- O Globo
O fim do ano legislativo chegou quando havia forte sentimento de fadiga em relação ao Congresso. Durante o ano, soubemos que de muitos desses deputados e senadores se podia esperar tudo. Eles voltam em fevereiro e é até um alívio esse tempo sem o parlamento. O recesso do Judiciário também vai ajudar o Brasil a descansar das recentes brigas entre ministros do STF. Essa crise está exaurindo o país.
O STF parece uma roleta-russa. Dependendo do ministro se pode ter uma condenação ou absolvição, uma liminar numa direção ou em outra. Uma prisão ou uma postergação de decisão. Um julgamento açodado ou um pedido de vista para impedir a decisão. A esperança de que o colegiado corrigisse eventuais erros se esvaiu diante da decisão a respeito do senador Renan Calheiros, em que o tribunal considerou que ele poderia continuar em cargo que está na linha sucessória do presidente da República desde que não assuma a Presidência da República. Se por algum motivo tanto Michel Temer quanto Rodrigo Mais não puderem exercer o cargo, a Constituição terá que pular o presidente do Senado e chegar à quarta pessoa da linha, a presidente do STF. Além disso, há as escaramuças diárias. Com tanta crise política e econômica, o país deveria ser poupado do triste espetáculo de ministros idiossincráticos gritando suas divergências jurídico-políticas.
O Congresso afrontou muito o país durante o ano, mas a maior das ofensas foi usar um projeto de iniciativa popular e alterar completamente seu sentido e direção. Era para ser lei anticorrupção e virou uma peça contra a investigação da corrupção. Antes tivessem tido a coragem de derrotar a proposta das Dez Medidas e, depois, apresentado um outro projeto, da lavra dos próprios parlamentares, em defesa de si mesmos. Em vez disso, usaram o projeto que chegou com mais de dois milhões de assinaturas como veículo para fazer o oposto. O ministro Luiz Fux pode ser derrotado no plenário, pode-se provar que ele estava errado, mas de fato deveria haver mesmo algum mecanismo que proibisse essa forma de adulterar um projeto popular. Ele não é sagrado, mas deveria ser respeitado.
Durante todo o ano vivemos no redemoinho em que a crise política agravava a crise econômica. A economia afundou por erros da administração Dilma, principalmente. Depois da queda provocada pela recessão com inflação alta, é difícil retomar o crescimento. Apesar de a crise ter raízes na economia, sair dela está sendo mais difícil pela barafunda política que dominou o país há algum tempo.
Não há esperança de melhora no curto prazo. O Congresso é o mesmo, as suspeitas que recaem sobre vários dos seus integrantes ficam mais firmes a cada dia. Então, é de se esperar que deputados e senadores continuem na mesma linha de tentativa de aprovação de medidas para protegê-los do avanço das investigações.
A Lava-Jato continuará sendo uma fonte dos tremores de terra no Congresso ou da luta de egos na cúpula do Judiciário, mas a culpa da crise que nos consome não é evidentemente da operação, mas dos fatos anteriores que estão sendo enfrentados pela investigação e punição dos culpados. A pouca esperança dos tempos atuais vem exatamente de que essa busca dos fatos e dos culpados permaneça.
O pior que pode acontecer é os poderes continuarem a dar motivo para esse sentimento de fadiga institucional que nos acomete neste fim de ano. Que seja apenas o cansaço natural de um ano particularmente difícil, em que o país viu no comando do Palácio do Planalto dois presidentes impopulares, viu um impeachment, enquanto vivia a agonia do segundo ano de uma recessão profunda.
O perigo desse sentimento de alívio pela chegada dos recessos parlamentar e do Judiciário é que pode-se concluir que a democracia como ela foi instituída no Brasil dá trabalho demais, afronta interesses da maioria, gera surpresas em bases diárias e pode paralisar o país como aconteceu em 2016. Desse Congresso com sua composição nada se pode esperar. Ele será assim até o final, mas do Supremo o país continua a esperar muito. Por isso, enquanto a toga ficar pendurada no cabide, que os ministros pensem na responsabilidade que lhes recai sobre os ombros neste particular e convulsionado momento do país.
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