“Não obstante, é insuficiente proclamar os valores morais da liberdade individual e coletiva. Ou bem reinventamos a democracia contemporânea, salvaguardando a idéia de representação legítima, mas tornando-a transparente e responsável e a ampliamos para incorporar novos segmentos e novas demandas da sociedade ou a pressão “de baixo” poderá ser manipulada por formas disfarçadas de autocracia. As pressões não procedem mais de uma massa informe e desinformada. Existe um novo tipo de participante nas mobilizações. Já não é só o oprimido que se manifesta. As organizações políticas e sociais que representaram até o pouco as camadas menos favorecidas – os sindicatos e movimentos organizados — quando aparecem, vêem na rabeira dos novos movimentos de protesto. Como essas organizações foram em parte cooptadas pelas forças políticas tradicionais, o desprestígio delas abala a confiança daqueles.
Este novo tipo de pressão existe no Brasil e no exterior. Quando as instituições sufocam a liberdade e a economia não oferece oportunidades à maioria, os movimentos espontâneos, interconectando milhares e mesmo milhões de pessoas pela internet, são capazes de desencadear rebeliões que derrubam governos. Ainda não vimos a força desses movimentos ser capaz de reconstruir as instituições do poder, alçando-as a outro patamar. Até agora às explosões eventualmente vitoriosas, como no mundo árabe, têm-se seguido novas formas repressivas. E sem instituições que canalizem as forças de renovação estas podem morrer no ato de se expressar.
No caso das sociedades abertas, como a nossa, por enquanto a cada surto popular, não se derrubam governos, mas recai-se no desencanto com a política
e com as instituições. Até quando?”
Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex-presidente da República. Extraído do discurso de posse de FHC na Academia Brasileira de Letras, em 10/09/2013.
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