Por Cristiane Agostine e Fernando Taquari | Valor Econômico
SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reiterou ontem sua pré-candidatura à Presidência e afirmou que vai disputar "para ganhar", mas ponderou que pode ser retirado da disputa por uma força indesejável. A militantes do PT e de movimentos populares, Lula disse que a candidatura não pode depender apenas dele e afirmou que se for impedido de concorrer, o partido deve manter-se na eleição.
Na noite de ontem o ex-presidente enfrentou um novo revés. Lula iria embarcar para uma viagem de uma semana para a Etiópia, para um debate sobre combate à fome, mas o juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal, determinou a apreensão do passaporte, proibindo Lula de deixar o país (ver acima).
"É importante que vocês tenham claro que não estamos jogando sozinhos. As pessoas com caneta com tinta vão tentar criar obstáculos. Espero que essa candidatura não dependa do Lula. [O PT] tem que ser capaz de fazê-la mesmo que aconteça alguma coisa indesejada", disse.
O ex-presidente foi protagonista ontem de um ato organizado pelo PT e por movimentos sociais e sindicais na CUT, em São Paulo, para defender sua candidatura presidencial e sua inocência, um dia depois de o Tribunal Regional Federal da 4 Região (TRF-4) ter mantido a condenação e aumentado a pena de 9 anos e 6 meses para 12 anos e 1 mês.
A uma plateia repleta de governadores, parlamentares e dirigentes petistas e de movimentos populares, Lula teve a candidatura respaldada pelo PT. "Dom Pedro criou o dia do Fico e eu, o dia do Aceito. Eu aceito ser candidato do partido", afirmou, sob gritos de "Brasil, urgente, Lula presidente". "Não quero ser candidato para me proteger. A minha proteção é a minha inocência. Se for candidato a presidente, não é para me inocentar, é para governar decentemente esse país".
Lula pode ser impedido de disputar pela Lei da Ficha Limpa. O petista vai recorrer da decisão do TRF-4 ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal e deve tentar garantir a candidatura com recurso no Tribunal Superior Eleitoral.
Durante seu discurso, o ex-presidente acusou o Judiciário de corporativismo e disse que TRF-4 formou cartel para barrar sua candidatura. Segundo Lula, por trás do resultado unânime contra ele, por 3 votos a 0, e dos votos semelhantes apresentados pelos desembargadores, está a tentativa de acelerar o processo judicial e impedi-lo de disputar a eleição de outubro. O ex-presidente afirmou ainda que não aceita a decisão do julgamento em segunda instância porque os magistrados "não se comportaram como juízes", mas sim como "dirigentes partidários".
"Me falam que eu não posso falar mal do Judiciário e eu não falei. Sempre que respeitarem a Constituição eu serei o mais respeitador do Poder Judiciário. Mas somente ontem eu compreendi o que é um cartel; precisa até mandar para o Cade", ironizou. "Eles construíram um cartel para dar sentença unânime para evitar o tal do embargo infringente. Só pode ter sido isso, formaram cartel para tomar decisão para apressar a possibilidade de evitar que o PT tenha Lula candidato. Ou de evitar que a gente ganhe as eleições", afirmou.
Segundo Lula, a votação do TRF-4 foi mais para "valorizar a categoria dos juízes, o corporativismo do que para julgar um crime".
"Não tenho nenhuma razão para aceitar a decisão de ontem. Quando as pessoas se comportam como juízes eu sempre respeitei, mas quando se comportam como dirigente de partido, realmente não posso respeitar", afirmou. "Se eu respeitar essa decisão vou perder o respeito dos meus filhos, netos e de vocês. E eu não vou perder o respeito".
Lula disse que já esperava pelo resultado de 3 a 0 e, por isso, "não sofreu tanto". "Obviamente que não estou feliz, mas duvido que algum que julgou esteja com a consciência tranquila como estou hoje", afirmou, reiterando sua inocência. "Estou tranquilo. Eu sei o que fiz, tenho coragem de olhar na cara dos meus filhos, netos, de cada um de vocês. A única coisa que posso oferecer é a minha inocência e lutar. Eu às vezes acho que é a maior injustiça cometida na sociedade. Mas Jesus foi condenado à morte sem dizer uma palavra, antes de nascer e olha que não tinha construtora, não tinha Lava-Jato", brincou. "Longe disso, de querer me comparar a Cristo".
O ex-presidente afirmou que o caráter de seu julgamento é político e que querem "condenar uma parcela do povo". "Pela primeira vez colocamos o pobre no centro e não querem que o PT volte a governar. Ou se percebe isso e constrói uma narrativa ou o próximo passo será a tentativa de fazer com que o PT seja criminalizado, porque eles dizem que o PT é uma organização criminosa", disse. "Lula é apenas a ponta de lança que eles querem tirar do jogo".
Lula criticou a força-tarefa da Operação Lava-Jato e novamente apontou um suposto corporativismo. "Há muitas e muitas décadas eu não via uma reação de corporação. É a corporação da PF fazendo qualquer processo". Para o ex-presidente, o Judiciário, Ministério Público Federal, a Polícia Federal e a mídia formaram um cartel para tentar desqualificá-lo. "Eles estão usando o aparelho de Estado e instituições para fazer as coisas. Não precisa mais prender gente clandestinamente à noite; agora é feito através das instituições. Lula: É feito da forma mais inteligente, por um pacto entre Judiciário, mídia e instituições outras do Estado brasileiro", disse.
O ex-presidente afirmou ainda que os desembargadores do TRF-4 usaram a teoria do domínio do fato contra ele, a mesma usada no julgamento do mensalão, porque não há provas contra ele. "O que mais coloca minha honra à flor da pele é que um canalha qualquer me chame de ladrão; não posso aceitar".
Depois de ter sua candidatura assegurada pela presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), e pela plateia de petistas, Lula conclamou a militância a não desanimar. "Nada de abaixar a cabeça", disse.
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