O Estado de S. Paulo
Quando o preço sobe nas bombas e gôndolas, aumenta o risco de ele subir também no Congresso. É literalmente uma matemática de padaria: um governo impopular está condenado a pagar mais caro para conseguir o que quer e - principalmente - evitar o que não quer que deputados e senadores façam. Foi assim com José Sarney, com Fernando Collor e com FHC. É assim com Dilma Rousseff.
Nunca antes na história recente deste país - desde 1997 no caso do Ibope, e desde 1994 no Datafolha - tanta gente apostou que a inflação vai subir. O recorde negativo havia sido quebrado antes do Carnaval, quando 81% dos brasileiros disseram ao Datafolha que os preços vão continuar aumentando. Na semana passada, o Ibope/CNI encontrou uma taxa ainda mais alta: 87%. Para agravar, metade desses acha que a inflação vai aumentar e muito.
Politicamente, conta menos a questão objetiva (houve outros aumentos de preços maiores nos últimos 20 anos) do que as expectativas. O problema das expectativas inflacionárias é que elas tendem a ser autorrealizáveis. Se o consumidor acha que a inflação vai subir, quem pode remarcar preços fica tentado a fazê-lo. Especialmente quando o exemplo vem de preços administrados pelo governo, como combustível e eletricidade.
Tudo isso desemboca no desgaste da renda pessoal do eleitor-consumidor e, por consequência, no aumento do pessimismo econômico. O resultado é que a confiança do consumidor brasileiro é a mais baixa desde junho de 2001, na série histórica da pesquisa Ibope/CNI. Pior do que isso: o índice nunca sofreu uma queda tão forte nem tão brusca nos 14 anos em que é calculado. Desde a eleição, despencou 12%.
Todas essas cifras seriam de pouco interesse se não tivessem contrapartida na realidade política: consumidor desconfiado vira eleitor do contra. Por isso, é muito, mas muito provável que a popularidade de Dilma tenha caído ainda mais desde a divulgação da pesquisa Datafolha há um mês: ela batera em 44% de avaliações negativas sobre seu governo, contra apenas 23% de positivas.
É a segunda avalanche de opinião pública que leva a popularidade da presidente morro baixo desde que ela chegou ao poder. À diferença de 2013, a piora da avaliação, desta vez, antecedeu eventuais manifestações de protesto com grande envergadura.
A mais recente passeata pelo impeachment de Dilma reuniu 70 gatos pingados na avenida Paulista. Não deu nem para complicar mais o já complicado trânsito paulistano. As inúmeras manifestações convocadas pelo MPL (Movimento Passe Livre) este ano não valeram nem 20 centavos a menos na passagem. Não quer dizer que algum desses protestos não venha a servir de estopim para uma nova onda como a que varreu as ruas em 2013.
A mais recente aposta da oposição é o movimento dos caminhoneiros. Se bem organizado, mesmo um número relativamente pequeno de manifestantes é capaz de provocar grandes transtornos - não apenas ao trânsito nas estradas e cidades, mas especialmente se as barreiras repercutirem em desabastecimento.
O que indicadores econômicos e expectativas apontam é a fermentação de condições cada vez mais desfavoráveis ao governo. O enfrentamento proposto por FHC (ainda que envergonhado, ao não assumir o slogan "Fora, Dilma") e retrucado por Lula (com a ameaça de colocar na rua os militantes do PT que sobraram) aumenta a temperatura - embora não ao grau de fervura, ainda.
Some-se a esperada denúncia do procurador-geral da República contra alguns dos caciques políticos mais emplumados do Congresso, e o cenário fica cada vez mais propício a incendiários do que a bombeiros. É um Joaquim Levy em meio a uma multidão de Molotovs. A ressaca desse coquetel é conhecida.
Tudo isso vai fazer disparar o preço cobrado pelos ditos aliados para sustentar Dilma. Até quando o PMDB perde ele ganha.
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