sábado, 21 de abril de 2012

Condenação de Tiradentes :: Marcos Henrique Caldeira Brant


Quando celebramos no feriado nacional de hoje o martírio de Tiradentes, não temos em vista a simples memorização do conteúdo histórico, mas sim a revivescência dos sentimentos que levaram nosso antepassado a dar a vida pela liberdade. A Conjuração Mineira de 1789 reuniu no mesmo ideal de autonomia política e governo republicano, face à opressão portuguesa, intelectuais, militares, religiosos, advogados, magistrados, mineradores, agricultores, comerciantes, não esquecendo a colaboração escrava. Tiradentes era um conjurado de condição socioeconômica simples. Apenas um alferes (antigo posto militar equivalente ao atual de 2º tenente) de cavalaria, mais conhecido pelo apelido de profissão que por seu nome de batismo: Joaquim José da Silva Xavier.

Descoberto e abortado o movimento libertário em fase preparatória, os implicados foram identificados e presos. Acusados de crime de lesa-majestade: rebelião e alta traição, instaurou-se a devassa (processo destinado a investigar colhendo provas para apontar o culpado de um crime) a cargo de uma junta especial de justiça, com plenos poderes dados pela rainha, denominada Alçada em Relação, composta inicialmente por três desembargadores.

A devassa como autos do terror demorou três anos. Tiradentes, submetido a longos, exaustivos e penosos interrogatórios e acareações, acabou confessando e avocando a responsabilidade maior da conjuração. Dada a oportunidade de defesa aos réus e encerrado o complexo e violento procedimento penal, adveio a sentença (acórdão), que levou 18 horas para ser prolatada e consumiu 2 horas para ser lida aos conjurados, causando pavor a todos, já fragilizados pelo sofrimento e angústia de longos anos de isolamento e cárcere.

Foram 8 conjurados absolvidos e 26 condenados, sendo 10 deles à pena de morte. Mas, como já acertado por graça antecipada da rainha, adveio a comutação das penas por outras mais brandas, com grande alivio para os alquebrados conjurados.

Somente Tiradentes não recebeu a graça da rainha piedosa. Foi condenado à pena de morte na modalidade simples (morte natural por enforcamento), destinada às classes inferiores. Havia mais duas modalidades: morte cruel (vida tirada lentamente por suplícios) e morte atroz (vida tirada com detalhes brutais, como incineração, esquartejamento etc). À pena principal de morte agregaram-se as penas acessórias de: 1 – baraço (atar as mãos do condenado para evitar gestos instintivos de defesa); 2 – pregão (dar grande publicidade ao ato); 3 – decapitação e esquartejamento com exposição pública até o consumo pelo tempo; 4 – destruição e desinfecção da moradia e fixação de marco; 5 – confisco de bens para a Coroa; 6 – declaração de infâmia extensiva a filhos e netos.

A crueldade das penas acessórias caracterizavam a face brutal do regime punitivo. Vigorava o direito penal do terror estabelecido pelas ordenações filipinas. Ao condenado negou-se o sagrado direito à sepultura. Nem a Jesus Cristo, condenado por crime de sedição, em outra era menos civilizada, foi negado esse direito natural.

Tiradentes não desesperou com as penas recebidas. Visitado na cela pelo carrasco, quis, por humildade, beijar-lhe as mãos. Na manhã ensolarada de sábado dia 21 de abril, vestindo uma alva, segurando firmemente um crucifixo e sob os olhares assustados do povo, percorreu apressadamente em procissão o longo caminho até o patíbulo. Não exteriorizou medo e sofrimento diante da morte iminente. Subiu rapidamente os 20 degraus do patíbulo. Foi firme. Controlou o pavor e manteve-se em posição altiva. Chegou a pedir ao carrasco que fizesse logo seu serviço. Mas teve que aguardar sob sol ardente toda a encenação militar e religiosa montada para a sua execução, pois, afinal, era necessário que a Coroa portuguesa mostrasse e afirmasse seu poder sobre os súditos num memorável exemplo.

Pouco depois das 11 horas, viu-se cair suspenso a balançar o corpo inanimado de Tiradentes, cena que causou profunda impressão na multidão, que se comprimia para assistir ao abominável espetáculo.

Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, aos 45 anos de idade, entrou para a história do Brasil como promártir da independência e da República. Condição que foi oficialmente reconhecida com o decurso de 98 anos, logo no início da República, em 1890. É considerado o maior herói nacional. Patrono cívico da nação brasileira. Figura, com outros heróis nacionais, no Panteão da Pátria e da Liberdade, na Praça dos Três Poderes em Brasília, onde, solenemente, resta perpetuada e venerada sua memória como expressão do mais alto sentimento de brasilidade.

Juiz de Direito - Membro do Instituto Histórico e Geográfico de MG

FONTE: ESTADO DE MINAS

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