• Manifestações em 82 cidades defendem aprovação de medidas contra corrupção
Para Planalto, poderes devem estar atentos às ações da população
Milhares de pessoas foram às ruas em todos os estados e no DF contra mudanças no pacote anticorrupção e os ataques à Lava-Jato pelo Congresso. Manifestantes elegeram como alvo o presidente do Senado, Renan Calheiros, autor do projeto que pune o abuso de autoridade de juízes e promotores. Presidente da Câmara, Rodrigo Maia não foi poupado.
Um não à corrupção
• Atos em todos os estados defendem Moro e Lava-Jato; Renan e Rodrigo Maia são principais alvos
- O Globo
Apenas quatro dias após o Congresso desfigurar o pacote de dez medidas contra a corrupção e incluir nele a criminalização de juízes e integrantes do Ministério Público por abuso de autoridade, milhares de brasileiros foram ontem às ruas em todos os estados do país e no Distrito Federal para defender a Operação Lava-Jato e apoiar o juiz Sérgio Moro. Os principais alvos do protesto país afora foram os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), responsáveis pela condução das votações nas duas Casas legislativas. O presidente Michel Temer foi poupado, o que deixou o Palácio do Planalto aliviado. Pelas contas da polícia, 75 mil pessoas participaram dos atos — os organizadores estimam em 487 mil — em 82 cidades de todos os estados, o que faz dessa a maior manifestação de rua desde que a ex-presidente Dilma Rousseff deixou o poder temporariamente, em maio.
A maior manifestação ocorreu novamente em São Paulo, onde 15 mil pessoas, segundo a polícia, e 200 mil, segundo os organizadores, foram à Avenida Paulista. No Rio, milhares se reuniram na orla de Copacabana, mas nem a polícia nem os organizadores divulgaram estimativas do númeque, ro de participantes. De acordo com os números oficiais, Curitiba, com oito mil participantes, e Brasília, com cinco mil, tiveram os maiores públicos depois de São Paulo. Em praticamente todos os estados as insatisfações foram canalizadas, sobretudo, para a figura de Renan Calheiros, mas Rodrigo Maia também foi muito criticado.
Em São Paulo, os manifestantes estenderam na Avenida Paulista uma grande faixa verde e amarela com os dizeres “Congresso corrupto” e inflaram dois bonecos gigantes, um do ex-presidente Lula e outro de Renan, ambos vestidos de presidiários. A avenida voltou a ficar verde e amarela. O aquecimento começou com gritos de “Fora, Renan”, puxado pelos integrantes do Vem pra Rua, e ganhou vozes na avenida: “Renan, cangaceiro, vergonha do Senado, topa tudo por dinheiro” e “Renan, safado, fora do Senado”.
No Rio, no entanto, as críticas foram bastante divididas entre Renan e Rodrigo Maia, eleito basicamente com votos da capital governada três vezes por seu pai, o ex-prefeito Cesar Maia. O coro “Fora, Renan” e “Rodrigo Maia, pode esperar, sua hora vai chegar” foi entoado várias vezes. Os ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), também entraram na mira dos manifestantes. Os protestos foram pacíficos, não tendo sido registrados tumultos.
Em Brasília, ratos de plástico foram atirados no espelho d’água do Congresso durante a manifestação que reuniu cinco mil pessoas no gramado em frente. Sérgio Moro era o nome mais exaltado pelos manifestantes — a inscrição “In Moro we trust” (“Em Moro nós confiamos”) na camiseta de um dos presentes resumia o sentimento geral. Apenas em esporádicos cartazes havia menções ao presidente Michel Temer, com pedidos de sua saída do cargo.
O Planalto estava apreensivo com a possibilidade de nova onda de impopularidade, mas acabou o dia mais tranquilo. A avaliação é que, passado o episódio da saída de Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo), a crise migrou para o Congresso. Em nota curta, o governo elogiou os protestos, que demonstrariam “a força e a vitalidade de nossa democracia”, destacou o fato de os atos terem transcorridos “de forma pacífica e ordeira” e deu recado indireto ao Legislativo: “É preciso que os Poderes da República estejam sempre atentos às reivindicações da população brasileira”. Diante da mobilização, a avaliação do entorno de Temer é se o Senado aprovar o abuso de autoridade e as ruas ainda estiverem sensíveis, o presidente não terá força para sancionar a matéria.
Em entrevista ao GLOBO, Temer revelou que, na semana passada, recebeu “apelo institucional” da presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, para que ele pedisse ao presidente do Senado que não fosse posto em votação o projeto que tipifica como crime o abuso de autoridade de juízes e membros do MP. Segundo a ministra, isso poderia gerar uma grave crise entre os Poderes, com consequências imprevisíveis. Temer procurou no mesmo dia Renan Calheiros, que, no entanto, manteve-se irredutível. A proposta, que gerou tamanha controvérsia, continua marcada para ser analisada amanhã pelo Senado.
As notas de Renan e Maia foram bem mais protocolares que a do Planalto. Ambos disseram respeitar as manifestações, as qualificaram como “legítimas” e ressaltaram seu caráter ordeiro. Mas não deram qualquer sinalização de que pretendem recuar nas propostas. Em Curitiba, manifestantes atiraram tomates em cartaz com fotos de Renan, Maia e Roberto Requião (PMDB-PR), relator do projeto no Senado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário