onde o povo atua e faz história, seriam agora o território privilegiado do reacionarismo.
A história parava aí.

Mas o povo, mobilizado, disse não, e com seu gesto pôs de manifesto o torpor de nossas lideranças, políticas e governantes, a anomia dos partidos, o conhecido recesso do movimento sindical.

Fracassada a intentona de janeiro de 2023, julgados e condenados os principais mandantes, articulava-se à luz do dia, no Congresso e fora dele, uma vez mais — e certamente não ainda pela última (a persistirem os vícios letais da conciliação e da impunidade) — a desmontagem do pacto político democrático conquistado com a constitucionalização em 1988, fruto dos 21 anos de resistência à ditadura instalada em 1º de abril de 1964, sustentada enquanto possível pela aliança dos militares golpistas com o grande capital e o apoio político, financeiro e estratégico dos EUA, este mesmo que hoje azucrina o governo Lula.

A democracia não sobreviveu por um triz? Por Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

A conspiração pelo golpe foi abortada endogenamente e não pelas instituições de defesa da democracia

As instituições operam indiretamente quando generais dizem 'não'

Não fosse pela delação premiada de Mauro Cid não teríamos tomado conhecimento do plano e das ações associadas a um possível golpe de estado no país. O golpe foi abortado endogenamente. As instituições aos quais associamos a defesa da democracia não cumpriram nenhum papel direto no controle dessas ações. A sobrevivência da democracia não decorreu diretamente de suas ações.

A qualificação "direta" e "diretamente" nas sentenças anteriores é crítica.

Lula pode ser o presidente da tarifa zero. Por Camila Rocha

Folha de S. Paulo

PT teria trunfo imbatível para 2026, vozes de Junho de 2013 seriam ouvidas e Brasil se tornaria vanguarda mundial

Conquista no transporte alivia bolso dos trabalhadores, melhora economia local e diminui trânsito e poluição

O Brasil é o país com o maior número de cidades com tarifa zero no mundo. Graças aos protestos de Junho de 2013, 136 cidades oferecem gratuidade no transporte público todos os dias do ano.

A medida é uma verdadeira conquista, considerando que a renda gasta com transporte público diário pode superar 20% do salário mínimo. Segundo dados da Mobilize Brasil, um trabalhador que recebe R$ 1.518 compromete 21,73% de sua renda com transporte caso more em Brasília. Se for morador de Curitiba, o gasto sobe para 23,71%. Em Florianópolis, o mesmo trabalhador gasta 27% de sua renda para se locomover na cidade.

Política Econômica? Ou Economia Política? Por Alfredo Maciel da Silveira

Começo reproduzindo breve artigo de Albert Fishlow no Estadão, 20 de novembro de 2022, de quando Lula acabara de ser eleito para o presente mandato. No mesmo dia, eu me permitira fazer um resumo introdutório numa rede social.

Penso que assim exponho nossa reiterada e permanente problemática socioeconômica, reduzida à sua “expressão mais simples”, como se diz tanto na matemática quanto na sabedoria quotidiana.

Já passou da hora de acordarmos para o imperativo do crescimento acelerado e sustentável de nossa economia, base para quaisquer estratégias de mudanças estruturais rumo à justiça distributiva e equilíbrio social! Já não há piores sintomas das nossas ilusões - quanto a políticas públicas populistas conciliadas ao neoliberalismo atávico - do que a flagrante ameaça fascista que nos assalta, aqui, e nos centros do poder capitalista mundial.

Seguem meu resumo de 2022 seguido do artigo daquele grande brasilianista.

Meu resumo.

“Olhem a Taxa de Investimento do Fishlow, de 25% sobre o PIB.”

Poesia | Joaquim Cardozo - Circuito da Poesia do Recife

 

Música | Getúlio Cavalcanti e Maestro Spok - Cantigas de Roda

 

domingo, 28 de setembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Lula precisará ser hábil em conversa com Trump

Por O Globo

Ele deve evitar que discussão enverede para Bolsonaro e se concentrar em comércio e temas da agenda bilateral

Ainda em Nova York, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que, com exceção da soberania nacional e da democracia, “não tem limite” a conversa com o presidente americano, Donald Trump. Foi um evidente exagero. Os limites são claros. Serão ditados pela realidade de países com interesses nem sempre convergentes e de governos com inclinações ideológicas antagônicas. Apesar disso, o Brasil deve fazer o possível para alcançar um acordo com os americanos. A tentativa de golpe perpetrada por Jair Bolsonaro já causou dano demais. O tarifaço e as sanções só alimentam o antiamericanismo. É preciso trabalhar com afinco para superar as tensões. A mera perspectiva do encontro com Trump é sinal de que, até o momento, a estratégia de Lula tem dado certo.

Nação e imperialismo. Por Luiz Sérgio Henriques

O Estado de S. Paulo

A superação do ideário ‘nacional-popular’, bem como do anti-imperialismo unilateral, habilita-nos a uma visão atualizada do cosmopolitismo

Nenhuma dúvida: o pessimismo da razão autoriza um olhar melancólico sobre o mundo em que vivemos. A inteligência artificial e demais frentes do avanço tecnológico convivem com programas políticos regressivos, e os protagonistas desses dois âmbitos, a tecnologia e a política, se misturam de forma incompreensível e cada vez mais perigosa. Diz-nos a razão, esta dama de temperamento cético, que uns e outros, reforçando-se mutuamente, preparam-nos um ambiente de acordo com as piores projeções das antiutopias, nas quais o velho homem e a sociedade de sempre surgem negativamente renovados.

Entrevista: Adam Przeworski: Anistia a Bolsonaro seria um desastre e encorajaria novos golpes

Por Ivan Martinez Vargas / O Globo

Professor da Universidade de Nova York afirma que punição à tentativa de ruptura é necessária para coibir novas ofensivas e avalia que crise global é da esquerda, não da democracia

O cientista político Adam Przeworski, pesquisador sobre a democracia, avalia que uma anistia a Jair Bolsonaro seria “um desastre”. Professor emérito da Universidade de Nova York, o polonês radicado nos Estados Unidos afirma que a condenação do ex-presidente e de militares de alto escalão por tentativa de golpe de Estado é um sinal da força das instituições brasileiras. Segundo ele, não há crise global da democracia, mas um enfraquecimento da esquerda. Partidos de extrema direita, diz ele, podem ser democráticos.

Qual o significado do julgamento de Jair Bolsonaro para a democracia brasileira?

Matar o pai. Por Merval Pereira

O Globo

Sem uma anistia ampla, Eduardo Bolsonaro não voltará à política, muito menos ao Brasil, onde será preso ao desembarcar, pois o processo sobre obstrução à Justiça certamente será encerrado com sua condenação

A luta desvairada do quase ex-deputado federal Eduardo Bolsonaro pela anistia “ampla, geral e irrestrita” não é a favor de seu pai, ou dos condenados pela tentativa de insurreição de janeiro de 2023, mas a seu favor pessoal. Sem uma anistia desse quilate, ele não voltará à política, muito menos ao Brasil, onde será preso ao desembarcar, pois o processo sobre obstrução à Justiça certamente será encerrado com sua condenação, tantas são as provas dadas por ele mesmo ao longo do tempo.

Diz a lenda antiga que os deuses, quando querem destruir uma pessoa, primeiro as enlouquecem. Eduardo e seu parceiro Paulo Figueiredo estão nesse processo de enlouquecimento que os faz perder a noção de suas forças, as avaliando além da realidade. O mesmo processo faz com que Eduardo Bolsonaro se sinta capaz de ser candidato à presidência da República, quando ninguém, nem mesmo seu pai, o quer nessa posição.

Cartas marcadas. Por Bernardo Mello Franco

O Globo

Marcelo Freitas defende anistia a golpistas e impeachment de Alexandre de Moraes

Em 2 de setembro, o Supremo Tribunal Federal começou a julgar Jair Bolsonaro e seus comparsas na tentativa de golpe. Do outro lado da Praça dos Três Poderes, um deputado de terno marrom subiu à tribuna para defender os réus e espinafrar a Corte.

“Gostaria de registrar minha perplexidade em razão de um julgamento que nos parece ter efetivas cartas marcadas”, esbravejou o parlamentar. Ele manifestou “apreço” e “respeito” pelos acusados e disse que a denúncia “nem sequer deveria estar sendo discutida”. Acrescentou que a provável condenação seria “uma vergonha” — para o Judiciário, não para os golpistas.

O autor do discurso foi Marcelo Freitas, dublê de deputado e delegado de polícia. Integrante da bancada da bala, ele despontou na onda bolsonarista de 2018, que encheu o Congresso de militares e meganhas. Agora será relator do processo contra Eduardo Bolsonaro no Conselho de Ética.

Um resistente. Por Dorrit Harazim

O Globo

Dados do morticínio divulgados pelo Ministério da Saúde de Gaza não são mera propaganda do Hamas

Na sessão de sexta-feira da Assembleia Geral da ONU, algumas centenas de delegados de países-membros retiraram-se do plenário quando Benjamin Netanyahu subiu à tribuna. Já era esperado. E não foi a primeira vez. Em anos anteriores, porém, a debandada costumava ser inferior em número, e seu impacto político menor. Desta vez alinharam-se ao Brasil pesos pesados da diplomacia ocidental, que poucos dias antes haviam, por fim, reconhecido a Palestina como Estado independente. Portanto não ouviram quando o primeiro-ministro israelense qualificou esse reconhecimento como “completa loucura”, comparando-o a presentear a organização terrorista Al-Qaeda, logo depois do atentado do 11 de Setembro, com um Estado situado a pouco mais de 1 quilômetro de distância de Nova York.

‘Esbarrão casual’. Por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Aproximação de Trump e Lula é abandono de Bolsonaro e afeta Tarcísio?

A reunião entre Donald Trump e Luiz Inácio Lula da Silva, provavelmente nesta semana, pode resultar numa guinada estonteante não apenas nas relações entre EUA e Brasil, mas na própria política interna brasileira. Trump extrapolou limites para defender Jair Bolsonaro e obteve o efeito oposto. Se a reunião com Lula for minimamente satisfatória, pode significar (ou ser assimilada como) o abandono do ex-presidente.

A ótima reportagem de Felipe Frazão no Estadão, com os bastidores do encontro de Trump e Lula, deixa evidente que não foi um esbarrão casual no acesso ao púlpito da ONU, mas um movimento diplomático muito bem articulado pelos dois países, com Mauro Vieira e Geraldo Alckmin na linha de frente.

A química entre países pode ser mais complexa. Por Rolf Kuntz

O Estado de S. Paulo

Mas os fatos, como comprovam também as tarifas comerciais, podem ser perigosamente mais complicados

Atal química entre as pessoas, citada pelos presidentes Lula e Trump depois de seu encontro na ONU, pode ser importante para indivíduos. Mas o relacionamento entre países parece mais complicado, especialmente quando se trata da famigerada ordem mundial, com tantos interesses – políticos, econômicos e até religiosos – distintos e às vezes conflitantes. Aí se torna mais evidente uma diferença entre o governante americano e o brasileiro, e também entre o americano e dezenas de autoridades de todos os continentes.

O que querem negociar EUA e Brasil. Por Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

A hostilidade de Trump em relação ao Brasil de Lula atingiu um ponto de esgotamento

A disposição de Donald Trump de se reunir com Lula segue um padrão de comportamento adotado pelo presidente americano desde o seu primeiro mandato, calcado por seu desejo de manter a iniciativa. Além disso, pesa o interesse de resolver a questão das tarifas de forma favorável aos EUA.

A hostilidade de Trump em relação ao Brasil de Lula atingiu um ponto de esgotamento. O governo brasileiro deixou claro que não pode reverter decisões da Justiça em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro e às redes sociais. Não pode e nem quer, já que a resistência à pressão impulsionou a popularidade de Lula.

O BC e os juros exorbitantes. Por Celso Ming

O Estado de S. Paulo

Persistem as críticas à política monetária (política de juros) do Banco Central -- embora sejam menos agressivas quando partem de integrantes do governo depois que o presidente Lula encaminhou a nomeação do presidente, Gabriel Galípolo e a de outros membros da diretoria.

Quase sempre essas críticas se limitam a afirmar que os juros aos níveis atuais, de 15% ao ano, são exorbitantes, que encarecem demais o crédito, que derrubam a atividade econômica e o emprego. Mas nenhum desses críticos sugere a adoção de critério diferente do vigente para definição dos juros básicos (Selic). Nem chega a reconhecer que, para os juros baixarem, é preciso estancar sua principal causa, a gastança do governo que empurra o rombo e a dívida pública e semeia desconfiança.

Jovem dirigente do PCB, Magrão foi executado com injeção de matar cavalo. Por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Familiares e amigos não tiveram o direito de realizar um funeral digno para Montenegro, cuja história acabou tão clandestina quanto fora a sua atuação política após o golpe militar

Cinquenta anos após o assassinato, aos 32 anos, a memória de José Montenegro de Lima, o Magrão, jovem dirigente do PCB sequestrado e torturado pelos órgãos de segurança do regime militar, será resgatada por seus velhos amigos, militantes políticos, pesquisadores e representantes de entidades de defesa dos direitos humanos na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, na próxima segunda-feira (29/09), às 18h30, num ato político cuja síntese é a pergunta sem resposta até hoje: "Cadê o Magrão?".

Familiares e amigos de Montenegro não tiveram o direito de realizar um funeral digno para ele, cuja história acabou tão clandestina quanto a sua atuação política após o golpe militar de 1964. Responsável pelo trabalho do PCB com a juventude, sua importante atuação na criação da juventude do antigo MDB e na reorganização do movimento estudantil e do movimento cultural, sobretudo cineclubista, foi um contraponto à atuação de outros jovens que optaram pela luta armada.

Ratinho e o desarranjo das direitas. Por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Governador do Paraná é balão de ensaio e boi de piranha, mas atrai adeptos da frente ampla

Direita está em confusão, mas a articulação política ainda é para lançar Tarcísio

Empresários que participam desses jantares políticos ficaram animados com Ratinho Junior, do PSD, governador do Paraná, que nesta semana foi lançado candidato no circuito São Paulo-Brasília. Ratinho por ora é candidato a balão de ensaio e, decerto, a boi de piranha ou a boneco de manobra diversionista das direitas. As direitas precisam desconversar enquanto dão sedativos aos Bolsonaro e tentam esconder Tarcísio de Freitas (Republicanos) enquanto lavam o governador de São Paulo da lama política que ele tem atirado na testa desde o início de julho.

Trump e Lula. Por Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

Ao contrário do prometido pelos extremistas, Lula só se deu bem e Bolsonaro só se deu mal após tarifaço

Narrativa de que o Brasil seria um barril de pólvora prestes a explodir não resistiu ao confronto com fatos

Donald Trump quer conversar com Lula. Não se sabe sob quais condições, ou com qual grau de sinceridade, ou com qual objetivo.

Mas uma coisa parece clara: já há canais de comunicação entre os governos brasileiro e americano que não passam pelos aliados extremistas de Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo na Casa Branca.

Como surgiu essa brecha? Nos últimos meses, gente ligada ao governo brasileiro e a empresários de vários setores trabalharam para abri-la.

Mas outra coisa também pode ter acontecido: Trump pode ter percebido que a turma de Eduardo e Figueiredo mentiu para ele.

Afinal, se a história contada pelos bolsonaristas fosse verdade, o tarifaço teria produzido efeitos exatamente opostos aos que produziu até agora.