sexta-feira, 3 de março de 2023

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Começo errático de Lula deteriora quadro econômico

O Globo

Indicadores como PIB apresentaram bons resultados em 2022, mas adesão ao ideário dilmista já os põe em risco

Em termos comparativos, o ano passado foi bom para a economia brasileira. O PIB avançou 2,9% em 2022. Foi apenas o 35º melhor desempenho entre todos os países do mundo, mas acima da média brasileira dos últimos anos. O mercado de trabalho viveu uma recuperação surpreendente. A taxa de desemprego anual de 9,3% foi a menor desde 2015. A inflação foi de 5,79%, quase metade da registrada em 2021. Por fim, o setor público registrou superávit de R$ 126 bilhões, primeiro resultado positivo em oito anos.

É verdade que parte desses resultados não é sustentável. No quarto trimestre, o PIB recuou 0,2% em relação ao terceiro, efeito sobretudo dos juros que subiram ao longo de todo o ano para conter a inflação (e fecharam 2022 em 13,75%). O superávit nas contas públicas também foi influenciado por fatores conjunturais, como o adiamento no pagamento de dívidas e receitas extraordinárias que não se repetirão. De todo modo, foi esse o Brasil que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu ao tomar posse. O julgamento sobre o seu governo terá como base de comparação esses números.

Lula começou bem nas esferas política, ambiental e externa. Resgatou a confiança na democracia, a preservação da Amazônia e o papel internacional do Brasil. Na economia, infelizmente ele tem sido errático e retomou o ideário que já deu errado no governo Dilma Rousseff. Insatisfeito com os juros, criticou a autonomia do Banco Central (BC), conquista inquestionável na governança monetária. Com ataques pessoais ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, tentou baixar os juros na marra, como se a Selic fosse simples questão de preferência pessoal, e não resultado da análise criteriosa em cima de modelos testados e comprovados pela equipe técnica do BC.

Agora, em nova investida à moda de Dilma, Lula tenta intervir no preço dos combustíveis. No discurso, o governo critica o lucro recorde da Petrobras — R$ 188 bilhões em 2022 — e diz que os brasileiros ficam à mercê das flutuações no preço do barril de petróleo. A solução proposta é retirar dinheiro dos acionistas da empresa para beneficiar o “povo”. Aplicada no governo Dilma, a ideia levou a empresa a acumular a maior dívida do planeta (mais de US$ 160 bilhões). Obrigada ainda a reconhecer os danos da corrupção, a Petrobras quase foi à bancarrota.

O preço do petróleo é ditado pelo mercado internacional. O resultado astronômico da Petrobras é circunstancial. Decorre da alta que se seguiu à retomada da pandemia e à guerra na Ucrânia. Assim como não faz sentido a empresa recorrer ao Tesouro em anos ruins, o governo não deveria intervir na política de preços em anos bons, para não desvalorizá-la no mercado acionário nem prejudicar sua capacidade de investimento.

Poderia usar os dividendos a que tem direito como maior acionista para subsidiar os combustíveis, mas essa decisão cabe ao Congresso — e também teria custos. Mascarar o preço nos postos incentiva o consumo em tempos de alta, quando há necessidade de reduzir emissões de gases. Não faz sentido. Por fim, é contraditório um governo que se diz a favor dos pobres tomar uma medida que beneficia quem tem carro.

Lula ainda tem tempo para mudar de rumo. Mas é bom não demorar, do contrário sua adesão ao ideário dilmista se fará sentir não apenas nos indicadores econômicos, mas também em sua popularidade.

Recuperar patamar de vacinação exige mais que imagens de impacto

O Globo

Fotografia de Alckmin aplicando vacina em Lula é simbólica, mas índices brasileiros são preocupantes

Foi simbólica a cena do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de 77 anos, vacinado pelo vice Geraldo Alckmin no lançamento do Movimento Nacional pela Vacinação. Desde que as vacinas contra a Covid-19 surgiram, em fins de 2020, são comuns as imagens de chefes de Estado e governo posando para as câmeras no momento da agulhada — mas não no Brasil, onde o ex-presidente Jair Bolsonaro preferiu se engajar na campanha antivacina.

Melhorar a cobertura da vacinação no país, no entanto, exigirá mais que imagens de impacto ou boa vontade. É fundamental que o Ministério da Saúde crie estratégias para convencer os brasileiros a se vacinar. Espera-se que sejam retomadas campanhas maciças de publicidade para explicar a importância da vacina e neutralizar as mentiras espalhadas pelos grupos antivacina. A vacinação infantil é mais vulnerável a ataques, e muitos pais vacinados hesitam em levar os filhos aos postos diante do bombardeio de desinformação. Daí ser essencial o esclarecimento.

Outra iniciativa importante é facilitar a vida de quem precisa tomar as vacinas. Não basta comprá-las e distribuí-las. Pesquisas encomendadas pelo próprio Ministério da Saúde mostram que problemas logísticos, como horário de funcionamento, localização dos postos ou eventual falta de estoques, contribuem para a cobertura baixa. É preciso reproduzir as boas experiências de municípios que aumentaram seus índices levando as doses a escolas e pontos de grande concentração, como estações de transporte público.

Índices de vacinação para praticamente todos os tipos de doenças têm despencado nos últimos anos, e não dá para culpar apenas o governo Bolsonaro. O problema vem se agravando pelo menos desde 2015. No ano passado, nenhuma vacina atingiu a meta fixada pelas autoridades. Do calendário infantil, preocupa especialmente a cobertura da tríplice viral, que protege contra sarampo, rubéola e caxumba. Em 2022, 80,2% receberam a primeira dose, mas apenas 57,1% voltaram aos postos para a segunda. O sarampo, altamente transmissível, chegou a ser varrido do Brasil — em 2016, o país recebeu o certificado de erradicação —, mas, por falta de vacinação, reapareceu em 2018 e voltou a fazer vítimas.

É um erro acreditar que não há necessidade de vacinar as crianças contra doenças que não estão em circulação, como a poliomielite. A situação só está sob controle graças à proteção conferida pela vacina. Quando os índices caem, como agora, a população fica novamente exposta, e é grande o risco de doenças erradicadas reaparecerem.

O sucesso do Programa Nacional de Imunizações (PNI) depende da coordenação entre o Ministério da Saúde (que compra as vacinas), os estados (que as distribuem) e as prefeituras (que as aplicam). Pode parecer tarefa árdua considerando as diferenças entre os 5.570 municípios brasileiros e as distâncias a superar. Mas é perfeitamente viável. Prova disso é que, até meados da década passada, o país ostentava índices de vacinação que eram referência para o mundo. É possível vencer o retrocesso.

O pouso do PIB

Folha de S. Paulo

Lula, que fez pouco do resultado de 2022, deve encarar desaceleração sem mágica

Com queda de 0,2% no quarto trimestre, a economia brasileira encerrou 2022 com crescimento de 2,9%. O resultado final foi bem superior ao esperado de início, mas a perda de vigor aponta dificuldades no presente e no futuro próximo.

No primeiro semestre do ano passado houve dinamismo, resultado da abertura após o pior da pandemia, que impulsionou principalmente os serviços e teve forte impacto na geração de empregos. Naquele momento, o Produto Interno Bruto se expandiu em ritmo anualizado na casa dos 4%.

Já na segunda metade do ano, com aperto dos juros para conter a inflação e esgotamento do impulso de demanda, mesmo com as medidas eleitoreiras de Jair Bolsonaro (PL), ficou evidente o risco de desaceleração, que agora se confirma.

As perspectivas para 2023 são modestas, de alta entre 0,5% e 1% nas projeções mais comuns entre os analistas. Parte desse prognóstico se assenta na expansão da agropecuária, em razão das boas expectativas para a safra de grãos com preços ainda elevados. Assim, o PIB deve voltar a ter variação positiva neste primeiro trimestre.

Mais adiante, contudo, o quadro é de estagnação ou avanço fraco da indústria e dos serviços. As estimativas apontam para aceleração apenas dos gastos públicos

Em circunstâncias normais, já seria o momento de visualizar o início de cortes de juros —hoje a taxa básica está em 13,75% ao ano— por parte do Banco Central, mas tal providência é incerta diante da inflação elevada e dos ruídos em torno do rumo da política econômica, alimentados pelo próprio governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O embate do presidente com o BC, como já se tornou óbvio, é contraproducente. Os queixumes contra as metas para o IPCA não favorecerão a redução da Selic, dado que diversos indicadores de preços, como o do setor de serviços, ainda se encontram acima dos 6% em 12 meses, sem sinais claros de queda.

O perigo principal agora é que a impaciência do governo leve a medidas aventureiras, como nova rodada de aumento de gastos e intervenções setoriais que no passado só trouxeram instabilidade.

Para Lula, que fez pouco do resultado do PIB de 2022, o desafio será levar a economia a progredir de modo duradouro. Para tanto, a receita passa por sinalizações claras de que haverá controle da dívida pública, reformas consistentes na área tributária e preservação de um ambiente institucional que favoreça investimentos.

Na infraestrutura, em particular, deve-se buscar reforço das agências reguladoras, concessões e parcerias público-privadas.

Assim se derrubam juros. Progredir dá trabalho e demanda mais que discursos inflamados.

O salário delas

Folha de S. Paulo

Legislação já proíbe diferenças por gênero; igualdade virá com mudança cultural

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou que, na próxima quarta (8), Dia Internacional da Mulher, apresentará um projeto de lei que pretende assegurar igualdade salarial entre os gêneros.

A intenção é louvável, mas não está claro qual será a grande inovação, já que tanto a legislação vigente (CLT, art. 461) como a Constituição (art. 7º, XXX) já proíbem a discriminação salarial para pessoas que exerçam a mesma função na mesma empresa, não apenas por gênero mas também por "idade, cor e estado civil".

Por certo nem toda diferença salarial é ilegítima, como no caso da antiguidade. É razoável que uma pessoa com mais tempo de casa ou no exercício de uma função ganhe mais do que o novato. A CLT regula até o número de anos necessários para configurar essa situação.

O mesmo ocorre nas promoções por mérito. Uma empresa pode aumentar o salário de um funcionário que tenha, por exemplo, recebido proposta de um concorrente.

Daí não decorre, claro, que a lacuna salarial entre os gêneros não seja uma realidade a ser combatida. Contudo esse fenômeno também tem origem em mecanismos sociais sutis e complexos que vão além do machismo (real) de patrões.

A literatura acadêmica mostra que parte da diferença de rendimentos se deve ao fato de mulheres tipicamente trabalharem menos horas do que homens, entre outras razões porque têm dupla jornada —também cuidam dos filhos, da casa e de parentes adoentados, sem mencionar a gravidez, que gera interrupções na carreira.

Elas também tendem a ficar com empregos que remuneram menos, pois empresas que pagam acima da média do mercado costumam exigir disponibilidade total —para viagens, em fins de semana ou no meio da noite. De novo, a divisão social dos cuidados domésticos torna mais difícil que mulheres ofereçam isso aos empregadores.

Pesquisas nos EUA mostram que aquelas que optam por não casar e não ter filhos ganham tanto quanto os homens. Em casais homossexuais femininos, em geral um dos membros fica mais disponível para o trabalho fora de casa e não sofre discriminação salarial.

Chegar à igualdade entre os gêneros exige bem mais do que o reforço de normas trabalhistas já vigentes. É necessário rever os papéis sociais desempenhados por homens e mulheres, no lar e no mercado. São mudanças culturais profundas, que não surgem por decreto.

Ideologia do MST, um latifúndio improdutivo

O Estado de S. Paulo.

As recentes invasões são caso de polícia, mas também de política. O País demanda que o presidente as condene como o que são: atentados contra o setor mais produtivo da economia

Como se sabe, a narrativa conjurada por Lula da Silva nas eleições de 2022 é de que ele seria a única alternativa para salvar a democracia do autoritarismo. Ele e seu partido seriam menos os chefes do que abnegados servos de uma “frente ampla democrática” destinada a conciliar uma sociedade profundamente dividida.

Traduzido para o campo, esse discurso implicava um rebranding do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o MST. Ele já não seria um aparelho revolucionário socialista guiado pelo lema “ocupação é a única solução”, mas um conglomerado pacífico de cooperativas, repetidamente celebrado como “o maior produtor de arroz orgânico desse país”. Mentiras deslavadas, como quando Lula disse em um dos debates eleitorais que o MST nunca invadiu uma propriedade produtiva, foram descontadas como peças de retórica toleráveis em nome da redenção da democracia.

Mas as fissuras na narrativa estavam lá para quem quisesse ver. A desconfiança do agronegócio era tratada como mero preconceito de classe. Nos cercadinhos de Lula, pululavam referências ao agro como vilão ambiental. De vez em quando, o conciliador deixava transpirar velhos cacoetes. O “capiau” paulista seria “ignorantão” e “chucro” – mas, como o insulto aludia a Jair Bolsonaro, foi contemporizado. Falando sobre o agronegócio ao Jornal Nacional, escapou um “fascista e direitista” – mas seria só “um setor”.

Já no poder, a narrativa começou a ruir, com o desmembramento esquizofrênico da pasta da Agricultura em um Ministério da Agricultura e outro do Desenvolvimento Agrário. Agora, as fissuras ameaçam abrir-se em crateras.

Nesta semana, 1,7 mil militantes do MST invadiram três fazendas de eucaliptos na Bahia. De improdutivas, nada têm. Pelos dados da proprietária, a Suzano, só na região ela gera 7 mil empregos e beneficia 37 mil pessoas pelo efeito renda. Mas, como deixou transparecer a líder do MST na Bahia, Eliane Oliveira, o objetivo não era mesmo denunciar latifúndios improdutivos, mas só chantagear o governo para ocupar cargos no poder: “O MST acendeu o alerta amarelo diante da demora do governo federal em nomear a presidência do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária)”.

Nos governos Temer e Bolsonaro, e a rigor já no governo Dilma, o Incra vinha se dedicando cada vez menos a aumentar o número de assentamentos e cada vez mais a melhorar as condições de vida das famílias, transformando os assentamentos em comunidades capazes de alcançar mais produção e renda, por meio de programas de capacitação, ofertas de insumos e melhorias de infraestrutura e moradia. Essas medidas vinham combinadas a políticas de titularização, que só nos últimos 4 anos emitiram o dobro dos 200 mil títulos emitidos em 13 anos da gestão lulopetista.

Com a titularização, os assentados tornam-se agricultores familiares, capazes de decidir os rumos de sua propriedade e colher os frutos de seu trabalho. Mas, com isso, deixam de ser massa de manobra do MST e objeto de tutela política do PT. Um Incra autônomo, por sua vez, já não serve para rotular automaticamente toda terra invadida pelo MST como “latifúndio improdutivo”.

A invasão é, antes de tudo, um caso de polícia – a ver se o governo petista da Bahia agirá prontamente para restabelecer os direitos de propriedade violentados. Mas é também um caso de política. O PT tem uma inegável ligação umbilical com o MST. Foi o “exército do Stédile”, referindo-se ao chefão do MST, João Pedro Stédile, que Lula ameaçou botar na rua quando contrariado com o impeachment de Dilma Rousseff; e foi esse exército que ergueu barracas ao redor da carceragem da Polícia Federal de Curitiba, onde se hospedou Lula por 500 e tantos dias. O Brasil tem pressa de saber se seu presidente, o autodeclarado líder da “frente ampla democrática”, condenará, sem adversativas, as manobras do MST como aquilo que são – crimes contra o setor mais dinâmico e produtivo da economia nacional – ou se passará a mão na cabeça dos arruaceiros, seja omitindo-se, seja apelando para justificativas que ofendem a inteligência alheia.

É mais um teste que se coloca ao figurino democrático do PT. Será uma surpresa se o partido passar.

A inacreditável volta do Imposto de Exportação

O Estado de S. Paulo.

Taxar exportações é medida anacrônica e medíocre, sobretudo para fins fiscais. Espanta que o governo Lula tenha optado por proposta como esta num momento de tantas incertezas

O governo conseguiu sair da enrascada em que havia se metido ao prorrogar a equivocada desoneração dos combustíveis, adotada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro na véspera da eleição, e felizmente determinou a volta da tributação sobre gasolina e etanol. No anúncio da medida, no entanto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, informou que as alíquotas serão mais baixas e, para compensar a perda, o governo vai ressuscitar a taxação de exportações – desta vez, sobre o óleo bruto.

O Imposto de Exportação (IE), como todo tributo regulatório, pode ser cobrado de forma imediata, sem respeito ao princípio da anterioridade. Essa situação peculiar se deve ao fato de que esse tipo de tributo, mais do que intenções meramente arrecadatórias, tem o objetivo de induzir o comportamento dos agentes e estimular ou reprimir o consumo de algum item. O governo, no entanto, não escondeu qual era o principal motivo a justificar a criação do Imposto de Exportação sobre o petróleo: arrecadar os R$ 6,66 bilhões de que o Executivo abriu mão ao não ter coragem de aplicar integralmente as alíquotas de PIS e Cofins sobre gasolina e etanol em vigor até meados do ano passado. Ou seja, o objetivo é exclusivamente arrecadatório – razão pela qual não será surpresa se o caso for parar na Justiça.

Há inúmeros motivos para ser contra a aplicação do Imposto de Exportação. Embora sua existência tenha sido assegurada pela Constituição de 1988, o imposto não faz parte da tradição tributária brasileira e foi utilizado pouquíssimas vezes ao longo da história – como na crise mundial de 1930, época em que incidiu sobre o café. Na atualidade, trata-se de um imposto em completo desuso – afinal, em um mundo globalizado, o esforço da maioria dos países é reduzir custos internos para ampliar a competitividade de seus produtos e serviços.

Sempre há exceções a regras universais, e o País acaba de se juntar a uma das mais célebres delas. A Argentina adotou não só esse tipo de imposto, como também cotas máximas para vendas externas, em tentativas malsucedidas de garantir o abastecimento e conter os preços de itens como trigo, carne e soja. No Brasil, o Congresso chegou a levantar discussões sobre o Imposto de Exportação em junho do ano passado, mas ficou muito claro tratar-se apenas de um blefe com outros objetivos implícitos – pressionar a Petrobras a espaçar os reajustes e aprovar a lei complementar que impôs um teto na cobrança de ICMS sobre combustíveis.

Oficialmente, a tributação sobre a exportação de petróleo foi gestada para ser temporária, tanto que o governo não conta com a aprovação da Medida Provisória pelo Congresso. Pode até ser verdade. Mas o simples fato de que o imposto foi considerado uma alternativa viável por um governo que iniciou o mandato há dois meses abre um precedente muito perigoso para todos os setores que sustentam a pauta brasileira de exportações, como o agronegócio e a indústria de mineração.

O fato de que o Brasil se tornou um grande exportador de petróleo não é acidente do destino, mas resultado direto de investimentos, eficiência e baixo custo de produção. O mesmo raciocínio que vale para a produção de commodities agrícolas e de minério de ferro. Por isso, taxar as exportações, mais do que algo anacrônico, é também uma medida medíocre, sobretudo para fins fiscais. O saldo comercial positivo, aliado ao Investimento Estrangeiro Direto (IED), é o que compensa o déficit no balanço de pagamentos e tem sido fundamental para manter o câmbio relativamente estável. Com o Imposto de Exportação, o governo contribuiu para minar os dois de uma só vez.

Impressiona, portanto, que o governo Lula tenha levado a termo uma proposta como esta em um momento de tantas incertezas na economia. Para além de penalizar um dos setores que mais contribuem para a atração de investimentos, a geração de empregos e o crescimento, o governo subestima o impacto que esse anúncio pode ter sobre as expectativas dos agentes econômicos dos mais diversos setores. Ainda há tempo para assumir o erro e reverter a medida.

Uma lição ao ‘juiz-celebridade’

O Estado de S. Paulo.

Caso de Bretas é outro triste capítulo da Lava Jato, causado não por seus desafetos, mas por seus supostos heróis

No dia 28 de fevereiro, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) afastou o juiz Marcelo Bretas da 7.ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, responsável pelos processos derivados da Operação Lava Jato em tramitação no Rio de Janeiro. Com validade até o final das investigações instauradas sobre a conduta do juiz, o afastamento de Marcelo Bretas é mais um capítulo melancólico da história da Lava Jato, causado não por seus desafetos, que são muitos, mas justamente por aqueles que eram apontados como os grandes heróis nacionais do combate à corrupção.

Em 2020, o juiz da Lava Jato no Rio de Janeiro foi punido administrativamente pelo Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2), por ter participado de eventos de natureza política ao lado do então presidente da República, Jair Bolsonaro, e do então prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella. Na ocasião, foi-lhe aplicada a pena de censura. Agora, a medida é mais dura. Afastamento de magistrado não é algo corriqueiro, o que revela a gravidade dos fatos apurados.

As investigações sobre a conduta de Marcelo Bretas foram instauradas a partir de três reclamações disciplinares. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) acusa-o, entre outras irregularidades, de pressionar investigados e de combinar estratégias com o Ministério Público em acordos de colaboração premiada. O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, acusa o juiz de usar o cargo para tentar prejudicá-lo na campanha eleitoral de 2018. A terceira reclamação foi feita pelo corregedor do CNJ, Luis Felipe Salomão, após uma fiscalização extraordinária indicar “deficiências graves” dos serviços judiciais e auxiliares na 7.ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro.

A conduta de Marcelo Bretas tem traços um tanto peculiares, muito distantes da imparcialidade e da sobriedade necessárias a um magistrado. O juiz da Lava Jato no Rio de Janeiro tornou-se conhecido não apenas por fazer interpretações extravagantes da lei processual penal, como o uso recorrente e expansivo da prisão preventiva. Era uma celebridade no mundo das redes sociais, comentando assuntos do dia a dia e também de caráter político-partidário, o que é proibido aos integrantes da magistratura. Por exemplo, o juiz Bretas parabenizou Flávio Bolsonaro, que é alvo de investigação no Ministério Público do Rio de Janeiro, por sua eleição ao Senado. Também defendeu medidas e integrantes do governo Jair Bolsonaro.

Cabe agora ao CNJ realizar uma séria e diligente investigação. De toda forma, desde já, o caso Bretas confirma que o País não precisa de juízes heróis nem muito menos de juízes justiceiros. Não é assim que se faz avançar a causa da Justiça. A demanda é por magistrados que queiram apenas aplicar a lei, talvez com resultados menos espetaculares, mas cujo trabalho seja apto a gerar frutos consistentes, que perduram ao longo do tempo.

Há separação de Poderes. A missão do Judiciário não é fazer política, não é salvar a Pátria, não é solucionar os problemas nacionais. É aplicar humilde e silenciosamente a lei.

PIB do 4º trimestre indica baixo crescimento à frente

Valor Econômico

Um plano crível e bem formulado pode abrir a perspectiva de queda da inflação

O Produto Interno Bruto de 2022 finalmente alcançou o pico anterior, do terceiro trimestre de quase dez anos atrás (2013), ao crescer 2,9%, mas a performance atrasou demais e deverá ceder lugar à expansão medíocre usual. A economia reduziu seu ritmo trimestre a trimestre, até se contrair 0,2% nos últimos quatro meses do ano passado. Esse efeito era esperado para antes, diante da carga pesada dos juros, mas foi postergado pelo festival de estímulos do governo Bolsonaro em ano eleitoral.

As consequências dos incentivos fiscais e parafiscais foram importantes, mas como se previa, efêmeras. Em 2022, o consumo das famílias, que compõem 68% do PIB medido pela demanda, cresceu 4,3% - bem mais do que os 2,9% de 2021, quando o PIB crescera 5% -, e os serviços, um dos principais destinatários dos recursos, 4,2%. A melhoria no mercado do trabalho, seguida da ampliação da massa salarial e recuperação real dos salários com a queda da inflação, garantiram o bom resultado do PIB.

No quarto trimestre, porém, ficou clara a reversão de tendências. No ano como um todo, enquanto o consumo das famílias cresceu bem, os investimentos tiveram resultados ruins - a Formação Bruta de Capital Fixo caiu 1,1% na comparação do quarto trimestre contra o terceiro e o consumo das famílias subiu apenas 0,3%. Pelo lado da produção, a indústria teve retração, serviços diminuíram ritmo de expansão para 0,2% e a agropecuária cresceu 0,3%.

O aperto monetário começou a contrair a economia no último trimestre de 2022, atingindo primeiro os investimentos, muito mais sensíveis à taxa de juros, e depois o consumo e o setor de serviços. Na FBCF, houve alento do desempenho da construção, de 6,1%, e desalento no de máquinas e equipamentos, que declinou 7,3%.

Se os sinais emitidos pela desaceleração no desempenho da economia no último trimestre de 2022 se materializarem, o PIB crescerá pouco agora, mais em linha com a previsão do Focus, em torno de 0,8%. Há poucos fatores de impulso às atividades em ação e vários que tendem a jogá-las para baixo. O carrego estatístico é pequeno, de 0,2%, ao contrário da herança do PIB de 2021. Pelo menos no primeiro semestre, não há sinais de que o Banco Central vá baixar a guarda e reduzir os juros. A oferta de crédito, que foi forte para as famílias em 2022, deve se retrair bastante, não só pela alta inadimplência e comprometimento da renda das famílias, como pelos tombos de grandes empresas, como a Americanas, no começo do ano.

 

O mercado de trabalho, que exibiu um desemprego baixo no trimestre encerrado em dezembro, de 7,9%, já está gerando menos empregos, o que em breve deve se refletir nos salários, que vinham em tardia recuperação. A inflação, que deu algum alívio aos rendimentos, deve parar de cair. A expectativa é de que se mantenha na casa dos 5,8%.

Tudo pode mudar, no entanto. O governo recebeu autorização para gastar 2% do PIB extras. No Bolsa Família, que abrange 21 milhões de lares, a média de pagamentos deve subir para pouco mais de R$ 700, diante de R$ 204 vigentes até agosto de 2022, quando começou a ser pago o Auxílio Brasil. Novo aumento real do salário mínimo será concedido em maio e, não só na União, mas nos Estados, os servidores públicos (mais de 10 milhões de pessoas) terão reajustes, o que em geral não ocorria há dois anos.

O que pode ser determinante é a disposição do governo, até agora contida, de fazer gastos contracíclicos. Ao comentar o PIB ontem, o presidente Lula se queixou da paradeira da economia. “Se o governo federal não investir dinheiro como indutor do crescimento, nada vai acontecer”, disse.

As tensões do baixo crescimento, se espalharão em várias direções. O ministro Fernando Haddad disse que o esquema de reoneração dos combustível tem efeitos fiscais positivos suficientes para induzir o BC a baixar os juros. A ministra do Planejamento, Simone Tebet, afirmou esperar da próxima reunião do Copom “um gesto positivo a favor do Brasil”.

As divergências internas desaguarão no regime fiscal elaborado na Fazenda. Pelos sinais de fumaça do Planalto e dos líderes do PT, ele não será austero o suficiente para permitir a queda do déficit fiscal e da inflação. É nele, porém, que reside a grande possibilidade de virar o jogo. Um plano crível e bem formulado pode mudar radicalmente o humor dos agentes econômicos e abrir a perspectiva de queda da inflação, maior crescimento e equilíbrio fiscal - como ocorreu no primeiro mandato de Lula.

 

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