Para escapar da discussão relevante sobre em que áreas deveria fazer seus ajustes orçamentários e como resolver o equilíbrio fiscal de longo prazo, o governo tem partido para uma inócua discussão semântica sobre se o que foi feito foi contingenciamento, corte ou bloqueio. Usualmente, todos os governos têm usado os três termos para dizer a mesma coisa: redução de limites orçamentárias dos ministérios por falta de receitas ou porque a despesa está acima do teto.
Por óbvio, os novos limites são estabelecidos apenas nas despesas discricionárias, já que gastos obrigatórios como previdência e pessoal não podem ser interrompidos.
No caso atual, a frustração de arrecadação, que coloca em risco o cumprimento da meta de resultado primário, é o motivo para os bloqueios realizados. Se o governo eventualmente conseguir mais receitas do que o previsto, pode reverter os cortes - ou contingenciamento, ou bloqueio.
O problema todo é que a falta de tração no PIB tem, na realidade, feito o governo perder receitas. Para piorar, eventos que poderiam reforçar bastante o caixa federal, como o leilão das áreas excedentes da cessão onerosa e a privatização da Eletrobras, ainda não cumpriram trâmites burocráticos suficientes para que os técnicos do governo possam incluí-los nas projeções de receitas. Somente esses dois eventos resolveriam todo o déficit fiscal mapeado para este ano.
O presidente Jair Bolsonaro e seu ministro da Educação, Abraham Weintraub, conduziram muito mal a discussão sobre o corte nessa área. Ao partir inicialmente para a bravata de dizer que os cortes seriam feitos em universidades onde havia "balbúrdia", citando especificamente três delas, o comandante do MEC provocou não só professores e estudantes, mas também tirou o aspecto técnico da discussão. Ao tentar recuperá-lo, o processo já tinha perdido o controle e o governo passou para a ofensiva linguística, tão inútil quanto, e passaram a lembrar o óbvio: todos os governos fizeram cortes orçamentários, inclusive na área da educação.
Nos últimos anos, os gastos obrigatórios (principalmente Previdência e pessoal) só subiram e ocuparam espaço daqueles de livre direcionamento (as despesas "discricionárias"), limite que ficou mais evidente após a emenda do teto de gastos, que impede o governo de ampliar suas despesas acima da inflação.
O Orçamento aprovado pelo Congresso havia colocado R$ 129,4 bilhões para as discricionárias, valor que os próprios técnicos reconhecem que já era complicado administrar. O contingenciamento anunciado em março empurrou esse limite para pouco menos de R$ 100 bilhões.
Algumas áreas já flertam com a possibilidade de parar seus serviços no segundo semestre. É ilustrativo lembrar da crise dos passaportes em 2017, quando o corte de gastos e os erros de coordenação entre a equipe econômica e o Ministério da Justiça culminaram na paralisação temporária do serviço, que depois foi revertida com remanejamento de verbas de outros setores.
A diferença que torna a situação mais difícil para o atual governo é que o bloqueio orçamentário em vigor se dá em uma base muito mais deprimida de despesas. Assim, é natural que hoje qualquer redução de limite orçamentário e financeiro seja mais notada do que há alguns anos, quando alguma gordura na estrutura de gastos ainda era evidente.
Além da penúria nas universidades, outros indicadores evidenciam a gravidade do quadro atual. Como mostrou o repórter Fábio Pupo na última sexta-feira, os investimentos da União no primeiro trimestre representaram apenas 0,35%, de longe o pior resultado da série histórica iniciada em 2007 e um mau sinal para as perspectivas econômicas do país.
Um novo contingenciamento está por vir ainda neste mês, conforme já indicaram autoridades, inclusive o ministro Paulo Guedes. Os números da área técnica apontam para um corte adicional de no mínimo R$ 5 bilhões aos R$ 29,8 bilhões anunciados em março.
Em que áreas esses limites serão reduzidos é mais um problema que o governo terá que administrar. Se a lição foi aprendida, deve-se evitar os erros na condução do processo e, com serenidade e equilíbrio, tratar o assunto de forma realista, mostrando que a grande questão, hoje, é resolver a equação fiscal a partir da reforma da Previdência e retomar o crescimento do país em bases mais elevadas.
Sem isso, não haverá alternativa que não seja cortar ainda mais. E, seja na Educação ou qualquer outra pasta, as reclamações virão e serão cada vez mais duras.
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