Para parlamentares, contribuições eleitorais foram criminalizadas, e decisão criou incerteza
Catarina Alencastro e Júnia Gama | O Globo
-BRASÍLIA- O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, evitou polemizar ontem sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de que um candidato pode ser processado por receber propina disfarçada de doação oficialmente declarada. Para ele, é preciso “ter muita paciência”. Rodrigo Maia defendeu que os investigados respondam aos processos, sem se deixar levar pelo julgamento do Supremo.
A decisão do STF foi tomada na última terça-feira, pela Segunda Turma da corte, ao entender que o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) deve ser investigado por corrupção e lavagem de dinheiro por uma doação de R$ 500 mil recebida pela Queiroz Galvão. No caso específico de Raupp, Maia disse que, se ao longo do processo ficar claro que não houve “vinculação entre doação e algum pedido indevido”, o caso será arquivado.
— O Ministério Público e a Justiça estão fazendo de forma competente seu trabalho. E que cada um que tenha um inquérito, que tenha um processo, vai responder. Respondendo, não tendo prova, o processo vai cair. Então, acho que tem que ter muita paciência para superar esse problema e que não se misture uma coisa com a outra — disse o presidente da Câmara.
INQUIETAÇÃO NO CONGRESSO
Outros parlamentares, no entanto, criticaram abertamente a decisão do Supremo. Para o líder do PT, deputado Carlos Zarattini, o STF cometeu um “equívoco” e, agora, todas as doações estão sob suspeita.
— A aceitação da denúncia foi muito grave, ela, na prática, criminaliza todas as doações. Foi um equívoco do STF. Isso é um prejuízo para o sistema político. Agora, todas as doações estão sob suspeita — disse o petista.
Para o deputado Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), decisões como esta podem levar ao “descaminho”. Ele afirmou que ficou espantado com o entendimento majoritário da Segunda Turma do STF. O deputado prevê um cenário de dificuldades para os políticos que participarão de eleições futuras.
— Fiquei inquieto. A persistir esse entendimento, tudo fica sob suspeição. Participar de uma eleição nesse ambiente fica muito difícil. Acho que não é por aí — opina Jarbas.
“QUEBRA DE PARADIGMA”
Anteontem à noite, ao participar de comemoração dos 50 anos de profissão do jornalista Ricardo Noblat, o ministro do Supremo Tribunal Federal Luis Roberto Barroso chegou a comentar com pessoas próximas que a decisão da Segunda Turma poderia ser considerada uma “quebra de paradigma na política brasileira”.
Na terça-feira, logo após a decisão, parlamentares ironizaram o resultado do julgamento. Alvo da Lava-Jato, o senador Jader Barbalho (PMDBPA) também demonstrou surpresa com o fato. Ele disse que consultaria uma cartomante para saber se o que é considerado legal hoje continuará tendo validade no futuro:
— Eu estou perplexo. A partir de hoje, tem que perguntar para uma cartomante se o que é legal hoje continuará sendo legal daqui a cinco ou dez anos. Porque está na lei hoje, mas se daqui a cinco ou dez anos disserem que não é mais legal, o que eu faço? Eu estudei direito, mas estou com muitas dúvidas. Prefiro só consultar a cartomante, se não, corro risco de ser punido porque observei a lei.
Outro que ironizou a decisão foi senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB). Ele disse que, agora, o Congresso terá de apresentar um projeto para anistiar o “caixa 1”.
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