Valor Econômico
Pela proposta, redução da dívida vai levar
tempo
O anúncio do novo arcabouço fiscal pode
frustrar os mais céticos do mercado porque, tal como está sendo concebido, eles
não vão conseguir enxergar na regra uma redução imediata da dívida pública
bruta. Vai levar tempo para que isso aconteça. E vai ser menos por causa da
redução de despesa, pois o ajuste vai se dar forte na receita, que não vem da
regra, mas da reforma tributária. Segundo certo compromisso assumido pelo
governo, a reforma tributária terá que render ao menos R$ 100 bilhões aos
cofres da União.
Logo, eles (os céticos) não vão conseguir enxergar o todo do arcabouço fiscal de médio prazo na regra, diz uma fonte que está acompanhando a discussão da proposta, que ainda está em construção, de vincular a despesa ao PIB per capita e a receita ao PIB cheio.
Como o PIB cheio é maior do que o per
capita, ele vai reduzir a dívida bruta ao longo do tempo. A trajetória da
dívida será ainda de aumento, depois de ter caído para 73,1% do PIB em janeiro,
para depois se estabilizar e começar a cair.
Isso vai depender da aprovação da reforma
tributária relativa ao IVA - que será federal e terá também o IVA dos Estados e
municípios. Nesse quesito haverá um longo debate e, novamente, os céticos vão
olhar para um “copo meio vazio”, diz a fonte oficial.
“Não tem bala de prata para a questão
fiscal”, diz uma outra fonte, que lembra que, no segundo semestre haverá a
continuação da reforma tributária, relativa ao imposto sobre a renda e sobre o
patrimônio.
Enquanto isso, os estrangeiros estão
voltando para investir em renda fixa, observa a fonte. A preferência deles é
por papéis públicos que se situem na parte longa da curva de juros, que tem
pouca liquidez. Os investidores brasileiros ainda devem demorar um pouco para
aplicar em títulos da dívida, suspeita a fonte.
Dados do Banco Central indicam que nas
últimas semanas houve um ingresso mais substancial de investidores não
residentes. No ano, até o dia 24 de fevereiro, houve ingresso tanto no
comercial quanto no financeiro, de US$ 8,7 bilhões, o que não é pouco.
O arcabouço fiscal tende a ter uma regra
única e será calculado com base em projeções quer o Ministério da Fazenda fará
para o PIB per capita assim como para o PIB cheio.
Vai ser uma regra única: a despesa cresce
de acordo com o PIB per capita e as receitas serão corrigidas pelo PIB
integral. Não contém, portanto, um sistema de incentivos para o governo cortar
gastos, de forma a se aproximar de uma dívida de 60% do PIB, que se
convencionou ser o limite para os países emergentes.
Há a expectativa de que o mercado doméstico
se acalme a partir de alguns elementos que começariam a mudar o jogo. Sejam os
anúncios de medidas fiscais, seja o humor dos não residentes, que estão mais
serenos. Os residentes estão com um mau humor exagerado, na opinião de fontes
oficiais.
“Estamos, em comparação com o resto do
mundo, relativamente bem. Estamos com a dívida menor que estava antes da
pandemia. Gastamos muito e mesmo assim terminamos melhor do que era antes da
pandemia”, comenta a fonte. Apenas dez países no mundo conseguiram se manter
com as contas em equilíbrio e com a dívida menor do que antes da covid-19
O fato de o ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, ter sido bem-sucedido na reoneração dos combustíveis e enfrentado a
área política do PT é um outro fator que conta muito para virar o jogo junto ao
mercado financeiro doméstico. Acredita-se, no meio oficial, que o mercado já
estaria “se acalmando”. A curva de juros estava fechando nos últimos dias, mas
essa é uma percepção muito recente.
Exemplo do mau humor foi a reação contra o
aumento do salário mínimo e o reajuste da tabela do Imposto de Renda. Ambas
representariam um impacto sobre a despesa de pouco mais do que R$ 5 bilhões.
“Isso é nada!”, comenta a fonte, e o governo comprometeu-se em fazer
compensação - provavelmente ele vai cortar gastos equivalentes de forma que o
impacto seja neutro.
A taxa de juros alcançou os níveis do
período pré-impeachment da então presidente Dilma Rousseff. Atingiu 6,5% em
termos reais e agora começou a cair para algo próximo a 6,2% e 6,3%, patamar
ainda bastante alto.
Segundo as fontes oficiais, Haddad anuncia
ainda em março o novo arcabouço fiscal, que substituirá o teto de gastos. Mas a
PEC (Proposta de Emenda Constitucional) deverá chegar ao Congresso Nacional em
abril. A PEC vai, como dito no início da coluna, dar um norte, mas não vai
resolver nada no curto prazo. Quanto à dívida, ela garante que não vai explodir
para 90%, 100% do PIB. “É positiva, tem uma história boa para contar, mas é um
esquema de médio prazo”, comenta.
Turma do projeto
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann,
reiterou, ontem, o pedido da cabeça do presidente do Banco Central, Roberto
Campos Neto. O argumento para que o governo o convença a renunciar ou o
presidente Lula o demitir - duas soluções apontadas por ela - é que Campos Neto
não faz parte da turma do projeto que venceu as eleições.
O projeto, no entanto, não deve ser a mera
repetição do então presidente do BC, Alexandre Tombini, que deu um cavalo de
pau na taxa básica de juros (Selic) em agosto de 2011, porque o ministro da
Fazenda de então, Guido Mantega, acenou com um reforço da meta de superávit
primário de R$ 10 bilhões.
Depois de aumentar os juros para 12,5% ao
ano, o Copom cortou os juros na reunião seguinte em 0,5 ponto percentual, dando
início a um processo de queda da Selic que foi até 7,25%. Pressões
inflacionárias, porém, o levaram o comitê a aumentar os juros até 14,25% ao
ano. Esses são atalhos que já experimentamos e não deram certo. Agora, tem gente
no PT que cobra uma queda dos juros por causa da medida de reoneração dos
combustíveis.
Amigos do presidente do BC dizem que Gleisi
está blefando.
“Eles querem que o Roberto permaneça para ser responsabilizado pelo que der errado. São os amigos do Roberto que querem que ele renuncie”, disse um deles.
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