Ato
continuo, no julgamento da Segunda Turma do STF, em andamento, os votos dos
ministros Gilmar Mendes, relator, e Ricardo Lewandowski foram pela suspeição de
Sergio Moro. Se vencedor esse
entendimento, obrigará que os processos contra o ex-presidente Lula recomecem
da estaca zero.
Diante dessas posições conflitantes estabeleceu-se o impasse nos julgamentos em andamento no STF que tratam das condenações do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva. O julgamento foi suspenso por pedido de vistas do ministro Kássio Nunes Marques e o colegiado do Supremo discute estratégias para superação desta inusitada situação.
O
episódio em questão reflete uma disputa interna no próprio Supremo envolvendo
os ministros Gilmar Mendes e Edson Fachin. As medidas e as consequências deste
e de outros julgamentos e desta disputa entre visões jurídicas distintas e seus
reflexos na sociedade brasileira, deveriam ser melhor avaliados pelos contendores e todos os membros
da mais Alta Corte brasileira: a
beligerância visível existente no próprio Supremo, entre os poderes da
República e a polarização política vivida na sociedade brasileira nos últimos
anos e atualmente, em plena pandemia, são situações que deveriam preocupar a cidadania
e toda a sociedade brasileira.
Como
entender esta realidade?
Como
a cidadania pode fazer a leitura destes episódios?
Nesta
conjuntura de tragédias sem fim, a disputa presidencial de 2022 é antecipada
nos meios de comunicação e na opinião pública em geral, tirando o foco dos
reais problemas econômicos, sociais e de saúde pública que a sociedade
brasileira enfrenta no seu dia a dia.
As
narrativas construídas na conveniência de cada discurso político traz embates
cotidianos sem nenhum foco na questão principal: o combate efetivo à pandemia
que deveria unir toda a sociedade. As pautas dos meios de comunicação e a
maneira de funcionamento dos entes federativos não ajudam a entender e superar esta
difícil realidade.
O
que mais poderia acontecer?
O
que se pode esperar dos governantes e da sociedade em geral frente a esta
realidade?
Quais
são as nossas urgências?
Na
vida real, longe dos palácios, uma boa parte da população continua abandonada à
própria sorte no seu trágico cotidiano de falta de leitos e de assistência
médica, na maioria dos municípios brasileiros, com cenas dantescas que
acompanhamos como normalidade no nosso dia a dia, no auge da pandemia.
Apesar
desta trágica realidade, ainda não temos um Programa Nacional de Vacinação com
metas e cronogramas estabelecidos que tranquilize e passe confiança à sociedade
brasileira, demonstrando a incapacidade governamental de planejar ações básicas
de combate à pandemia.
O ritmo de vacinação no Brasil continua lento
por falta de vacinas, as metas anunciadas pelo Governo Federal estão sendo adiadas,
diferente da situação de muitos países, cuja população já avança no processo de
vacinação. As evidências apontam que até o final do ano não teremos a população
brasileira vacinada, pela simples razão de que não há vacinas na quantidade
devida para o Brasil, no mercado internacional.
A
ideologização da pandemia e a falta de planejamento para enfrentá-la caminharam
e continuam a caminhar juntas, com consequências graves para a sociedade
brasileira. Embora a maior
responsabilidade seja do Governo Federal, que minimizou e minimiza a gravidade
da situação vivida pela população, a sociedade deve exigir posicionamentos
adequados dos outros entes da Federação, caso concreto do Supremo Tribunal
Federal, do Congresso Nacional, dos governadores e prefeitos: como eles estão
contribuindo para o enfrentamento da pandemia? O que se pode e o que está sendo
feito? Exige-se dos entes federados foco e uma resposta urgente frente à
tragédia vivida pela cidadania brasileira.
Em plena pandemia, a crise econômica e de
saúde pública que vive o Brasil traz para o cotidiano da sociedade cenas de
horror, de mortes por falta de leitos hospitalares e de oxigênio, da falta de
assistência médica em geral, inclusive na área privada, colocando, após um ano
de pandemia, a dimensão real da nossa realidade: a incapacidade da área federal,
dos estados e dos municípios de construir um programa mínimo, em diálogo com a sociedade
e o mercado, para o enfrentamento dos problemas urgentes provocados pela pandemia
no Brasil.
A
insegurança continua. Os dados em relação à contaminação e às mortes são
assustadores. São milhões de contaminados e milhares de mortos – colocando o
Brasil na liderança em relação a contaminados e mortos pela Covid 19 no cenário
internacional. Já não existem leitos
disponíveis na área pública, nem privada, na maioria das capitais brasileiras.
No
pior momento da pandemia, os milhões de brasileiros continuam abandonados à
própria sorte frente ao desemprego, à falta de uma renda emergencial que lhes
assegurem o mínimo de dignidade para atravessar a crise. O Governo Federal,
como principal responsável pela Política Nacional de Combate à Pandemia, com
sua política negacionista e plena de contradições, só faz agravar a situação
com falas que agridem ao bom senso.
O
esforço dos governos e de toda a sociedade, das lideranças políticas em
particular, é criar as condições de focar no que é principal: o combate e a
superação da pandemia, vacinando com a urgência devida toda a população. Pautar
e antecipar a disputa política-eleitoral de 2022, nesse momento trágico, no
auge da pandemia, desqualifica qualquer proposta política, mesmo a melhor
intencionada. Vive-se um sentimento de
impotência na sociedade, angustiando uma parte considerável da população que
não encontra caminhos e respostas à
difícil realidade brasileira.
Urge
medidas governamentais para o enfrentamento real dos problemas do cotidiano já
existentes, ampliados com a pandemia. A sociedade está desafiada a se unir a
favor de um Programa Nacional de Vacinação: vacinar com a urgência devida toda
a população é a única maneira de retornar a vida social com segurança.
As
polarizações das narrativas hoje existentes na sociedade, o proselitismo
político e os salvadores da pátria, assim como a antecipação da campanha
presidencial não resolvem, neste novo ano de pandemia, as dificuldades reais da
sociedade brasileira.
Desde
o mensalão até à Lava Jato, a sociedade brasileira ficou com a sensação que
mudanças positivas estavam acontecendo no Brasil: políticos no seu amplo
espectro ideológico e empresários corruptos foram indiciados, julgados e presos.
Muitos com confissões que abalaram a cena política e empresarial, causando
perplexidade à sociedade brasileira – o PT foi o partido que teve o maior
número de lideranças indiciadas, julgadas e presas: de José Dirceu a Lula,
incluindo presidentes, tesoureiros, ministros de Estado, diretores da PETROBRAS
e parlamentares. O PSDB, o principal partido de oposição ao PT, também teve
governadores, senadores, deputados, prefeitos denunciados, processados e presos,
atingindo uma das suas principais lideranças - na época da denuncia, presidente
nacional da agremiação e senador da república e ex- candidato a presidência da
República, Aécio Neves. Nos processos transitados e julgados foram devolvidos
centenas de milhões de reais aos cofres públicos. Os processos e as
investigações continuam.
Por
outro lado, deve-se combater a instrumentalização das instituições de direito a
favor de um determinado partido, empresa ou lideranças políticas e empresariais,
devendo ser fruto de preocupação e vigilância permanente da cidadania e de toda
a sociedade brasileira.
Então,
a expectativa da cidadania e da sociedade brasileira é que este seja um caminho
sem volta – uma conquista efetiva de toda a sociedade no combate à corrupção.
Naturalmente, aperfeiçoando e combatendo comportamentos judiciais que afrontam
o Estado de Direito e a Constituição brasileira.
Assim,
a construção e a afirmação da democracia não comportam ou não deveriam
comportar mais visões simplistas, binárias, do “nós contra eles”, como maneira
de realizar a política e enfrentar os complexos desafios da sociedade
brasileira.
Portanto,
podemos e devemos enfrentar a pandemia abrindo o diálogo necessário entre as forças
democráticas, no caminho de uma agenda que leve a um efetivo enfrentamento dos
reais e urgentes problemas econômicos, sociais e de saúde, trazendo para o
exercício da política a voz dos excluídos da sociedade, pressionando os que
governam a República para pautar os problemas reais da população, buscando a melhoria da
qualidade de vida de milhões de brasileiros que vivem em condições precárias de
moradia, sem segurança, educação, saúde,
saneamento e mobilidade urbana no
Brasil.
São estas as questões e os desafios a serem enfrentados por cada um e por todos nós se quisermos efetivamente superar a trágica realidade vivida atualmente, em plena pandemia, por toda a sociedade brasileira.
*George Gurgel de Oliveira, professor da Universidade Federal da Bahia, da Oficina da Cátedra da UNESCO-Sustentabilidade e do Conselho do Instituto Politécnico da Bahia
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