sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Os partidos lutam contra a dissolução | César Felício

- Valor Econômico

Quadro de 2018 e Distritão mostram que sistema sangra

A existência de 26 partidos na Câmara parece não ser suficiente para um grupo expressivo de deputados. Eles articulam uma fragmentação mais importante e buscam criar uma casa legislativa com centenas de legendas, na prática.

O distritão converte em majoritária a eleição para deputado, com o lançamento de diversos candidatos do mesmo partido por distrito. Não há nada mais dissolvedor de partidos que isto.

Um sistema distrital puro aproximaria a eleição para a Câmara da mesma fórmula que rege a eleição ao Senado. Na eleição para o senador, o partido escolhe um candidato em um arranjo de forças que envolve a candidatura ao governo, a barganha em relação à vaga de vice e de suplentes etc. O distritão é diferente: nos pequenos Estados é possível fazer a regência da divisão de espaços. Nas grandes bancadas, como São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, será a guerra de todos contra todos.

Cada deputado será um baronete, que nada deverá à sigla que lhe emprestou a filiação e a porta de entrada ficará mais estreita: por ela passarão os atuais deputados - que já contam com redes estabelecidas - celebridades que estejam na crista da onda, pastores evangélicos e milionários. Mesmo políticos com base regional estabelecida ou identificados com bancadas setoriais, como os ruralistas, feministas e os integrantes da turma da bala, terão dificuldades. Siglas como o Partido Novo, calcadas em uma política antipersonalista, terão chance zero de sucesso, estão fulminadas.

Estes são alguns dos defeitos do distritão. O sistema também tem uma virtude, uma única virtude, e talvez essa virtude esteja na base da resistência que a proposta enfrenta no Congresso. Eduardo Cunha no auge de seu poder e glória não conseguiu aprovar a emenda constitucional que estabelecia este sistema em 2015. Rodrigo Maia e Michel Temer podem fracassar agora. O prognóstico não é favorável, dado o placar apertado na Comissão Especial, de 17 votos a 15. O sistema torna o candidato a deputado mais dependente da vontade do eleitor. O nível de exposição aumenta.

O sistema atingiria mesmo governistas empedernidos, como o deputado Beto Mansur (PRB-SP), que é vice-líder de Temer. Ele teve 32 mil votos em 2014, e só se reelegeu porque estava na mesma legenda de Celso Russomanno (PRB-SP), que conquistou 1,5 milhão de sufrágios. "Adotamos a estratégia de concentrar o tempo de TV do partido para impulsionar a votação do Russomanno. Embora tenha sido prefeito de Santos, não sou um cara de grandes votações. O PRB também tem muito voto evangélico, e eu não sou evangélico", explica o parlamentar.

A estratégia, admite Mansur, teria que ser revista. "O problema maior será a guerra contra o próprio colega de sigla. Os partidos com esquemas regionais fortes, que terão candidatura a governador, estão apoiando. Porque neste caso o candidato a governador puxa voto. Quem não tem está contra, porque depende mais do apoio de prefeitos e vereadores".

Pulverização
Um estudo recente da consultoria MCM deixa claro que a mais pulverizada de todas as eleições presidenciais, a de 1989, foi também a mais imprevisível desde a redemocratização. Pesquisas do Datafolha compiladas pela empresa registraram que a pouco mais de um ano da eleição o primeiro ou o segundo colocado nos levantamentos terminou em primeiro ou segundo nas urnas, com a exceção da disputa pela sucessão presidencial de José Sarney. Em eleição pulverizada baixa o sarrafo para se passar para a segunda rodada e não por acaso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi para o segundo turno naquela eleição com 16,5% dos votos.

O panorama é de pulverização, com Lula às portas da morte política e o PSDB estraçalhado. Os grandes partidos tentam usar a reforma política para reduzir as opções presidenciais em 2018, mas é visível que os presidenciáveis de partidos médios e pequenos se animam. Ciro Gomes (PDT) já percorre o país e até mesmo Marina Silva (Rede) começa a se mover.

O mais recente presidenciável é o senador Álvaro Dias (PR), pelo Podemos. O paranaense busca montar equipe. Procurou o ex-ministro da Justiça e ex-tucano Miguel Reale Júnior, o jurista René Ariel Dotti e estará em São Paulo na próxima semana para suas primeiras conversas com economistas.

Sua nova sigla tenta surfar na onda do partido-movimento, em voga na França e na Espanha, mas trata-se de um nanico repaginado, o PTN, que na aposta de protagonismo deve ganhar adesões.

Álvaro Dias tem 72 anos e foi governador do Paraná há 27 anos. Voltou ao Senado em 1998 e desde então têm Estado na oposição, seja qual for o governo. Muito assíduo ao Congresso, é figura frequente nos telejornais, mas não é um articulador.
Seu mandato vai até 2022 e a sucessão estadual no Paraná está congestionada, já que um dos postulantes é o seu irmão, Osmar Dias, do PDT. Já na sucessão presidencial o senador do Podemos acredita que pode ocupar um espaço.

No Paraná, é difícil imaginar um político mais tradicional e velha escola que Álvaro Dias, mas fora do Estado ele pode ser apresentado como novidade. "A Operação Lava-Jato mudou o cenário eleitoral no país. Os tucanos e os petistas serão eliminados na preliminar. Quem ficar mais distante do establishment terá maior chance de se eleger. A eleição de 2018 vai ser parecida com a de 1989, quando Collor expulsava políticos de seu palanque", afirmou Dias, que naquele tempo era governador.

Ninguém, a não ser um obscuro vidente do Paraná, destes que fazem previsões em programas de auditório, aposta em sucesso da candidatura do Podemos. Pretensões como a de Dias mostram, contudo, como o cenário do próximo ano é complexo. Dificilmente o rol das "novidades" terminará no senador e quanto mais pulverizado o quadro, mais imprevisível o resultado se torna. Tanto a pulverização no cenário presidencial quanto cogitações como a do distritão convergem para o mesmo fenômeno: exangues, os partidos terão que lutar contra a dissolução. O sistema sangra.

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