- Folha de S. Paulo
Autoengrandecimento curricular não está restrito a políticos
O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, mentiu no currículo. Disse que passou um período na Universidade Harvard, mas isso nunca passou de um plano jamais realizado. Witzel não está só. Da leva de políticos que ascendeu em tempos bolsonarianos, os ministros Damares Alves e Ricardo Salles também já foram apanhados turbinando o CV.
É coisa desse pessoal de direita!, acusará o leitor esquerdófilo. Infelizmente, não é tão simples. Dilma Rousseff e Celso Amorim, para citar apenas dois, também foram flagrados em momentos de autoengrandecimento curricular. O fenômeno não está restrito a políticos.
Levantamento da DNA Outplacement mostra que 75% dos currículos enviados aos RHs de 500 empresas no Brasil continham informações distorcidas. Os pontos sobre os quais os candidatos mais mentem são salário (48%) e fluência no inglês (41%). Escolaridade e títulos acadêmicos são deturpados por 10% dos profissionais.
Por que as pessoas insistem em mentir em CVs, quando se sabe que é grande a chance de se darem mal? O problema de base é que humanos temos uma relação complicada com a verdade. De um lado, nós a colocamos num pedestal intelectual e moral —há até situações em que furtar-se a ela constitui crime—, mas, de outro, são inúmeras as circunstâncias em que deixar de mentir configura grave falta social. Você elogia os quitutes de sua anfitriã, mesmo que eles estejam intragáveis.
Cria-se assim uma zona cinzenta que nos dá algum espaço para decidir entre mentiras inaceitáveis —as fraudes— e aquelas que são necessárias, o azeite da sociabilidade. E uma zona cinzenta é tudo de que o cérebro precisa para lançar-se em exercícios de autointeresse, nos quais ele tentará obter todas as vantagens para as quais consiga produzir racionalizações, ainda que débeis.
O trágico é que, quanto mais uma pessoa mente, menos incômodo ela sentirá em contar mentiras maiores.
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