No segundo tema em votação, Banco Rural é acusado de gestão fraudulenta
STF fecha primeira fase do julgamento condenando todos os réus denunciados pelo procurador; João Paulo, culpado também por lavagem, perde candidatura
Ao iniciar a 2ª etapa do julgamento, o relator Joaquim Barbosa disse que são irregulares os empréstimos dados pelo Banco Rural ao PT e a Marcos Valério. O banco manipulou balanços, omitiu o nível de risco das operações e não exigiu garantias: "Os empréstimos não deveriam ser pagos, pois materialmente não existiam." Com o voto de Ayres Britto, o petista João Paulo foi condenado também por lavagem de dinheiro e renunciou à candidatura em Osasco.
"Empréstimos não existiam"
Relator diz que, para beneficiar PT, Rural manipulou balanços e omitiu risco de operações
Thiago Herdy, André de Souza
BRASÍLIA O relator do processo do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, endossou a tese do Ministério Público e considerou irregulares os empréstimos concedidos pelo Banco Rural ao PT e a agências de publicidade de Marcos Valério e seus ex-sócios, a SMP&B e a Graffiti. Na segunda etapa do julgamento, iniciada ontem - que trata dos crimes de gestão fraudulenta de instituição financeira por parte de quatro ex-diretores do Rural - Barbosa considerou que o banco manipulou balanços contábeis, omitiu o verdadeiro nível de risco das operações e renovou empréstimos sem ter garantias reais de pagamento. Para Barbosa, os financiamentos foram feitos para não serem pagos
A conclusão do voto, porém, ficou para segunda-feira. Na lista dos réus desse item estão os ex-dirigentes do Rural Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Ayanna Tenório e Vinicius Samarane.
- À luz de todo acervo probatório, verifica-se que, como bem ressalta a acusação, "o Banco Rural somente decidiu cobrar os valores objeto dos empréstimos após a divulgação do escândalo pela imprensa. E assim agiu porque os empréstimos, na verdade, não deveriam ser pagos, pois materialmente não existiam" - disse Barbosa, confirmando trecho das alegações finais apresentadas pelo Ministério Público.
Delúbio e Genoino avalizaram empréstimo
Em seu voto, Barbosa considerou que o Rural não observou as exigências normativas relativas aos cadastros de clientes, tampouco checou as informações contábeis apresentadas pelo PT e pelas empresas ligadas a Valério. Para o MP, eram operações fictícias, criadas para distribuir recursos a parlamentares da base aliada do governo. Em maio de 2003, o tesoureiro do PT Delúbio Soares e o presidente do partido José Genoino avalizaram empréstimo de R$ 3 milhões.
- O crédito foi liberado sem que (o banco) tivesse sequer cadastro do partido, das pessoas físicas responsáveis e dos avalistas. Os signatários examinaram documento de análise financeira que teve como base balanços do PT de 2002 a 2004. Fica evidente que o banco não observou a deficiência financeira do PT em 2002. Quanto às renovações, o Banco Rural também continuou omisso, sem garantias reais para quaisquer operações - disse o ministro.
Barbosa também apontou irregularidades nos empréstimos para as empresas de Marcos Valério e seus sócios: R$ 19 milhões à SMP&B e R$ 10 milhões à Graffiti, no mesmo ano. No cadastro de Ramon Hollerbach, sócio de Valério, por exemplo, não constava qualquer declaração de bens ou rendimento. Dados contábeis apresentados pela agência, em setembro de 2004, apontava balancete com R$ 3,5 milhões em dívidas. No Banco Central, a dívida registrada era bem maior: R$ 33,3 milhões. Segundo Barbosa, cabia ao banco checar este dado antes de conceder empréstimos ou renová-los.
Para o ministro, há elementos suficientes para acreditar que "os cadastros existentes sequer eram atualizados, estavam instruídos com documentação falsa e, quando apareciam deficiências, eram ignoradas pelo Banco Rural". Exemplos disso seriam, por exemplo, dados do próprio Valério no banco. A ficha cadastral indicava que ele tinha rendimentos brutos superiores a R$ 403 milhões. No mesmo cadastro, constava cópia de declaração de ajuste de Imposto de Renda com rendimentos de R$ 3,8 milhões.
Em nota, banco rural nega irregularidades
Para responder a um dos principais argumentos da defesa dos réus do Rural, que pedem a absolvição dos clientes por considerar que eles não ocupavam cargos ligados à concessão de empréstimos em 2003, Barbosa atribuiu diretamente a Kátia Rabello, José Roberto Salgado e Ayanna Tenório responsabilidade pelas renovações sucessivas das operações irregulares.
- Com o objetivo de esconder a realidade das operações questionadas, o Banco Rural também omitiu registros e livros contábeis, bem como manipulou esses eventos contábeis para simulação de fatos jurídicos - disse Barbosa, citando um laudo da Polícia Federal.
Em nota, o Rural refutou ontem a afirmação de que os empréstimos às empresas de Valério foram fictícios. Segundo o texto, "os empréstimos foram periciados pela Polícia Federal, por solicitação do ministro Joaquim Barbosa, e considerados verdadeiros". Para o banco, o valor global dos empréstimos era proporcional à capacidade dos tomadores e correspondia a menos de 1% da carteira do Rural em 2003.
"Os empréstimos ao PT e a Marcos Valério não foram concedidos originalmente por nenhum dos executivos acusados", diz o texto.
FONTE: O GLOBO
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