Bolsonaro já demonstrou que preserva mais os interesses da própria família
O presidente Bolsonaro já
avisou que pretende deixar para depois das eleições de novembro o anúncio do
programa social Renda Cidadã, novo nome da antes pretendida Renda Brasil.
Além de medida necessária
para neutralizar em parte o estrago produzido pelo desemprego, a criação dessa
ajuda à população mais pobre seria também um caça-votos. Como assim? Um
caça-votos ficará para depois das eleições? Fica entendido que esse adiamento teria
a ver com o tamanho da conta a ser repassada para a sociedade para o pagamento
desse novo benefício social, motivo de grandes desencontros dentro do governo.
Mas a questão principal é a de que as decisões-chave de política econômica também vão sendo sucessivamente adiadas. Desde o início de seu governo, o presidente Bolsonaro está comprometido com as reformas da administração e do sistema tributário. Mas, para além da demissão do secretário Marcos Cintra e da ameaça de cartão vermelho ao secretário especial do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, a reforma tributária não progrediu. O projeto nessa direção que tramita na Câmara é diferente do que tramita no Senado, que, por sua vez, é diferente do que pretende o ministro Paulo Guedes.
Há pouca esperança de que
a reforma tributária, sempre considerada tão urgente, seja aprovada ainda neste
ano. Faltam discussões? Ora, há mais de 30 anos se discute a necessidade de uma
reforma tributária. Não há tema que tenha sido mais escarafunchado do que este.
Projetos e mais projetos vão sendo apresentados, debatidos e... engavetados. A
coisa não anda.
Desde o início do seu
governo, o presidente Bolsonaro acena com mais de 120 privatizações. Até agora
só houve algum avanço no projeto da Eletrobrás, mas ainda assim é processo que
está sendo adiado para o fim da pandemia. O argumento é o de que a crise
desvalorizou os ativos e não convém vender empresas estatais nessas condições.
Enfim, esse também é um programa adiado para quando der. Enquanto isso, as empresas
estatais vão sangrando por falta de capitalização, tarefa que o Tesouro,
desmilinguido, não pode cumprir.
O único avanço
significativo no projeto de reformas ao longo desses quase dois anos de governo
Bolsonaro foi o da Previdência. Ainda assim, o que ficou decidido se deveu mais
aos esforços dos presidentes da Câmara e do Senado do que do empenho do
governo.
Há quem afirme que é
preciso que se crie antes um mínimo de consenso político. Falso: sempre que há
interesses contrariados, o consenso é difícil. Também não havia consenso para o
início da expedição de Vasco da Gama às Índias. Os Velhos do Restelo, dentro
das faixas do exercício do poder, e os defensores das corporações sempre estão
a postos para anunciar terríveis desastres a toda tentativa de reforma.
Na falta de consenso
político, é preciso construí-lo, tarefa para estadistas ou para aqueles que
elegem o interesse público como critério de atuação política. Infelizmente, não
é esse o perfil do presidente Bolsonaro. Ele já demonstrou que preserva mais os
interesses da própria família do que os demais.
Enfim, o Brasil continua sendo o país do futuro sempre adiado. A construção do futuro inalcançável, como a tentativa de tocar o horizonte.
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