Bastaram poucos dias para ficar claro que a Polícia Federal mostrou imperícia ao divulgar a Operação Carne Fraca.
Por graves que sejam as suspeitas levantadas, e consideráveis os sinais de ilícitos na relação entre empresas e fiscais do governo, houve danos desnecessários à imagem de um produto de peso na dieta dos brasileiros e na balança comercial do país —um prejuízo desproporcional à escala das irregularidades sob investigação.
Não emergiram evidências fortes, até aqui, para concluir que a condição sanitária da proteína animal produzida no Brasil —um dos líderes mundiais no setor— seja em geral ruim ou um risco para a saúde pública. No entanto, foi essa a impressão que se disseminou.
São 21 os frigoríficos sob suspeita e, agora, impedidos de exportar carnes. Um número ínfimo para o universo de quase 5.000 estabelecimentos nacionais do ramo.
A PF fez inspeção em um único frigorífico. As desconfianças restantes de deficiências sanitárias derivam de escutas telefônicas, principalmente, em que transparece o conluio entre fiscais do Ministério da Agricultura e prepostos das empresas para burlar exigências legais de qualidade da carne.
Só 6 das 21 unidades vendem o produto ao exterior, com faturamento de US$ 120 milhões em 2016, parcela diminuta do total de cerca de US$ 14 bilhões exportados.
Apesar disso, o estardalhaço da PF contaminou a reputação do produto brasileiro como um todo. E ocasionou, entre outros danos, a suspensão das importações por Hong Kong —maior comprador externo de carne bovina nacional.
Com mais cuidado e precisão nos detalhes, a divulgação da Carne Fraca pela PF poderia ter prevenido a generalização deletéria.
O estrago está feito; cabe, agora, circunscrevê-lo à amplitude real das irregularidades. Pois elas, tudo indica, existem.
Há indícios de que fiscais de defesa agropecuária —cujo comando está sujeito a indicações partidárias– cobravam regularmente por favores a dirigentes de frigoríficos. Deficiências na política de controle eram relatadas já em 2014 pelo Tribunal de Contas da União.
Um dos problemas apontados pelo TCU era a duplicidade de padrões, com inspeção sanitária mais rigorosa e frequente do produto exportado, na comparação com o destinado ao mercado interno.
A investigação continua, e não se descarta que surjam mais fatos comprometedores. É obrigação da Polícia Federal concluí-la com rigor e celeridade —o que não isenta a pasta da Agricultura de restaurar, com novos dados e providências, a confiança abalada no sistema federal de inspeção.
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