quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Pedaladas fazem TCU reprovar contas

• Tribunal conclui que presidente descumpriu no ano passado Constituição e leis que disciplinam gastos públicos

• Palavra final sobre o balanço depende do Congresso, mas decisão dá fôlego a movimento pelo impeachment

Dimmi Amora, Márcio Falcão - Folha de S. Paulo 

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff teve as contas de 2014 de seu governo reprovadas pelo TCU (Tribunal de Contas da União) por unanimidade nesta quarta-feira (7).

O tribunal, que é composto por nove ministros, concluiu que a presidente descumpriu a Constituição e as leis que disciplinam os gastos públicos, o que impede a aprovação da prestação de contas do ano passado.

Com isso, ainda que não haja nenhum efeito imediato para Dilma, politicamente sua situação se complica. O principal pedido de impeachment em análise hoje na Câmara se ampara justamente nas pedaladas fiscais, uma das irregularidades apontadas como motivo para a reprovação das contas.

O governo tentou de tudo para adiar o julgamento, mas não conseguiu a suspensão da sessão no STF (Supremo Tribunal Federal), nem que o TCU considerasse relator do caso, o ministro Augusto Nardes, suspeito para votar. O Planalto o acusou de ter agido de forma politizada.

Agora, a AGU (Advocacia-Geral da União) espera uma decisão final do Supremo contra Nardes e avalia que outras medidas tomar.

A análise que o TCU faz das contas do governo é uma obrigação constitucional. O tribunal atua como os auditores externos que analisam os balanços das empresas, checando se o governo cumpriu a legislação ao administrar suas receitas e despesas.
O parecer do órgão deve ser enviado nesta quinta (8) ao Congresso, a quem caberá dizer se aprova ou não essa prestação de contas. Os parlamentares podem ou não acatar a opinião do tribunal.

Além do risco de levar água ao moinho do impeachment, a única implicação automática para Dilma é que, se o Congresso mantiver o parecer, ela estará impedida de concorrer numa próxima eleição.

A oposição usará a rejeição para reforçar a tese de que a presidente deve ser afastada do cargo por descumprir a lei. Isso porque entre as irregularidades apontadas pelo órgão, algumas, em tese, podem ser atribuídas a atos assinados pela mandatária, como decretos aumentando despesas sem cobertura de receita e sem aprovação dos parlamentares, o que é ilegal.

O governo, por sua vez, descarta a possibilidade de que a rejeição das contas reforce condições para o impeachment.

Distorções
O relatório de Nardes, com mais de 1.400 páginas, fez uma análise minuciosa dos gastos públicos em 2014. Num primeiro momento, foram apontadas 15 irregularidades que resultaram em distorções de R$ 106 bilhões.

As mais graves são referentes ao uso de bancos públicos para pagar despesas de programas sociais e de empréstimos a empresas e agricultores, as chamadas pedaladas, e a maquiagem nos balanços e orçamento públicos para evitar cortar gastos públicos em 2014, ano em que a presidente disputava a reeleição.

"Ficou evidenciado que diversos procedimentos afrontam de forma significativa, além dos artigos da lei, princípios objetivos e comportamentos preconizados pela Lei de Responsabilidade Fiscal caracterizando, dentro de análise técnica, um cenário de desgovernança fiscal", disse Nardes.

A defesa do governo de que os atos eram legais, foram praticados em outros governos e aprovados pelo TCU não foi aceita. O relator do caso, considerou que o "conjunto da obra" impedia a aprovação das contas.

As descobertas do TCU são consideradas pelos integrantes do órgão como a origem da crise econômica atual. O governo vinha escondendo há alguns anos que gastava mais do que arrecadava, mesmo descontados os juros. Fazia isso sem permissão do Congresso e dizendo o oposto, que estava economizando.

É a segunda vez que o TCU rejeita as contas de um presidente da República. A primeira foi em 1937.

Na época, o relator Thompson Flores rejeitou as contas do então presidente Getúlio Vargas e foi acompanhado pelo outros ministros. O parecer do tribunal, no entanto, não foi referendado pelo Congresso Nacional.

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