O desespero – e o desatino – parece ter tomado conta de vez do governo de Dilma Rousseff. Depois de reconhecer que não tem um “plano B” para o caso de ver rejeitadas no Congresso suas medidas apelidadas de “ajuste fiscal” e depois de avisar que o País não aguentará as consequências de novos gastos, o governo informa agora que pretende apelar até mesmo à legalização da jogatina para arrecadar dinheiro e, assim, tentar fechar suas contas.
Isso demonstra que a presidente Dilma Rousseff perdeu o pudor de cogitar soluções irresponsáveis para a violenta crise que ela mesma criou – e a legalização dos jogos de azar, vista há não muito tempo pelo próprio governo petista como temerária, certamente seria uma delas.
Na última vez que o Congresso debateu a legalização dos jogos de azar, em 2010, não faltou quem advertisse que se trata de uma atividade que facilita a ação do crime organizado, pois serve para a lavagem de dinheiro. Além disso, os empresários do jogo disporiam de um grande poder para corromper administradores públicos e integrantes do Poder Judiciário.
Convém lembrar, a esse propósito, que o primeiro escândalo dos governos petistas, ocorrido em fevereiro de 2004, estourou quando se soube que Waldomiro Diniz – então subchefe de assuntos parlamentares da Presidência da República, subordinado a José Dirceu, ministro da Casa Civil na época – fora flagrado em vídeo gravado em 2002 pedindo propina a Carlinhos Cachoeira, notório bicheiro goiano. Diniz queria o dinheiro para si mesmo e para financiar a campanha eleitoral do PT.
Era apenas o primeiro ano da Presidência de Luiz Inácio Lula da Silva, mas estava claro já ali que os projetos para a expansão do poder petista não respeitariam limites morais – perto do petrolão e do mensalão, o caso Waldomiro Diniz é coisa de amadores.
Na estratégia de redução de danos, que incluía baixar a poeira de uma CPI instalada para apurar o escândalo, Lula editou uma medida provisória para proibir bingos e caça-níqueis. Mas a ideia de legalizar o jogo não foi abandonada – o lobby dos empresários da jogatina conseguiu levar à votação na Câmara, em 2010, um projeto de lei específico sobre os bingos.
Na ocasião, os parlamentares governistas, com o apoio das bancadas cristãs e do Ministério Público, conseguiram impedir a aprovação. O governo Lula, a princípio ambíguo em relação ao assunto, tratou de empenhar-se na reta final para barrar o projeto porque temia que novos casos como o de Waldomiro Diniz pudessem complicar ainda mais uma administração que já enfrentava grandes escândalos.
Às vésperas da votação, a assessoria jurídica da Casa Civil emitiu um parecer segundo o qual o projeto poderia fortalecer o crime organizado no País. Ao mesmo tempo, a equipe econômica considerava que as casas de bingo poderiam ser usadas para delitos como sonegação fiscal e lavagem de dinheiro de contrabando e narcotráfico, além de caixa dois.
Na ocasião, o então deputado petista e futuro ministro da Justiça de Dilma Rousseff, José Eduardo Cardozo, argumentou que a legalização do jogo “traria mais malefícios do que benefícios para o País”.
Mas eis que o mundo dá voltas e agora, cinco anos depois, o lobby dos jogos de azar ganhou uma inusitada simpatizante – a própria presidente da República.
Seduzida pelos argumentos de que a jogatina pode reforçar o caixa do governo com recolhimento de impostos já no ano que vem, Dilma autorizou os governistas a sondar o Congresso sobre a legalização de bingos, cassinos e até do jogo do bicho. Como resultado dessa articulação, uma proposta do senador Ciro Nogueira (PP-PI) sobre o tema já foi anexada à chamada “Agenda Brasil”, conjunto de medidas para reaquecer a economia. Na justificativa, Nogueira, que é investigado pela Operação Lava Jato, chama de “discurso demagógico” a oposição aos jogos de azar.
Assim, incapaz de superar a crise por meios claros e diretos, Dilma começa a chapinhar em terreno movediço, cedendo à tentação das soluções mágicas – e nocivas – para o País. É brincar com a sorte.
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