- O Estado de S. Paulo
O discurso é repetitivo e irreversível, não há entendimento possível. A presidente Dilma afirma que está sendo vítima de um golpe, até admite ter cometido erros – embora não tenha dito quais –, mas que não cometeu nenhum crime de responsabilidade que justifique sua deposição.
É, para ela, um golpe parlamentar incontestável. O presidente do Julgamento, Ricardo Lewandowski, preferiu contemporizar com a observação tímida de que o golpe é apenas uma tese.
Mas essa tese tem consequências. Inclui entre os golpistas, as duas Casas do Congresso, o Supremo Tribunal Federal e, por força de consequência, a própria Constituição e a Lei, que respaldam todos os procedimentos do processo de impeachment.
Também o ex-presidente Collor poderia alegar o mesmo: que foi vítima de um golpe parlamentar em 1992 e que não cometeu crime nenhum, tanto que foi inocentado depois pelo Supremo. E, no entanto, em 1992, o PT apoiou o impeachment do então presidente Collor, sem ter, na ocasião, admitido ter participado de um golpe. E convém lembrar que o PT pediu o impeachment dos demais presidentes da República que assumiram depois do regime militar, de Sarney a Fernando Henrique. Só parou com Lula e Dilma.
Se são golpistas os juízes do Supremo e os senadores que a julgam, por que então a presidente Dilma recorre a eles para pedir que a inocentem? São golpistas, mas deixarão de ser apenas se a inocentarem?
Em seu discurso de defesa, a presidente Dilma fez uma argumentação esquisita. Disse que a política econômica adotada pelo presidente em exercício Michel Temer contraria frontalmente a que foi apresentada e defendida ao longo da campanha eleitoral de 2014. Ora, quem deu um cavalo de pau na política econômica foi a própria Dilma.
Depois de rejeitar um programa ortodoxo de ajuste fiscal, nomeou o ortodoxo Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda e dele pediu um programa ortodoxo de ajuste da economia. Até o PT entendeu que essa virada caracterizou estelionato eleitoral.
Em nenhum momento de sua defesa, nem no seu pronunciamento, nem quando respondeu aos senadores, a presidente afastada adiantou qual seria sua política econômica caso viesse a ser reconduzida ao governo. Se está errada a orientação dada pelo presidente Temer, então fica sugerido que a política que seria adotada se ela voltasse ao governo seria a mesma que produziu os desastres já conhecidos?
A fundamentação jurídica evocada para seu afastamento definitivo foi o desrespeito à Constituição e à Lei de Responsabilidade Fiscal caracterizado pelo que se chamou depois de pedaladas e de utilização dos bancos públicos para abertura de créditos ao governo sem autorização do Legislativo. Mas poderia ser outra. Poderia, por exemplo, ter sido a conivência com a roubalheira na Petrobrás. Ou a política irresponsável de represamento dos preços que debilitou o caixa do setor elétrico e da própria Petrobrás.
Como já foi sustentado por esta Coluna, a presidente Dilma está, sim, sendo afastada do governo pelo conjunto da obra. Este é um julgamento político que só pode ser decidido no voto.
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