- Folha de S. Paulo
Presidente da República levou o problema para dentro do Palácio do Planalto
O senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) deveria renunciar antes de tomar posse. É o que pode fazer de melhor em favor do presidente Jair Bolsonaro. Infelizmente para o clã, o passado insiste em sair dos porões e do armário.
E começa a ficar claro que os Varões de Plutarco são uma criação de profissionais das fake news. Até esta quarta (23), havia um fio de esperança na cúpula militar do governo de que o pai tentaria se manter a uma distância prudente do tsunami de evidências que colhe o filho. Não mais.
Em entrevista à TV Record, o presidente da República levou o problema para dentro do Palácio do Planalto. Afirmou: “Nós não estamos acima da lei. Pelo contrário, estamos abaixo da lei. Agora, que se cumpra a lei: não façam de maneira diferente para conosco. Não é justo atingir um garoto, fazer o que estão fazendo com ele, para tentar me atingir."
Por que “nós”? Ele não está sob investigação. Ao fazer essa escolha gramatical, está alertando as autoridades de que também está no rolo. Trata-se de truculência. É um modo de intimidar o Ministério Público do Rio.
Flávio vai fazer 38 anos no dia 30 de abril. O pai o chama de “garoto”. Jair empregou a mesma palavra quando o já deputado federal Eduardo Bolsonaro, com 34, afirmou que bastavam um soldado e um cabo para fechar o Supremo. E o “garotinho” ainda fez questão de acrescentar: “Não é querer desmerecer o soldado e o cabo, não”.
Bolsonaro tem como seu ministro da Justiça um homem versado nessas coisas de investigação. Se há pessoa que conhece o que é seguir e o que é transgredir a lei, eis Sergio Moro. Mas parece que sua biruta se desorientou.
O Banco Central quer excluir parentes de políticos da lista de monitoramento obrigatório das instituições financeiras e acabar com a exigência de que todas as transações bancárias acima de R$ 10 mil sejam notificadas ao Coaf. O ministro ainda não sabe se isso é bom ou mau. Os corruptos e lavadores de dinheiro já têm opinião formada. Moro está virando suco com mais rapidez do que os outros.
Esse governo também ampliou brutalmente o número de pessoas que podem impor sigilo a documentos. Ficou mais fácil esconder falcatrua. Quem recorrer com uma Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) ao STF derruba o decreto —parto do pressuposto de que a maioria dos ministros tem vergonha na cara. O princípio constitucional é o da transparência. A opacidade é a exceção. Estamos apenas no 24º dia de governo.
Os Bolsonaros devem fazer figa para que os métodos de investigação do “Flaviogate” não sigam aqueles consagrados justamente por Moro, sob os aplausos do bolsonarismo, e que quebraram as pernas do PT, do PSDB e do MDB: prisão preventiva que se estende para as calendas e oferta generosa de delação premiada.
Vamos ver se o Ministério Público e, a depender do caso, a Polícia Federal, sob o comando do ex-juiz supremo, vão se deixar intimidar. Todos somos contra “viés ideológico”, certo?
Flávio tinha um suposto motorista no gabinete, Fabrício Queiroz, que movimentou R$ 7 milhões em três anos; parte desse dinheiro era oriunda de depósitos feitos por servidores do gabinete, logo depois do pagamento de salários efetivado pela Alerj.
Entre esses funcionários, estavam a mãe e a mulher de Adriano Magalhães da Nóbrega, considerado o miliciano mais perigoso do Rio. Em resposta, o senador eleito afirma que foi Fabrício, o motorista que faz papel de mordomo, quem os contratou.
No histórico político do filho Flávio e do pai Jair há a defesa das milícias. Em 2003, o agora presidente elogiou a atuação de um grupo de extermínio na Bahia e até o convidou a atuar no Rio, oferecendo seu apoio.
Quando, em 2011, a juíza Patrícia Acioli foi assassinada por milicianos, com 21 tiros, Flávio escreveu no Twitter: “Que Deus tenha essa juíza, mas a forma absurda e gratuita com q ela humilhava Policiais nas sessões contribuiu p ter mts inimigos”. A culpa era da morta.
À época, Flávio era ainda mais garoto: tinha 30 anos. A maioridade penal chega tarde para os rebentos de Bolsonaro. Eles a querem aos 16 anos para os filhos dos “pobres de tão pretos e pretos de tão pobres”.
Fazendo de conta que era um menino, lembremos Machado de Assis, que citava o poeta Wordsworth: “O menino é o pai do homem”.
E o homem é o pai do “garoto”, como resta claro.
Um comentário:
Reinaldo Azevedo arrepiando,citando até Caetano Veloso.
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