• Grupo político da ex-senadora começa a conversar com o mercado e o agronegócio
- O Globo
BRASÍLIA - Para aplacar temores de que um eventual governo seu seja uma aventura repleta de incertezas, a nova candidata do PSB à Presidência, Marina Silva, já age para tentar se apresentar como opção segura. De modo pragmático, seu grupo político começa a trabalhar em uma série de sinalizações para setores sensíveis como o mercado, o agronegócio e o de pesquisa científica. Em sua primeira aparição como candidata, Marina também já discusou para apaziguar os ânimos do mercado financeiro. Afirmou que manterá o tripé inflação dentro da meta, câmbio flutuante e controle fiscal. E disse que vai assegurar, em lei, autonomia para o Banco Central — proposta de Eduardo Campos, da qual ela discordava, mas que agora abraça.
Outro recado para o setor financeiro é a composição de sua equipe, que conta com Neca Setúbal, acionista do banco Itaú, como coordenadora do programa de campanha. A entrada do candidato a vice do tucano Geraldo Alckmin, Márcio França, no comitê financeiro também é vista como exemplo de que a candidata está mais aberta ao contraditório desde que assumiu a corrida presidencial. Marina e França trocavam fortes críticas desde que ela chegou ao PSB, em outubro passado.
Embora tenha opiniões consideradas radicais sobre temas como transgênicos e legalização de drogas, Marina vai deixar claro que não fará alterações legais no que já está regulamentado. A Lei de Biossegurança, aprovada em 2005, autoriza a produção e a comercialização de produtos transgênicos, questão contra a qual Marina se opôs fortemente quando foi ministra do Meio Ambiente de Lula. Mas seus aliados garantem que ela não revisará essa previsão. Mas, se eleita, fará com que os rótulos dos produtos transgênicos explicitem que se trata de um produto geneticamente modificado, algo que a lei exige.
A ex-ministra criticou parlamentares da bancada ruralista, que tentavam aprovar um projeto no Congresso para acabar com essa obrigatoriedade. Por outro lado, no caso da permissão de pesquisas com células-tronco embrionárias, prevista na Lei de Biossegurança, ela não fará revisões.
O Código Florestal é outro tema que gera anseios por parte do agronegócio. Durante a discussão da nova legislação, Marina se manifestou contra flexibilizações e anistia de multas por desmatamentos feitos até 2008, o que acabou aprovado. Quando Dilma sancionou a nova legislação, Marina declarou que o código “não é mais florestal, é um Código Agrário. Uma caixa de Pandora com todas as maldades”.
Sua equipe afirma que agora o importante é fazer com que a lei seja cumprida por meio da implementação do Cadastro Ambiental Rural, um raio-X da propriedade rural que definirá áreas que eventualmente terão de ser recuperadas.
— Marina não vai colocar a agenda pessoal acima da agenda do país. Não vamos tentar reverter temas vencidos — afirma um assessor.
O setor financeiro é o menos problemático nesse sentido, já que quando foi candidata em 2010, Marina já defendia a reforma fiscal como forma de tornar o Estado mais eficiente na gestão dos recursos públicos.
Para ela, esse é um dos fatores que limita o crescimento do país. Ela defendia também a melhoria e o aperfeiçoamento do ambiente de negócios, como forma de atrair investimentos. Semana passada, na 1ª entrevista como candidata, Marina reafirmou que tem um compromisso com a estabilidade da economia:
— Mantenho o que está no programa: meta de inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal. A independência do Banco Central é um tema de consenso entre nós.
Aliados pontuam que ela tampouco tomará a iniciativa de modificar a legislação em relação ao aborto ou à liberalização do uso da maconha. Mas que caso haja um movimento da sociedade para que os temas sejam revistos, não fugirá do debate. Com relação ao casamento gay, ela mantém que sejam respeitadas as religiões de cada um, mas que todos os direitos civis sejam estendidos à população homossexual, inclusive o da adoção de crianças.
Confronto entre sonhos e realidade
Quem a conhece de longa data antevê um dilema que Marina terá de encarar caso vire presidente: o de confrontar seus sonhos com a realidade.
— A Marina sempre teve posições muito claras sobre temas polêmicos. É parte do que ela acredita. Ela vai ter que enfrentar um choque de realidade entre os sonhos de sua vida e a prática de uma pessoa que quer assumir um país diverso como o nosso — avalia o senador Jorge Viana (PT-AC), cuja maior parte de vida política esteve ligada à da ex-seringueira.
Antes de morrer, Eduardo Campos vinha num esforço de apresentar sua candidata a vice como uma pessoa afeita ao diálogo, alguém que gosta de ouvir e se deixa convencer. Sua ideia era contrapor esse temperamento de Dilma Rousseff, que tem fama de autoritária e intransigente. Quem já trabalhou com Marina diz que a ex-ministra do Meio Ambiente gerava muitos conflitos por não abrir mão de suas posições e se rodear de gente que pensa como ela. Um marineiro que foi subordinado a ela no MMA discorda:
— Ninguém respeita mais a diversidade que ela. Muito próximo tinha um ateu, budista, espíritas, gays e usuários de drogas.
Embora defenda maior diversidade da matriz renovável e mais investimentos em energia eólica, solar e de biomassa, aliados afirmam que ela dará continuidade inclusive às polêmicas hidrelétricas da Amazônia. Segundo integrantes da campanha, ela só não abrirá mão de cumprir todo o rito do licenciamento ambiental
— algo a que qualquer governo é obrigado. Um ex-servidor que trabalhou com Marina diz que é falso afirmar que ela protelou o andamento de obras enquanto ministra.
— Quando ela assumiu o Ministério do Meio Ambiente havia 40 hidrelétricas paradas. Quando saiu eram apenas oito, e não estavam paradas, estavam em processo de licenciamento — relata.
Aos poucos, Marina dá sinais de que será menos “sonhática“, termo que usou ao sair do Partido Verde em 2011, cedendo em parte ao pragmatismo para diminuir resistências ao seu projeto.
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