Governador de Minas lidera discussão de novo pacto federativo
Maria Lima
Governador de um dos estados mais ricos do país, o tucano Antonio Anastasia lidera
movimento para que o Executivo federal envie ao Congresso e apoie a discussão e
aprovação de novo pacto federativo. O objetivo é acabar com o desequilíbrio
entre União, estados e municípios tanto em relação à repartição de recursos
quanto à devolução da autonomia dos entes federados para legislar sobre
assuntos próprios de estados e municípios. Anastasia diz que, por ser uma
federação relativamente jovem, não há na consciência brasileira o espírito de
colaboração, cooperação e solidariedade da União para com estados e municípios,
e nem mesmo entre os dois últimos. Reclama dos cortes impostos pela política de
desoneração do governo federal, alegando que está arrebentando as receitas de
estados e municípios sem compensações, enquanto governadores e prefeitos
continuam com obrigação de oferecer os serviços à sociedade.
- Não existe máquina de fazer dinheiro e com a crise as receitas não crescem
- disse Anastasia, em entrevista por telefone ao GLOBO, reforçando que é
urgente que o Congresso aprove novo pacto que devolva competências aos estados:
- Do contrário, melhor que se institua de vez a República unitária, com o
imperador nomeando governadores.
A partir de quando começou a se agravar o desequilíbrio nas relações de
obrigação da União com estados e municípios?
Vou ter que recuar um pouco no tempo. A Federação brasileira é relativamente
jovem, surgiu em 1891. Até 1930 nós tivemos uma Federação bastante equilibrada,
com divisão nítida de competências entre o governo central e os estados
federados. A revolução de 30 centralizou muito no governo central, na ditadura
de Vargas. Depois, na Constituição de 1946, foram devolvidas aos estados as
competências, mas no regime militar tivemos centralização novamente. E a
Constituição de 1988 não conseguiu devolver aos estados as competências que
tinham anteriormente. Primeiro, por haver concentração tributária muito forte a
favor da União, através da figura das contribuições (tributos), hoje a
principal fonte de arrecadação, e que não são compartilhadas com estados e municípios.
Em 1988, houve aumento das atribuições para estados e municípios, sem as
respectivas fontes de financiamento...
Exatamente. De lá para cá, e isso não é questão de um governo ou de um
partido, estamos assistindo gradativamente, desde os anos 60, a uma
concentração exagerada de poder na esfera do governo federal. Isso, para um
país que é uma federação, é uma distorção. Um país do tamanho do Brasil tem
peculiaridades próprias de cada região. É claro que a realidade em Minas Gerais
é uma; no Piauí é outra, e no Rio Grande do Sul uma terceira. Temos que ter
autonomia para lidar com nossas diferenças. A autonomia pressupõe razoáveis
receitas e também possibilidade de auto-organização.
Isso é imposição do Executivo ou também do Legislativo, pressionado a
aprovar medidas sugeridas pelo governo federal?
De todas as áreas. Tanto do Executivo quanto do Legislativo. Nós temos hoje
uma tendência de padronização no Brasil. O próprio Congresso, por iniciativa do
Executivo, tem tomado medidas de legislação que pretendem colocar todos os
estados na mesma condição. Isso não é possível. No momento que o Congresso quer
legislar sobre salários de servidores estaduais (professores, por exemplo), sem
entrar no mérito, no genérico, é muito grave! Desconhece a realidade dos
estados e atenta contra a autonomia, porque interfere no orçamento dos estados.
O senhor sente no governo do PT aumento dessa invasão da União nas
competências dos estados?
Esse é um sentimento de muitos anos. Com o passar dos anos esse costume vai
se aprofundando, aumentando sua ação. É um movimento que vem se aprofundando.
Mas não é questão partidária. Queremos ser uma federação? Se não queremos,
então vamos ser uma República unitária. É uma decisão que tem que ser tomada em
Constituinte e então seremos um regime único: o presidente nomeia os
governadores como na época do Império. A ideia da Federação pressupõe
solidariedade, integração, cooperação, harmonia. Isso é o que está faltando no
Brasil. Não é hoje. Já há algumas décadas se sente esse esgarçar do tecido
federativo.
Essa situação fortalece politicamente o governo federal, no caso a
presidente?
É claro! Não resta dúvida! Independentemente de partidos, há um
fortalecimento nas últimas décadas do poder central em detrimento de estados e
municípios. Isso é visível! O que não acontece nas outras federações mundo
afora. Esse quadro não se vê nos Estados Unidos, Canadá, Austrália, onde os
estados têm uma condição diferenciada de autonomia e auto-organização.
Fonte: O Globo
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