Partidos criam frente contra o 'distritão', novo modelo para eleição
Daniel Carvalho, Angela Boldrini, Ranier Bragon | Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - Classificado por críticos como uma manobra para assegurar a reeleição dos atuais deputados federais, o "distritão" enfrentará forte resistência na votação em plenário na Câmara, onde precisará do apoio de pelo menos 308 dos 513 parlamentares.
O modelo, usado para candidaturas a deputado e vereador, substituiria o atual em 2018 e é apoiado pela cúpula do Congresso e pelos principais partidos aliados a Michel Temer. Mas as bases dos partidos resistem à proposta.
Comissão especial da Câmara que analisa a reforma política aprovou o modelo no final da noite de quarta (9) por margem apertada, 17 a 15.
"No plenário é outro cenário, ninguém sabe o que vai acontecer", resume a deputada Laura Carneiro (PMDB-RJ), que conduziu o seu partido nos debates da comissão. "Eles vão ter muita dificuldade com o 'distritão', para recompor a base. Eu espero que tenha subido no telhado e não passe", disse o oposicionista Ivan Valente (PSOL-SP).
Uma frente suprapartidária contra o "distritão" foi criada com membros da oposição e governo –PT, PC do B, PSOL, PR, PRB, PHS, PSD, PSB e PDT.
Patrocinado pelo então presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), hoje preso, o "distritão" foi rejeitado pela Câmara, em 2015. Agora, ganhou apoio em outras legendas governistas e dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
O senador afirmou, porém, que a Casa só vai aprovar o modelo se for uma transição para o voto distrital misto –em que metade dos deputados são eleitos por distritos e a outra por lista de candidatos elaborada pelos partidos.
Atualmente, deputados e vereadores são eleitos pelo modelo proporcional, com base no cálculo que usa toda a votação dada a candidatos de um partido (incluindo votos na legenda) ou coligação.
No "distritão", são eleitos os mais votados. Os votos dados aos não eleitos ou aqueles dados em excesso aos eleitos são desconsiderados.
Nos bastidores da Câmara o argumento pró-distritão tem sido o seguinte: no atual modelo é preciso que o partido reúna o maior número de votos. Logo, quanto mais candidatos lançar, melhor. No "distritão", vale lançar apenas os que têm chances reais.
Devido à proibição do financiamento empresarial, o dinheiro de campanha será escasso. Por isso, quanto menos pessoas para dividir recursos, melhor. Nesse cenário, os candidatos tendem a ser os que já têm mandato, o que dificultaria a renovação.
"Essa é uma tentativa de seguro-reeleição para os atuais deputados federais. Quem estuda sistema eleitoral sabe que a renovação é praticamente impossível dentro do 'distritão'", disse o deputado Henrique Fontana (PT-RS).
A comissão também aprovou a criação de mais um fundo público para bancar campanhas, de R$ 3,6 bilhões. As regras de distribuição do dinheiro não estão definidas.
A reforma tem que passar pelos plenários da Câmara e do Senado. No caso das alterações à Constituição, é preciso dois turnos de votação em cada Casa, com apoio de ao menos 308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores.
A comissão aprovou ainda o mandato de dez anos para ministros de tribunais superiores. Hoje, eles podem ficar até os 75 anos de idade.
A votação da proposta só deve ser concluída na próxima semana. Outras duas comissões debatem a reforma.
Sistema proporcional
SP elege 70 deputados, por exemplo
O quociente eleitoral, que definirá a distribuição de cadeiras, é calculado dividindo o total de votos pelo de vagas
Se um partido ou coligação atingiu cinco vezes esse quociente, ele terá cinco cadeiras, que destinará aos cinco mais votados
Distritão
SP elege 70 deputados federais. São eleitos os 70 candidatos mais votados
Os votos em candidatos não eleitos não influenciam na distribuição das cadeiras
Distrital misto
Eleitores são divididos em distritos e votam duas vezes: em um candidato (em distritos específicos) e em uma lista partidária
OS PONTOS DA REFORMA POLÍTICA
Medidas têm que ser aprovadas pelos plenários da Câmara e do Senado até setembro para valer nas eleições de 2018
Financiamento das campanhas
COMO É HOJE
Empresas estão impedidas desde 2015 de financiar os candidatos. Recursos vêm de pessoas físicas, do bolso dos próprios candidatos e dos cofres públicos (fundo partidário, que deve chegar próximo de?R$ 1 bilhão no ano que vem, e renúncia fiscal de TVs e rádios para veiculação da propaganda eleitoral)
EM DISCUSSÃO
Comissão da Câmara aprovou a criação de um segundo fundo público para custear todas as campanhas (presidencial, Senado, Câmara, Assembleias e governos estaduais), no valor de R$ 3,6 bilhões (esse valor pode variar a cada eleição, já que representa 0,5% da receita corrente líquida). Regras para distribuição serão definidas em lei posterior
Coligações
COMO É HOJE
Pode haver coligações entre as legendas
EM DISCUSSÃO
Acaba essa possibilidade para a eleição de deputados e vereadores. Medida já foi aprovada pelo Senado e está em discussão em uma comissão da Câmara. Precisa ser aprovada nessa comissão e no plenário da Casa
Partidos pequenos
COMO É HOJE
Partidos com baixíssimo desempenho nas urnas, os chamados "nanicos", já sofrem algumas restrições de financiamento e atuação parlamentar
EM DISCUSSÃO
Há regras mais duras para tentar barrar a existência dos "nanicos", como o fim das coligações (alguns nanicos só conseguem eleger candidatos por meio deste mecanismo) e regras de desempenho nas eleições (obtenção de ao menos 1,5% dos votos nacionais na disputa à Câmara), que tesouram direitos parlamentares e de financiamento das siglas que não obtiverem um percentual mínimo de votação nacional
Tribunais com indicações políticas
COMO É HOJE
Em tribunais como STF (Supremo Tribunal Federal), os ministros são indicados pelo presidente da República e aprovados pelo Senado. Não há mandato fixo, apenas aposentadoria obrigatória aos 75 anos de idade
EM DISCUSSÃO
Mandato de dez anos para tribunais com indicações políticas, como o STF. Medida aprovada preliminarmente em comissão da Câmara. Para valer, tem que passar ainda pelos plenários da Câmara e do Senado, com apoio de pelo menos 60% dos deputados e senadores
Sistema eleitoral (de deputados e vereadores)
COMO É HOJE
Vigora o sistema proporcional:
O eleitor vota em candidatos isolados ou na legenda
As cadeiras são distribuídas com base na votação total que determinada coligação recebeu (quociente eleitoral)
Por isso, às vezes um candidato é eleito mesmo recebendo menos voto do que um concorrente. Isso acontece porque os candidatos e partidos de sua coligação reuniram, no conjunto, mais votos. Isso é conhecido como "efeito-Tiririca"
EM DISCUSSÃO
Valeria o chamado "distritão":
São eleitos os mais votados
Diferentemente do sistema proporcional, os votos dados aos não eleitos ou os votos?dados em excesso aos eleitos são desprezados
Sem a necessidade de reunir o maior número de votos que conseguir, partidos lançam menos candidatos. Em geral, os mais conhecidos, que já têm mandato, o que dificulta a renovação
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