Educadores
definem métodos; educacionistas determinam metas, estratégias, políticas,
sistemas administrativos, financiamento. O educador vê e cuida de cada sala de
aula; o educacionista do sistema de todas as salas. O educador é como o
cientista que descobre a vacina; o educacionista é o sanitarista que desenha a
logística para a distribuição da vacina. Sem o primeiro não temos vacina, ou
método educacional, sem o segundo a vacina não chega a todos, como a escola não
atende a todos.
Para o
educacionista, a educação é o vetor do progresso, tanto para a eficiência
econômica quanto para a justiça social. Ele vê o futuro de um país com a cara
da escola pública no presente, porque todos os problemas da nação passam pela
educação do povo. Foi o que fizeram os políticos educacionistas em países como
Irlanda, Finlândia e Coreia do Sul.
A
economia depende de confiança, poupança, investimento, mas também de uma
população educada; a saúde requer saneamento e médicos, mas também educação; a
ética na política exige fim de impunidade aos eleitos, mas também eleitores
educados; a violência requer polícia, mas também educação com qualidade para
todos.
Para o
educacionista, o Brasil precisa escolher uma estratégia que lhe permita atingir
excelência educacional, e assegurar que, desde a primeira infância, todo
brasileiro tenha acesso à educação com a máxima qualidade. Diante da brutal
desigualdade entre nossas cidades, em renda da população, receita de município,
recursos humanos e gerenciais, além da diferença na vontade política de seus
prefeitos, a estratégia educacionista passa pelo envolvimento do governo
federal, na educação de base. Toda criança deve ser primeiro brasileira, não
municipal, cuidada pela nação, não apenas por sua cidade.
Para
alguns educacionistas, o caminho seria o governo federal transferir a cada
família o mesmo valor necessário para que ela busque a escola de seus filhos.
Para outros, essa solução não traria igualdade, porque os ricos complementariam
a bolsa e pagariam escolas melhores para os filhos. Por isso, há quem proponha
aumentar o valor do FUNDEB por criança, deixando cada prefeito administrar as
escolas de seu município. E há os que acreditam que esse caminho não quebra a
desigualdade entre cidades, porque a educação exige professores bem formados e
capacidade gerencial que não estão disponíveis na cidade. As crianças de
municípios pobres ficariam para trás.
Um
terceiro grupo de educacionistas defende a substituição paulatina dos frágeis
sistemas municipais, por um robusto sistema nacional único: uma carreira
federal de professores com requisito mínimo de formação, dedicação, avaliação e
plano de remuneração, padrões nacionais para a qualidade de edificações e
equipamentos, todas escolas em horário integral. Esta substituição do sistema
municipal pelo federal deve ser voluntária para o município e realizada no
ritmo que os recursos federais permitam, por cidade, ao longo de anos.
Para
obter excelência, o custo de cada aluno deve ser de cerca de R$ 15 mil por ano,
que permite pagar um salário de R$ 15 mil por mês ao professor, em salas com 30
alunos, e financiar todos os demais gastos da escola. Se a implantação desse
sistema ocorrer ao ritmo de 200 novas cidades por ano, o sistema nacional se
completaria em 25 a 30 anos. Supondo que se mantenha o número de 50 milhões de
alunos, e assumindo um crescimento econômico de 2% ao ano, com a manutenção da
atual carga fiscal, o custo total, ao final dos 25 anos, não passaria de 6,6%
do PIB. Esta alternativa é necessária e possível.
Quatro
fatores dificultam o Brasil aceitar o educacionismo. Nossos líderes não veem
educação como vetor do progresso; a mentalidade nacional não tem o sentimento
de que o Brasil é vocacionado para a produção intelectual com padrões de
qualidade internacional; nossa consciência sofre resquícios da escravidão e
aceita a ideia de que a escola não deve ter a mesma qualidade para todos; e o
imediatismo brasileiro não quer esperar os resultados de uma estratégia que
demora décadas para chegar a todo o país
Por
isso, é mais fácil ter bons educadores do que educacionistas de sucesso.
*Cristovam Buarque, professor emérito da Universidade de Brasília (UnB)
Nenhum comentário:
Postar um comentário