O Estado de S. Paulo
A nova estratégia de Washington para as Américas, na prática, afirma que a região pertence à área de influência dos EUA
O governo Trump divulgou, na semana passada, sua Estratégia de Segurança Nacional, em que define a visão de médio e longo prazo dos EUA, as prioridades internas e externas e o relacionamento de Washington com as regiões globais. O pragmatismo e o realismo da política externa dos EUA têm como único objetivo, como ressaltado no documento, proteger os interesses nacionais fundamentais e colocar os EUA em primeiro lugar.
Embora assinalando que “dar atenção constante
à periferia é um erro”, a estratégia norteamericana, quando discute o que os
EUA querem do mundo e o que esperam receber do mundo, coloca, pela primeira
vez, seus interesses no Hemisfério Ocidental antes da China, da Europa, do
Oriente Médio e da África e marca uma ruptura histórica com a ordem mundial
depois de 1945.
Dada a relevância para o Brasil, o presente
artigo trata apenas dos trechos do documento que se referem às Américas:
“Os EUA devem ser preeminentes no Hemisfério
Ocidental como condição para nossa segurança e prosperidade – uma condição que
nos permita afirmar nossa presença com confiança onde e quando precisarmos na
região. Queremos garantir que o Hemisfério Ocidental permaneça razoavelmente estável
e bem governado o suficiente para prevenir e desencorajar a migração em massa
para os EUA; queremos um hemisfério cujos governos cooperem conosco contra
narcoterroristas, cartéis e outras organizações criminosas transnacionais;
queremos um hemisfério que permaneça livre de incursões estrangeiras hostis ou
da apropriação de ativos-chave, e que apoie cadeias de suprimentos críticas; e
queremos garantir nosso acesso contínuo a locais estratégicos importantes. Em
outras palavras, vamos afirmar e fazer cumprir um ‘Corolário Trump’ à Doutrina
Monroe”.
“Após anos de negligência, os EUA reafirmarão e farão cumprir a Doutrina Monroe para restaurar a preeminência americana no Hemisfério Ocidental e proteger nossa pátria e nosso acesso a regiões-chave em toda a região. Negaremos a concorrentes de fora do hemisfério a capacidade de posicionar forças ou outras capacidades ameaçadoras ou de possuir ou controlar ativos estrategicamente vitais, em nosso hemisfério. Este ‘Corolário Trump’ à Doutrina Monroe é uma restauração sensata e eficaz do poder e das prioridades americanas, consistente com os interesses de segurança dos EUA. Nossos objetivos para o Hemisfério Ocidental podem ser resumidos em ‘atração e expansão’. Buscaremos apoio dos aliados já estabelecidos no hemisfério para controlar a migração, deter o fluxo de drogas e fortalecer a estabilidade e a segurança em terra e no mar. Expandiremos, cultivando e fortalecendo novas parcerias, ao mesmo tempo em que reforçamos a posição de nossa nação como o parceiro preferencial em termos econômicos e de segurança no hemisfério. A política americana deve concentrar-se em angariar aliados regionais que nos ajudariam a deter a imigração ilegal e desestabilizadora, neutralizar cartéis, impulsionar a produção em áreas próximas aos EUA e desenvolver empresas privadas locais, entre outras áreas. Recompensaremos e incentivaremos os governos, partidos políticos e movimentos da região que estejam amplamente alinhados com nossos princípios e estratégia. Mas não devemos ignorar governos com perspectivas diferentes, com os quais, ainda assim, compartilhamos interesses, e que desejam trabalhar conosco”.
“A escolha que todos os países devem
enfrentar é se querem viver em um mundo liderado pelos EUA, com países
soberanos e economias livres, ou em um mundo paralelo no qual são influenciados
por países do outro lado do mundo”.
Com esses objetivos, em resumo, os EUA
pretendem reconsiderar sua presença militar no Hemisfério Ocidental, aumentar a
presença da Guarda Costeira e da Marinha para garantir a segurança da fronteira
e derrotar os cartéis, incluindo, quando necessário, o uso de força letal. A
diplomacia comercial visará fortalecer a economia e as indústrias americanas,
utilizando tarifas e acordos comerciais recíprocos como ferramentas para
fortalecer as cadeias de suprimentos críticas no hemisfério. O Conselho de
Segurança Nacional, inclusive, da Comunidade de Inteligência, iniciará um
processo para identificar recursos estratégicos no Hemisfério Ocidental.
A preocupação com a China está presente
quando o documento acentua que qualquer tipo de ajuda dos EUA deve estar
condicionada à redução gradual da influência externa adversária – instalações
militares, portos, infraestrutura e mesmo aquisição de ativos estratégicos,
entre outros. A redução da influência chinesa no Hemisfério Ocidental foi
obtida com a demonstração dos custos ocultos – em espionagem, segurança
cibernética, dívida – embutidos na assistência externa de “baixo custo”.
A nova estratégia de Washington para as Américas, na prática, afirma que a região pertence à área de influência dos EUA (“quintal”, segundo o secretário da Guerra). O Corolário Trump da Doutrina Monroe cria grandes desafios para a política externa do PT, levando em conta a dependência comercial da China e o forte viés antiamericano expresso pelos governos Lula e Dilma ao longo dos 20 anos em que o partido ocupou o poder.

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