- O Globo
Não
há um único dia em que investidores e empresários deixem de falar sobre a
ampliação do Bolsa Família. O vazamento de ideias é constante e varia conforme
a fonte do governo. Se vem da equipe econômica, a sinalização é de que não
haverá aumento de gastos. Se vem de ministros ligados à articulação política,
prega-se que uma solução será encontrada. Ontem, ao mesmo tempo em que o
ministro Paulo Guedes negou a hipótese de prorrogação do auxílio no ano que
vem, houve quem defendesse um mecanismo para acionar o orçamento de guerra, o
que facilitaria o aumento dos gastos. Limitar supersalários esbarra na
independência orçamentária dos poderes.
Em
sua carta mensal enviada a clientes, o Verde Asset, do economista Luis
Stuhlberger, comparou a atuação do governo na pandemia entre 20 países
emergentes. O Brasil, apesar de ser o mais endividado (85%), foi o que mais
gastou como proporção do PIB (9%). “Os únicos países emergentes que gastaram
parecido com o Brasil são Peru e Chile, ambos com grau de investimento e dívida
pública antes da pandemia próximas a 25% do PIB, com muita margem de manobra.”
O Brasil está dois degraus abaixo do nível de investimento e no mercado já há
preocupações de que um novo rebaixamento possa acontecer no final do ano.
Se
o objetivo do presidente é transferir recursos aos mais pobres para manter a
sua popularidade, o tiro pode sair pela culatra. O presidente da Abit, Fenando
Pimentel, que representa a indústria têxtil, também está preocupado com o fim
do auxílio no final do ano, o que pode afetar o consumo e a recuperação do
setor. Mas ele lembra que, mesmo que o Bolsa Família dobre de tamanho, nem de
longe terá o mesmo impacto do auxílio emergencial.
—
O auxílio emergencial custa R$ 50 bilhões por mês. O Bolsa Família é R$ 2,5 bi
mensal. Mesmo que o governo consiga dobrar o programa para R$ 5 bi, o efeito
sobre o consumo será muito mais limitado do que a ajuda que foi dada na
pandemia —afirmou.
A
ideia de liberar recursos limitando de fato o teto do funcionalismo parece boa,
mas enfrenta problema técnico. Segundo o relator da reforma administrativa na
Câmara, deputado Tiago Mitraud (Novo-MG), os orçamentos dos poderes são
independentes e o que pertence ao judiciário não poderá ser transferido para um
programa social do executivo. “Ainda mais quando for recurso de estados e
municípios”, explicou. O balão de ensaio parece que furou novamente.
Cautela
automotiva
A
Anfavea, que representa as montadoras de veículos, revisou de -45% para -35% a
estimativa de queda da produção este ano. O clima ainda é de cautela. Se em
setembro houve crescimento de 4,4% sobre agosto, em relação ao mesmo mês do ano
passado foram produzidos 11% menos veículos. Olhando para frente, o presidente
da entidade, Luiz Carlos Moraes, explica que ainda permanece um cenário de
incerteza: “Não dá para desconsiderar que a taxa de desemprego está em 13,8%,
que a taxa de juros aos consumidores está em 19%, que estamos tendo aumento de
custos acima do esperado, com aço, dólar, IGP-M. Estamos mais cautelosos por
enquanto”, explicou.
Ajuda
com os vetos
O sucesso no leilão de saneamento em Alagoas, na semana passada, pode ajudar o governo a manter os vetos feitos pelo presidente Jair Bolsonaro no novo marco regulatório. Bolsonaro vetou a prorrogação de contratos das empresas estaduais, quebrando acordo feito no Senado, mas o resultado do leilão pode fazer com que os senadores insatisfeitos mudem de ideia, segundo o presidente do Trata Brasil, Edison Carlos. “Foram R$ 2 bilhões de outorga, valor muito acima do esperado. Os governadores vão ver o potencial de dinheiro entrando no caixa. O novo marco já está tendo efeito sobre os leilões, e isso pode estimular os senadores a deixarem tudo como está, sem mexer nos vetos”, disse.
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