- Valor Econômico
Com o ajuste fiscal, o fluxo de recursos para o Brasil deve crescer
Se o governo do presidente eleito, Jair Bolsonaro, conseguir aprovar as reformas necessárias para o reequilíbrio das contas públicas brasileiras, e todos nós torcemos para que isso aconteça, é muito provável que as reservas internacionais do país, que já são consideradas muito elevadas, aumentem ainda mais nos próximos anos.
Nesse cenário, com a avaliação do mercado de que o Brasil não corre mais risco de insolvência fiscal, é muito provável que ingressem muitos investimentos externos no país. "Eu não sei quanto, mas vai entrar muito dinheiro", avaliou Nathan Blanche, um dos sócios-fundadores da Tendências Consultoria Integrada.
Em conversa com o Valor, ele observou que as melhoras ocorridas nos mercados de juros e câmbio decorreram de ações de operadores em virtude da eleição de Jair Bolsonaro e da indicação de Paulo Guedes para o futuro Ministério da Economia. "Ninguém ainda, quer seja brasileiro, quer seja estrangeiro, tomou novas decisões de investimento de médio e longo prazo", explicou. "Isso só vai ser feito quando a solvência fiscal [do país] permitir."
Nesse momento, avaliou Blanche, os investimentos retornarão ao Brasil, mesmo diante da expectativa de redução da atividade econômica no mundo, como alguns estão prevendo. "O Brasil está barato e tem grandes oportunidades de investimento", disse. Há no mercado quem acredite que até US$ 100 bilhões poderão entrar no país.
O ingresso dos recursos externos obrigará o Banco Central a comprar mais dólares, explicou o sócio da Tendências, aumentando as reservas internacionais do Brasil, que estão atualmente em US$ 380 bilhões. No passado, Blanche trabalhou em diversos projetos que permitiram a regulamentação e a liberação do mercado de câmbio no Brasil.
Outros especialistas consultados pelo Valor fazem a mesma previsão. Também acreditam que, feitas as reformas fiscais necessárias para o reequilíbrio das contas públicas, o Brasil poderá ser beneficiado por uma nova onda de investimentos externos, que resultará em forte fluxo de entrada de moeda estrangeira no país. Isso já aconteceu em passado recente.
Após a crise financeira internacional de 2008, o Brasil voltou a acumular reservas. Na crise, o Banco Central foi obrigado a adotar uma série de medidas para reduzir a volatilidade do mercado. Entre elas, a venda de US$ 14 bilhões das reservas, por meio de leilões, para atender a forte demanda de saída de dólares à vista e que vinha causando excessiva desvalorização do real. Antes da crise as reservas estavam em US$ 200 bilhões.
As medidas foram eficazes, pois, já em abril de 2009, o país passou a receber fluxos de entrada de moeda estrangeira, que perduraram até meados de 2012, com as reservas atingindo o nível de US$ 370 bilhões, como lembra Ariosto Revoredo de Carvalho, em recente e esclarecedor artigo, disponível na internet (no endereço jlrodrigues.com.br). Carvalho foi chefe do Departamento das Reservas Internacionais (Depin) do Banco Central.
No caso de nova intensificação do fluxo de entrada de moeda estrangeira no Brasil, os especialistas acreditam que, em primeiro lugar, o BC deverá reduzir o estoque dos contratos de swap cambial, que hoje está em torno de US$ 68 bilhões. Com a perspectiva de forte ingresso de dólares no país, os operadores poderão atuar vendendo a moeda americana no mercado futuro. Para evitar que esse movimento afete demasiadamente a cotação do dólar, o BC poderá ofertar contrato de swap reverso, que, basicamente, significa uma compra de dólar no mercado futuro pela autoridade monetária.
Em um terceiro momento, se o fluxo de entrada continuar intenso, o BC poderá comprar dólar no mercado spot, ou seja, no mercado à vista. O resultado dos três movimentos do BC será o aumento das reservas internacionais do país.
As reservas internacionais são uma espécie de seguro do país contra a volatilidade exagerada dos mercados, causada por fatores internos ou externos. Mas é importante observar que as reservas do Brasil foram constituídas por dívida pública. Por meio de leilões à vista, o Banco Central compra os dólares do mercado e, em seguida, é obrigado a colocar títulos públicos para enxugar a liquidez decorrente das aquisições da moeda estrangeira, ou seja, retirar o excesso de reais da economia. Em resumo, os dólares foram trocados por dívida pública.
Por isso, manter as reservas tem um custo, que já foi muito elevado. Ele é dado pela diferença entre a taxa de captação do Tesouro, que grosso modo corresponde à taxa básica de juros (Selic), e a remuneração obtida pela aplicação dos recursos no exterior, que no passado recente era muito baixa. Atualmente, o custo do carregamento das reservas é o menor dos últimos tempos, pois a Selic, mantida ontem pelo BC em 6,5% ao ano, é a mais baixa da história. Além disso, a taxa de juros dos Estados Unidos está na faixa de 2% a 2,25% ao ano e em elevação.
Em entrevista na terça-feira, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o Brasil não tem necessidade de carregar tantas reservas internacionais, desde que tenha "um regime fiscal robusto". Ele chamou a atenção para o custo deste "seguro" e admitiu vender parte das reservas, em caso de ataque ao real, abatendo, com isso, a dívida pública, o que ajudaria no ajuste fiscal.
Se as situação fiscal do país melhorar no futuro e isso resultar em forte fluxo de entrada de divisas, Guedes terá que encontrar uma solução para o acúmulo de reservas.
Conselho monetário nacional
O presidente eleito, Jair Bolsonaro, decidiu criar um superministério para o economista Paulo Guedes. Ele vai unir os ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Indústria, Comércio Exterior e Serviços em um só, que terá o nome de Ministério da Economia. Uma questão que precisa ser resolvida é que a meta de inflação a ser perseguida pelo Banco Central é definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que possui, atualmente, três membros: os ministros da Fazenda e do Planejamento e o presidente do BC.
Com a mudança a ser feita por Bolsonaro, o CMN passaria a ter apenas dois integrantes: o ministro da Economia e o presidente do BC. Em qualquer colegiado, é preciso ter um voto de desempate. Quem seria o terceiro voto no CMN?
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