Ex-ministro da Justiça, deputado federal por sete mandatos e símbolo da redemocratização do País morreu ontem, em São Paulo, aos 74 anos, como prometeu: lutando pela vida até o fim de suas forças
O adeus a Fernando Lyra
Ministro responsável pelo fim da censura no Brasil morre aos 74 anos, em São Paulo, vítima de falência de múltiplos órgãos
Ayrton Maciel
Se todos os adjetivos não fossem suficientes para definir o guerreiro e autêntico Fernando Lyra, um substantivo resumiria todos os pensamentos e a importância de seu currículo para a democracia brasileira: ministro responsável pelo fim da censura deixada pela ditadura de 64. Destemido e briguento na trajetória política, o ex-deputado federal do "grupo dos autênticos do MDB" e ex-ministro da Justiça de Tancredo Neves/José Sarney Fernando Lyra morreu ontem, aos 74 anos, como prometeu: lutando pela vida até o fim de suas forças. Lyra faleceu às 16h50 (horário de Brasília), no Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas, da Universidade de São Paulo (USP), em decorrência de falência de múltiplos órgãos. O "ministro que acabou com a censura" foi internado no dia 29 de dezembro passado, no Hospital Português do Recife, com uma infecção urinária. No dia 5 de janeiro, foi transferido em UTI aérea para o Incor, visando a tratar a descompensação de insuficiência cardíaca congestiva grave, doença que o acometia há 20 anos, associada a um quadro de infecção sistêmica e à insuficiência renal aguda.
Por um mês e meio, Fernando Soares Lyra - um dos fundadores do Movimento Democrático Brasileiros (MDB), o partido de oposição ao regime militar -, brigou para continuar vivendo e fazendo o que mais sabia: política. Como cardiopata grave, resistia com quatro pontes de safena e três mamárias, mais um marca-passo. Desde o início da internação, o quadro de saúde só fez se agravar. No dia 11 de janeiro, foi levado para a UTI do Incor, onde o agravamento chegou ao estágio crítico nos últimos dias. Terça-feira (12), Lyra foi entubado, passando a respirar com a ajuda de aparelhos. O estado já era irreversível.
Protagonista de momentos históricos da política de Pernambuco e do Brasil dos últimos 50 anos, Fernando Lyra notabilizou-se com um dos integrantes da aclamada ala dos "autênticos" do antigo MDB - que de Pernambuco contou, ainda, com personagens como o senador Marcos Freire, Jarbas Vasconcelos, Maurílio Ferreira Lima, Egídio Ferreira Lima e Fernando Coelho -, o grupo que fazia oposição dura aos militares. Lutou pelas Diretas Já, o projeto de Dante de Oliveira (PMDB/MT), em 1984, derrotado pela maioria parlamentar governista na Câmara Federal, para, em seguida, incorpora-se - sem esmorecer - à campanha de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral (1985), como um dos seus coordenadores. Campanha vitoriosa com a Aliança Democrática, o acordo firmado entre o PMDB e os dissidentes do PDS (ex-Arena), que derrotou Paulo Maluf - candidato dos militares - e viabilizou a redemocratização do País.
A confiança de Tancredo rendeu-lhe o convite para ser o ministro da Justiça. A inesperada morte de Tancredo levou o vice-presidente José Sarney, do PDS, que depois se filou ao PMDB, a assumir o governo. Sarney manteve o ministério de Tancredo e o convite a Lyra. Na Justiça, coube ao ministro a iniciativa de executar o fim da censura no Brasil. Em 1989, foi o candidato a vice-presidente de Leonel Brizola (PDT), na primeira eleição direta pós-ditadura militar.
Deputado estadual (1966) e federal por sete mandatos seguidos, entre 1971 e 1999, Fernando Lyra saiu da disputa eleitoral, mas jamais deixou o exercício da política. Em 2006, aplicou a sua habilidade como um dos articuladores da campanha que levou Eduardo Campos (PSB) ao Palácio do Campo das Princesas. Nos governos Lula, ocupou o último cargo público, como presidente da Fundação Joaquim Nabuco, de 2003 a 2011.
O corpo de um dos principais atores da redemocratização brasileira chega às 10 horas ao Recife, no Aeroporto Guararapes/Gilberto Freire. O velório terá início às 12 horas, na Assembleia Legislativa, e o sepultamento ocorrerá às 17 horas, no Morada da Paz, em Paulista. O governador Eduardo Campos decretou luto oficial por três dias no Estado.
Fonte: Jornal do Commercio (PE)
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