segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Mezzo público, mezzo privado - José Roberto de Toledo

Ao escrever seus discursos eleitorais em 2014, os candidatos devem pensar duas vezes antes de radicalizar suas propostas sobre a relação do Estado com a economia. A opinião pública tem um pé em cada canoa e pode não votar em quem der a entender que, se pudesse, afundaria uma delas seja qual for. Já falar contra a corrupção ainda pega bem. Prometer emprego público também.

Indagados sobre o que prefeririam para si, se um cargo público, um emprego fixo no setor privado ou abrir o próprio negócio, a maioria apontou para a livre-iniciativa: 37% responderam que gostariam de empreender, além dos 18% que disseram que o emprego privado era o ideal. Só 32% optaram pelo serviço público.

Mas quando a pergunta é sobre o que gostariam mais para o seu filho, a estabilidade econômica falou mais alto: 42% disseram que um emprego fixo no setor público era o que mais desejavam para os descendentes. A escolaridade dos pais não faz diferença.

Essas perguntas fazem parte do questionário do Latinobarômetro, a mais tradicional pesquisa de opinião sobre política e economia na América Latina. A parte no Brasil foi feita em junho, pelo Ibope. É reveladora do pragmatismo do eleitor brasileiro. Os resultados estão divulgados neste espaço em primeira mão.

Dois em cada três entrevistados concordaram - ao menos em parte - com a afirmação de que a economia de mercado é o único sistema através do qual "o Brasil pode chegar a ser um país desenvolvido". Apenas 18% discordaram, e 15% não responderam. Uma coisa é a teoria, outra é a prática, porém.

Quando indagados se as privatizações das empresas estatais foram benéficas para o País, 42% dos brasileiros discordaram - mesmo que parcialmente - da afirmação, contra 44% que concordaram totalmente ou em parte. É uma bola divida em qualquer região. E o motivo parece ser a insatisfação com os serviços privatizados.

Apenas 37% dos brasileiros se dizem satisfeitos ou muito satisfeitos com os serviços de água, luz e telefonia que passaram àgestão privada. Outros 41% se dizem pouco satisfeitos, e 21% afirmam estar nada satisfeitos. A insatisfação é maior nas grandes cidades, nas capitais e suas periferias.

Quando o tema é corrupção, a percepção de que o Estado é menos honesto do que ainiciativa privada não é universal. Para a maior parte, 44%, a corrupção é igual nos dois setores. Outros 9% chegam a dizer que é maior na iniciativa privada. Só 36% dizem que ela é menor no setor privado - e outros 3% afirmam que só há corrupção estatal. Não lhes perguntaram quem são os corruptores.

A percepção da corrupção é muito maior do que a sua experiência: 5% dos brasileiros afirmam que presenciaram um ato de corrupção, como o pagamento de propina a um político ou funcionário público, nos últimos 12 meses. Outros 11% dizem que não viram nada do tipo, mas têm um amigo ou parente que viu.

O surpreendente é que 80% não tenham presenciado um corrupto em ação e tampouco conheçam alguém que tenha visto a corrupção com os próprios olhos. É surpreendente porque 55% dos brasileiros acreditam que a maioria (41%) ou praticamente todos (14%) os funcionários dos governos municipais são corruptos. A proporção vai a 57% quando a pergunta se refere ao governo federal.

É muito diferente da relação entre fato e percepção na segurança pública: 39% dos entrevistados foram vítimas ou tiveram um parente assaltado ou agredido no último ano. O medo vem por experiência própria ou familiar: 85% se preocupam sempre ou quase sempre em ser vítimas de um delito violento.

Em resumo, boa parte dos brasileiros não viu nem soube em primeira mão de um ato de corrupção, mas acredita que ela é generalizada, principalmente no setor público. Mesmo assim, gostaria de ver o filho empregado pelo Estado. Vai entender.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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