Raymundo Costa
BRASÍLIA - A cúpula do PMDB avaliou que pelo menos 70 dos 87 deputados federais do PT votaram na candidatura do deputado Júlio Delgado (PSB) a presidente da Câmara, traindo o acordo firmado entre as duas siglas para eleger o candidato pemedebista Henrique Eduardo Alves. Houve traição no próprio PMDB. Ainda assim Alves venceu no primeiro turno.
Delgado, cujo partido (PSB) tem uma bancada de 27 deputados federais, também teria contado com a maioria dos votos do PSD (50 deputados) de Gilberto Kassab - que jogou articulado com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos - e do PCdoB (13 deputados). Alves teve 271 votos (precisava de 257 para vencer no primeiro turno), quando esperava ter algo em torno dos 300.
Atribui-se, na cúpula pemedebista, ao senador Renan Calheiros, eleito presidente do Senado na última sexta-feira (a eleição da Câmara foi na segunda-feira), a articulação para atrair o PCdoB para a candidatura Delgado. Interessaria a Calheiros reduzir a influência do grupo do PMDB da Câmara, que se consolidou depois que ele e o ex-presidente José Sarney foram enredados em denúncias de práticas irregulares. Depois disso, os deputados ampliaram sua área de influência no Palácio do Planalto, inclusive com a indicação do vice na chapa da presidente da República.
O "Consenso do Jaburu" identificou também o dedo do deputado Sérgio Guerra, presidente do PSDB, na votação de Delgado. Guerra teria contribuído com alguns eleitores tucanos. A exemplo de Kassab, também em articulação com Eduardo Campos, que preside o PSB. Os dois são pernambucanos e amigos. Sérgio Guerra nega.
Só articulações desse porte, segundo avaliou a direção do PMDB, levariam o representante de um partido que tem apenas 27 deputados a conseguir 165 votos. Antes mesmo de o painel de votação ser aberto, um petista disse ao Valor que a hipótese de a eleição ir para o segundo turno não deveria ser descartada, pois não interessava ao PT que Henrique Alves saísse da eleição sentindo-se "muito poderoso".
O PMDB, depois de fazer suas contas e trocar informações com os deputados, chegou à conclusão que a intenção era mesmo levar a eleição para o segundo turno, não para dar um "susto" em Henrique Alves, mas para efetivamente derrotar o PMDB.
"O que houve foi uma traição em massa do PT", diz um dirigente do PMDB, que ainda não sabe avaliar a extensão das sequelas deixadas pelo episódio na relação PT-PMDB. O certo, segundo líderes partidários, é que há um sentimento entre muitos deputados de que é necessário se criar uma força concorrente ao PMDB na Câmara.
Na realidade, líderes pemedebistas acreditam que Henrique Alves só conseguiu evitar a realização de um segundo turno no domingo, quando fez um acordo com o deputado Inocêncio Oliveira (PSD), que ameaçava sair candidato a presidente. Havia dez anos que Inocêncio ocupava algum cargo na mesa da Câmara. Henrique prometeu-lhe a presidência de uma comissão especial a ser criada e o deputado pernambucano recuou da intenção de disputar a eleição.
Para o PMDB ficou evidente a intensa atuação do governador Eduardo Campos, eventual candidato a presidente, em 2014, ou até vice de Dilma, no lugar do atual vice-presidente Michel Temer, como gostaria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A sociedade PT-PMDB, que já era permeada pela desconfiança, trincou, mas ainda não está clara qual será a repercussão do incidente no futuro da relação do PMDB com o governo.
O PMDB também reagiu mal à noticia segundo a qual o ex-presidente Lula cogitava o nome do vice-presidente Michel Temer para disputar o governo de São Paulo, em 2014, em aliança com o PT. Michel falou a seus interlocutores que não é candidato ao governo do Estado. De acordo com os dirigentes da sigla, a presidente Dilma já assumiu com o vice que a chapa da reeleição será a mesma de 2010. "O PMDB é um partido com história", afirma um integrante da cúpula. "Por que iríamos nos deixar seduzir por uma candidatura ao governo de São Paulo, para nós, um Estado tão importante como os outros".
Valor Econômico
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