- Valor Econômico
• Crise política dificulta o conserto da economia
O balanço de risco para o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, aumentou de janeiro para cá.
A deterioração das contas públicas era muito pior do que ele imaginava; as condições de aprovação de medidas necessárias ao conserto da situação no Congresso são adversas; e o ambiente político está longe de permitir alguma discussão mais séria sobre o que fazer daqui por diante.
É praticamente impossível, hoje, sensibilizar as forças partidárias para, por exemplo, reduzir as vinculações do gasto público que deixam como despesa discricionárias menos de 10% do Orçamento. Ou encontrar alguém interessado em rediscutir os incentivos fiscais, as desonerações da folha de salários das empresas, de qualidade duvidosa e que reduzem as receitas da União em R$ 25 bilhões ao ano. Não comoveu ninguém o ministro mostrar estudos que revelam que cada emprego gerado com a desoneração custa ao governo entre R$ 80 mil e R$ 100 mil por ano. Ou, ainda, diante das constatações já visíveis das investigações da Operação Lava-Jato, se pensar em redimensionar o tamanho do Estado.
Levy tem batido na tecla da redução da dívida pública, cuja trajetória, afirma, inviabiliza a retomada do crescimento. A dívida bruta do governo geral, pelas projeções oficiais feitas após a redução das metas fiscais, chega a 64,7% do PIB este ano, sobe para 66,4% do PIB no ano que vem e encerra este mandato, em 2018, em 65,6% do PIB. Estimativas feitas por economistas do setor privado, com parâmetros distintos, indicam que pode ultrapassar 70% do PIB em 2017.
A dívida líquida sobe de 36,3% do PIB este ano para 38% do PIB em 2018, conforme a nova trajetória de superávit primário do governo. O problema não é necessariamente o tamanho da dívida como proporção do produto, mas a taxa de juros implícita na dívida líquida que é exorbitante. O juro, que em 2014 era de 19,3%, em maio havia subido para 24,8% em 12 meses e deve ter aumentado mais em junho. Os dados oficiais do Banco Central serão divulgados hoje. Para o governo federal e BC, a taxa implícita chegou a impressionantes 33,9% em maio.
A dívida líquida é composta de passivos e ativos com remunerações distintas. A taxa de juros implícita corresponde à média dos custos incidentes sobre esses ativos e passivos. O salto mais recente se deve às operações de "swap" cambial, mas os juros implícitos já eram muito altos antes. O que o BC perde nos swaps, com a depreciação da moeda, ele ganha nas reservas cambiais, com a diferença que o primeiro conta nos juros enquanto os ganhos das reservas, não.
Mesmo após os aumentos da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), cobrada nos financiamentos do BNDES, para 6,5% ao ano, ela está muito abaixo da Selic, de 14,25% ao ano. Esse é um outro fator de elevação dos juros implícitos, além do custo de carregamento das reservas cambiais.
No caso da TJLP, há um agravante. Como os créditos no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento (PSI) foram feitos a taxas pré-fixadas, quanto mais se aumentar a taxa de longo prazo maior será a despesa do Tesouro com a equalização de juros, que é um gasto primário, como lembrou o economista do Ibre, José Roberto Afonso.
A Selic, que teve um último aumento na quarta feira, para 14,25% ao ano, ficará nesse patamar "por um período suficientemente prolongado", segundo o comunicado do Copom, o que encarecerá mais os juros da dívida. A última vez que o Copom falou em manter os juros por período prolongado, em 2012, a estabilidade da taxa durou três reuniões. Agora, porém, o prazo deve ser maior. O mercado estima mudança só no fim do primeiro semestre de 2016.
Diante de trajetória tão desconfortável da dívida - que no limite levaria o país para uma situação de insolvência - a redução das metas de superávit primário dos próximos anos foi uma decisão difícil. Ainda mais tendo fresca na memória a lembrança da recente e traumática experiência da "nova matriz econômica", que patrocinou uma flexibilização geral dos instrumentos de controle fiscal e monetário, levando o país a um déficit primário, inflação de 9%, desemprego e desconfiança geral de empresas e consumidores. O resultado é a recessão e o aumento do desemprego que se vê este ano.
Quando Levy assumiu, evitou a piora do quadro geral de "ruptura" que se desenhava, com perda do grau de investimento pelo país, fuga de capitais, câmbio nas alturas, mais inflação e todas as consequências que se pode esperar de um processo dessa natureza. Não se imaginava, porém, que as condições políticas ficassem tão fora de controle e que as investigações da Lava-Jato contaminassem tanto a economia e as forças políticas do Congresso. Aos sérios desequilíbrios da economia associou-se uma crise política. Desde então, está complicado avançar.
A fragilidade do governo da presidente Dilma Rousseff se soma à rebeldia dos presidentes da Câmara e do Senado, citados na Lava-Jato, formando um ambiente onde as propostas de Levy são desidratadas ou aprova-se medidas na direção contrária ao ajuste.
Fala-se em uma articulação política que estaria sendo conduzida por lideranças do PMDB junto a partidos da base e de oposição, para construir condições mínimas de governabilidade. Trata-se, porém, de conversas muito preliminares, com mais perguntas do que respostas. Elas se desenvolveriam em torno de um programa econômico mais amplo, como a aprovação da reforma do ICMS e do PIS/Cofins, desvinculação de receitas, repatriação de capitais, idade mínima para aposentadoria, dentre outras iniciativas.
Na avaliação de fontes qualificadas da área econômica, as maiores incertezas, hoje, não decorrem de questões econômicas nem de eventuais divergências na equipe do governo que não são segredo. Também não é segredo que o ex-presidente Lula gostaria de ver o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, na pasta da Fazenda. São as incertezas políticas, segundo essa avaliação, que estão na raiz das desconfianças dos empresários que não investem, e das empresas que não estão pagando os impostos, minando ainda mais as receitas públicas.
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