Na campanha eleitoral, Jair Bolsonaro prometeu adotar uma nova atitude contra a corrupção e a criminalidade na vida pública. Ao tomar posse, o presidente reiterou, perante o Congresso Nacional, o compromisso de “restaurar e reerguer nossa pátria, libertando-a, definitivamente, do jugo da corrupção, da criminalidade, da irresponsabilidade econômica e da submissão ideológica”.
Pois bem, diante da notícia do avanço das investigações relativas às movimentações financeiras do seu filho Flávio e do ex-funcionário do gabinete dele na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) Fabrício Queiroz, o presidente Jair Bolsonaro esqueceu o que havia prometido e reagiu ao modo antigo – aquele rejeitado contundentemente pela população. Em vez de apoiar o trabalho das instituições e facilitar o esclarecimento dos fatos, o presidente optou por denunciar espúrias alianças que estariam confabulando contra ele.
“Estão fazendo esculacho em cima do meu filho”, disse o Jair Bolsonaro, em tom exaltado. Não soube apontar, no entanto, nenhum elemento que pudesse desabonar o trabalho investigativo feito até agora. Além do mais, caso Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz entendam que houve algum excesso por parte das autoridades investigativas, eles têm, como todo cidadão num Estado Democrático de Direito, caminhos legais para fazer valer seus direitos e, se estiverem dispostos, apresentar suas versões do que teria ocorrido.
Ao ser questionado sobre as investigações envolvendo seu filho mais velho, o presidente Jair Bolsonaro ainda disparou críticas aos governos do PT e à imprensa, como se as investigações fossem apenas intrigas da oposição, real ou imaginária. De acordo com o Ministério Público (MP), foram encontrados “indícios de subfaturamento nas compras e superfaturamento nas vendas” de imóveis feitas por Flávio Bolsonaro durante seu mandato como deputado na Alerj. Entre 2010 e 2017, o parlamentar teria lucrado R$ 3,08 milhões com as transações imobiliárias, que envolveram 19 apartamentos e salas comerciais. O MP ainda constatou o “constante uso de recursos em espécie nos pagamentos”.
Foram precisamente essas suspeitas de lavagem de dinheiro que embasaram a quebra de sigilo bancário e fiscal de 95 pessoas e empresas deferida, no fim de abril, pela Justiça do Rio. Entre as pessoas investigadas, oito trabalharam no gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro.
As explicações até agora foram pouco convincentes. Na defesa técnica apresentada ao MP, Fabrício Queiroz alegou que recolhia os salários dos colegas e os distribuía a um número maior de assessores, para ampliar a rede de colaboradores de Flávio Bolsonaro. Esse esquema informal contraria a própria natureza do salário, que é remuneração personalíssima. Não é da competência de assessor remanejar destino de salário dos outros funcionários de gabinete.
Além disso, desde 2011, a Alerj dispunha de procedimento específico para ampliar a rede de colaboradores de um parlamentar, sendo possível destinar formalmente a verba referente a funcionários de gabinete a até 63 pessoas. Assim, a própria defesa de Queiroz afirmou que, no gabinete de Flávio Bolsonaro, não se seguia o procedimento previsto pela Alerj – e isso é de responsabilidade direta do parlamentar.
Não foi o PT quem disse isso, e muito menos a imprensa. Foi o próprio Fabrício Queiroz, cuja proximidade com a família do presidente é admitida amplamente. Questionado se Queiroz tinha confiança do seu pai, Flávio Bolsonaro disse: “Com certeza, ou não teria vindo trabalhar comigo. Ele convivia mais comigo. Mais de dez anos trabalhando comigo quase todo dia. Eu estava mais junto com o Queiroz algumas vezes do que com a minha família”.
Só os outros – só os “inimigos” – é que podem ser investigados? Aqueles que são próximos da corte presidencial estariam imunes a tais inconvenientes? O ministro da Justiça, Sergio Moro, poderia ajudar a esclarecer ao presidente Bolsonaro como a lei deve funcionar. Igualmente, para todos.
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