Barbosa vê processo do mensalão como "marco para sociedade" ao
permitir que "o modo de fazer Justiça entre nos lares das pessoas"
O futuro presidente do Supremo Tribunal Federal e relator do processo do
mensalão, ministro Joaquim Barbosa, avalia o julgamento da ação como um
"marco" para a sociedade e como um possível "freio de
arrumação" para a política brasileira. Em entrevista à rádio Estadão ESPN
na manhã de ontem, o ministro classificou como um "escracho" a
intenção da defesa de parte dos réus do mensalão de recorrer das condenações às
cortes internacionais.
"(O julgamento) vai ser um marco não só para a política brasileira.
Para a política talvez signifique um freio de arrumação. Mas para a sociedade é
um episódio espetacular porque estamos assistindo à Justiça penetrando nos
lares das pessoas, o modo de fazer Justiça", afirmou o ministro.
Barbosa relativizou as críticas à condução do processo. "As provas
estão lá em abundância. Quem acompanhou esse julgamento nos seus momentos
cruciais viu a superabundância de provas, fatos escabrosos que ao longo dessas
semanas nós mostramos. O que tem havido é tentativa de politização de um
resultado negativo para essa ou aquela pessoa. E, quanto a isso, cada um tem a
liberdade de fazer o que bem entende." Após a condenação por maioria de
votos, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e o ex-presidente do PT José
Genoino afirmaram que a decisão da Corte foi política e reforçaram a tese da
defesa de que faltam provas sobre atuação de ambos no esquema.
Cortes internacionais. Sem citar nomes, o ministro voltou a criticar
declarações de alguns advogados de defesa dos réus, de que pretendem recorrer a
cortes internacionais - um dos que citaram a possibilidade foi o ex-presidente
do PL Valdemar Costa Neto. Barbosa lembrou que as decisões do Supremo são
soberanas e não subordinadas a outras instâncias. "(Esse posicionamento) é
um escracho para com as nossas instituições e mostra que essas pessoas que
estão comandando esse movimento não pensam no País. Não pensam na consolidação das
nossas instituições. Só pensam em si mesmas, em grupos e facções."
Barbosa, também relator do chamado mensalão mineiro, afirmou ainda não haver
previsão de quando a ação será julgada. O escândalo envolve um suposto esquema
de financiamento ilegal para a campanha de reeleição do então governador
Eduardo Azeredo ao governo de Minas Gerais, em 1998. Segundo ele, apesar de o
caso ser mais antigo do que o mensalão ligado ao PT, conhecido em 2005, a
denúncia só foi recebida pela Corte em 2009 - dois anos depois da ação
atualmente em julgamento.
"O mineiro só veio à tona por causa do processo que está sendo julgado.
Ele estava escondido. Não há como ter tramitação idêntica", disse. Como
Barbosa assume a presidência do Supremo em novembro, a relatoria da ação deve
ser transferida a outro ministro, de acordo com o regimento da Corte.
Barbosa ainda enalteceu o trabalho da Corte nos últimos anos. "O
tribunal está intimamente vinculado às questões apresentadas pela sociedade
brasileira", disse. "Certamente outras questões assim virão, como
casamento homoafetivo, a questão de cotas, as células-tronco, essas questões
nobres que ultimamente têm marcado a presença do Supremo no cenário político e
institucional do País. Nós vivemos em um subcontinente que não é marcado pela
excelência das instituições democráticas, e ter um tribunal com essa
visibilidade, com todo este apelo de mídia, como vem acontecendo, é muito
importante. Esse sempre foi meu ideal. Estou muito contente que isso esteja
acontecendo, ainda mais num momento em que estarei à frente do tribunal."
Fonte:
O Estado de S. Paulo
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