- Blog do Noblat
Entre uma greve de metrô e uma manifestação contra a Copa, entre um gol de Neymar e um berro de Felipão, a presidente Dilma, depois de dizer que os turistas não levam aeroportos nem estádios para casa, assinou no meio de uma pilha de decretos um especial: o 8.243, que praticamente joga para escanteio a democracia representativa, substituindo-a por uma peculiar democracia direta feita sob medida para que todos os caminhos levem a Roma.
Entenda-se como Roma, no caso, o governo, que o PT sonha em tornar intransferível.
Por causa do ruidoso silêncio em que o governo baixou o decreto, ele demorou a ser notado, tanto pela imprensa como pelos pré -candidatos de oposição, e até mesmo pelas suas principais vítimas, os legisladores, cuja condição de representantes do povo o decreto minimiza, criando instâncias acima deles formadas por ativistas de “movimentos sociais”.
Nove partidos representados no Congresso Nacional, que têm um total de 229 deputados, pretendem derrubar o decreto pelo voto e pediram regime de urgência para tramitação. Eles precisam de 257 votos - metade mais um. Mas o presidente da Casa, Henrique Alves, do PMDB, diz que não coloca na ordem do dia “porque não quero”.
O primeiro alerta veio da parte da imprensa tradicional que ainda se preocupa com a institucionalidade da democracia.Em editorial, o Estadão alertou:
"O Decreto nº 8.243 é um conjunto de barbaridades jurídicas, ainda que possa parecer, numa leitura desatenta, uma resposta aos difusos anseios da rua. Na verdade é puro oportunismo para colocar em prática as velhas pretensões do PT a respeito do que membros desse partido entendam que seja uma democracia".
O jurista Ives Gandra foi direto:
"Quando eles falam de participação da sociedade, todos nós sabemos que essas comissões serão de grupos articulados, como os movimentos dos Sem Terra e dos Sem Teto que têm mentalidade favorável à Cuba, à Venezuela". Para Gandra, o decreto tenta "alijar o Congresso".
O governo foi oportunista e pegou carona na crise de representatividade que levou milhões às ruas na Europa, no Oriente Médio, na Ásia e na América para baixar um decreto que cria formas de participação “da sociedade civil”, mas aplicou o truque de definir “sociedade civil” como “movimentos sociais” estruturados ou não, quando até as pedras da rua sabem quem controla esses “movimentos sociais”, que formarão os conselhos que já nascerão devidamente aparelhados.
O jornalista Fernão Lara Mesquita fez em seu blog (vespeiro.com) um ponto-a-ponto mostrando as ameaças de cada artigo e parágrafo do decreto à democracia,e o escritor e professor Augusto de Franco, (http://net-hcw.ning.com ou em sua página no Facebook) criador da Escola de Redes, também está dissecando o decreto ditatorial do ponto de vista do novo ambiente de interação democrática criada pelas redes sociais.
O decreto 8.243 tenta passar gato por lebre.
Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez e "Armênio Guedes, Sereno Guerreito da Liberdade"(editora Barcarolla).
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