- O Globo
• Corrupção continuará sendo a regra do nosso capitalismo de Estado
A Nova República morreu. À luz do que foi revelado de suas catacumbas, não existe mais chance alguma de restauração de sua legitimidade. Se ela não for enterrada e substituída, poderá sobreviver como zumbi, mas a política jamais terá capacidade de enfrentar os desafios que amarram o desenvolvimento da sociedade brasileira.
Essa é a hipótese mais provável, lamentavelmente. Os donos do poder restaurarão, com total falta de pudor, certa normalidade, e, com uma futura pequena melhoria da economia, decorrente do dever de casa básico, um ajuste modesto das contas fiscais, seguiremos nosso medíocre caminho: um gigante aprisionado na armadilha da renda média. E a corrupção continuará sendo a regra do nosso capitalismo de Estado e de nossa democracia de baixa qualidade.
O nó górdio tende a não ser desatado porque os parlamentares não têm nenhum desejo de mudar aquilo em que nem a Constituinte de 1988 mexeu: as regras do sistema eleitoral. As regras com as quais eles mesmos se elegem e exercem o poder. Por que mudar, então?
O pântano é composto de três lamaçais principais:
1 — O presidencialismo de cooptação. Nossos parlamentares têm todos os bônus, mas não têm o ônus de sustentar o governo;
2 — A eleição da Câmara de Deputados pelo sistema eleitoral do distritão (os estados), que terminou por fazer da capacidade de arrecadar recursos o fator de competitividade decisivo, quase único, nas eleições e no interior dos “partidos”;
3 — O fato de, pelas regras, o voto de cidadãos de estados pouco populosos valer muitíssimo mais do que o dos cidadãos dos maiores estados, mesmo sendo a Federação representada pela existência de um Senado em um Parlamento bicameral.
Assim, o nó górdio possivelmente continuará atado, a Nova República de pé, embora morta, e o país seguirá sua sina de sociedade profundamente injusta e desigual e economia ineficiente e pouco competitiva no cenário mundial.
Sofrerá mais a imensa maioria da população. Há outras três hipóteses:
1 — O sistema político encontra meios e motivação para se autotransformar. Uma Constituinte exclusiva da reforma política em que seus membros não possam se candidatar a cargos eletivos por certo período, por exemplo;
2 — A população volta às ruas, certamente com mais rancor do que em 2013, e, ou obtém transformações ou joga fora a água do balde com muito risco de a criança no banho ir junto, já que o caos é o método, nessas ocasiões;
3 — Alguma forma de “tenentismo”, jurídico, militar ou inesperado se impõe frente ao cadáver do sistema político desprovido de legitimidade, totalmente incapaz de reagir.
Nesse último caso, não responsabilizemos somente os futuros “tenentes”. A Velha República e seus vícios, até 1929, foi a principal responsável pela reação ao seu anacronismo e pelas graves consequências posteriores, incluindo a ditadura do Estado Novo.
*Sérgio Besserman Vianna é presidente do Instituto Jardim Botânico do Rio de Janeiro
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