Os que nasceram em 2000 pisarão em três
séculos, se não sofrerem algum acidente, e tiverem sido corretamente
alimentados quando pequenos: o XX, na data do nascimento; o XXI, ao longo de
sua vida, e o XXII, quando deverá fenecer.
Mas este feito é uma exceção para aqueles que
nasceram antes da Grande Guerra, como Edgar Morin. E, sobretudo, alcançar um
século de existência em plena forma. Tal como Lovelock, que completou cem anos
em 2019, e lançou o livro Novacene, Morin acaba de publicar um livro (As lições
de um século de vida / Les lessons d’un siècle de vie), às vésperas de
completar um século de existência, o que ocorrerá no próximo dia 08.
Nascido em 1921, Morin, ainda muito jovem,
conheceu a guerra e aderiu à resistência contra o nazismo. Ingressou no Partido
Comunista Francês, com quem veio a romper, alguns anos depois. Uma mente ávida
de conhecimentos, avesso a dogmas, formado em ciências sociais e autodidata em
biologia e física, percorreu em sua vida dezenas de temas: comunicação,
imaginação, cinema, processo de modernização, questão ecológica, crise
civilizacional, transformação educacional, crítica à ciência reducionista,
reflexão sobre a teoria dos sistemas, entre tantas outras.
Habitante de muitas disciplinas tais como
sociologia, antropologia, ecologia, lógica, política, biologia, teoria do
sistema e filosofia, sem se deixar aprisionar por nenhuma delas. Inquieto,
curioso, apaixonado, leitor contumaz e escritor generoso, escreveu cerca de 70
livros, além de centenas de artigos e entrevistas.
Sua obra máxima reside em seis volumes nomeados como O Método. É uma obra escrita entre 1977 e 2004 e publicada em português pela editora Sulina, que trata, respectivamente, da natureza, da vida, do conhecimento, das ideias, da humanidade e da ética. Uma forma de se achegar a esta obra monumental é a leitura de A introdução ao pensamento complexo que Morin escreveu exatamente para permitir aos leitores em geral adentrar-se na reflexão sobre a complexidade.
Um dos pensadores mais respeitados da
contemporaneidade, é inclassificável. O que lhe rendeu muitos problemas na
Academia, que não está acostumada a tratar com profissionais que não têm uma
disciplina definida, determinada. Morin é um personagem transdisciplinar.
A crítica e a proposição marcam a sua trajetória
intelectual. Era um crítico contumaz do reducionismo da ciência moderna, que
separa o inseparável; que é incapaz de ver a totalidade dos fenômenos em suas
contradições. E sobre este tema escreveu vários livros, alguns de caráter
propositivo como Os 7 saberes necessários à educação do futuro e A cabeça
bem-feita, de grande repercussão entre os educadores brasileiros. O pensador
francês estava convencido que era necessário reformular a maneira como pensamos
e concebemos os fenômenos atuais, e para isso é imprescindível uma profunda
reforma educacional, na qual os estudantes não estudem os fenômenos naturais e
sociais separadamente, nem que o que está organicamente ligado fosse
segmentado. Na sua opinião, os jovens estudantes que adentravam o século XXI deveriam
aprender a conviver com a incerteza e as contradições, que constituem o fio da
vida.
Conhecido como o filósofo da complexidade, foi
reconhecido por mais de 20 universidades com o título de Doutor Honoris Causa e
sua obra está traduzida em mais de 30 idiomas. A América Latina o adotou. Em
diversos países, criaram-se centros de reflexão sobre a complexidade. Quase
todos os seus livros foram traduzidos para o português e o espanhol, e outros
tantos livros foram publicados sobre sua obra.
Neste ano de 2021, saem a público, no Brasil,
pelo menos dois. O primeiro, organizado por Elimar Pinheiro do Nascimento,
Mauricio Amazonas e Alfredo Pena-Veja, será publicado pela editora do SESC/SP,
com o título: Edgar Morin, homem de muitos séculos: um olhar latino americano.
Reúne 27 autores que escreveram artigos sobre suas relações com o homem e sua
obra, além de alguns ensaios críticos. São autores provenientes de sete países
latino-americanos: México, Panamá, Colômbia, Peru, Chile, Uruguai e Brasil. O segundo livro é também uma coletânea
organizada por Edgar Assis de Carvalho, que sairá pela Sulinas, de título Complexidade
no Século XXI.
O Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (CDS/UnB) organiza com o SESC/SP a apresentação do livro e uma conversa com os autores no dia 08 de julho, quinta-feira próxima, das 10:30 às 17 horas e no dia 09, sexta-feira, a partir das 14 horas, evento este que será transmitido pelo youtube cds unb.
*Sociólogo, com doutorado pela Université de Paris V (René Descartes, 1982), e pós-doutorado na École des Hautes Études en Sciences Sociales. Professor associado dos Programas de Pós-Graduação do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília e do Programa Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia da Universidade Federal do Amazonas (UFAM).
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