quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Arrumação do setor elétrico é vital para retomada econômica – Editorial / Valor Econômico

Mais uma despesa bilionária vai cair na conta dos consumidores de energia elétrica em consequência da Medida Provisória 579, de 2012. Transformada na Lei 12.783/2013, que prometeu proporcionar uma economia de 20% na conta de luz, na verdade, a MP 579 apenas postergou e turbinou os custos da energia, que voltam como bumerangue para assombrar a população. O mais recente caso é o pagamento de indenizações de ativos não amortizados de transmissoras de energia que tiveram as concessões renovadas pelas regras impostas pela medida provisória.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) levou pouco mais de três anos para calcular a indenização devida, que foi parar no bolso dos consumidores porque, nesse meio tempo, os fundos setoriais foram esgotados e o Tesouro, pressionado pela crise fiscal, diz não ter recursos para cobrir a despesa. A indenização foi calculada inicialmente em cerca de R$ 20 bilhões, o que teria impacto equivalente a 2% nas contas de energia, a ser distribuído pelos próximos oito anos. No entanto, o custo será mais do que o dobro disso, alerta a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace). O cálculo da associação leva em consideração que, além da atualização pela inflação medida pelo IPCA estabelecida pela lei, há uma portaria sobre o assunto esquecida pela Aneel que determinou que a indenização deve incluir a "remuneração" dos valores. A Abrace projeta que a despesa final vai superar os R$ 50 bilhões, elevando as contas em 5% e receia que esse aumento possa até inviabilizar alguns projetos industriais.

Sob o impacto do tarifaço de 50% feito em 2015 para corrigir outros desvios promovidos pela MP 579, o governo, ainda sob o comando de Dilma Rousseff, queria jogar o débito das indenizações para o próximo presidente, em 2019. Mas os crescentes problemas de caixa das transmissoras obrigaram que os pagamentos começassem pelo menos em 2017. O principal contemplado pelas indenizações será o grupo Eletrobras, que tem cerca de R$ 20 bilhões a receber por meio de quatro empresas. A indenização já foi reconhecida no balanço do segundo trimestre e contribuiu para o lucro líquido reportado pela holding.

Espera-se que a liquidação desse passivo aumente o interesse pelos leilões de transmissão de energia, que têm sido frustrantes e trazem preocupação para a expansão do setor elétrico, que será mais crucial com a retomada da economia. Na última licitação, em abril, dos 24 lotes ofertados, 10 não receberam proposta. O leilão programado para a semana passada foi adiado para 28 de outubro, mesmo depois de ter as condições melhoradas. A oferta compreendia 25 lotes e já tinha tido um aumento de 10,2% da receita anual permitida (RAP) para compensar a redução do financiamento do BNDES de até 70% para 50% pela TJLP, de 7,5% ao ano. Mas a data não era favorável por causa do ambiente de incerteza criado pelo processo de impeachment. Agora os investidores contam com retorno ainda maior para compensar as novas condições de financiamento.

As restrições físicas do sistema de transmissão de energia são um dos principais obstáculos para a expansão da energia eólica no país. No auge da crise de energia, não havia linhas de transmissão para levar a produção dos parques eólicos aos consumidores. A transmissão foi afetada por margens apertadas e praticamente apenas as estatais investiram na área nos últimos tempos, dispostas a aceitar baixas taxas de retorno.

Mas este não é o único problema da área de energia, que ainda sofre com várias das distorções criadas pela MP 579. A remuneração da produção de energia precisa ser adequada para incentivar os investimentos, assim como é necessário o desenvolvimento de alternativas de financiamento para os projetos que serão leiloados nos próximos meses, lista que compreende além das linhas de transmissão e da Celg Distribuidora, dois leilões de geração - um provavelmente ainda neste mês englobando pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) - e o de fontes eólicas e solar no fim do ano. No momento, o consumo de energia está em queda, de 1,3% de janeiro a julho deste ano. Mas deve crescer com a retomada da economia. É importante que o novo governo reorganize o setor, pautado pela qualidade de serviço e incentivo ao investimento, para ampliar a capacidade de produção.

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