• Ministérios do Trabalho e Fazenda divergem sobre constitucionalidade de mudança no PIS
Geralda Doca, Cristiane Bonfanti e Martha Beck – O Globo
-BRASÍLIA- Um dia após o anúncio das restrições ao acesso de benefícios como o seguro-desemprego e abono salarial, o Ministério do Trabalho enviou uma nota ao Palácio do Planalto, na qual alerta que a mudança no valor do abono (PIS), que passará a ser proporcional aos meses trabalhados, é inconstitucional. Pela Constituição Federal, os empregados que fazem jus ao benefício têm direito a receber um salário mínimo. Essa avaliação já tinha sido apresentada pelos técnicos da pasta nas discussões sobre o tema, mas foram ignoradas. Prevaleceu a posição da equipe econômica. Indagado sobre a questão, o diretor de programas da Secretaria-Executiva do Ministério da Fazenda, Manoel Pires, que ontem detalhou as medidas, respondeu que o entendimento do departamento jurídico da pasta é que não há inconstitucionalidade. A alteração no PIS entrará em vigor em agosto de 2015, enquanto outras medidas, como a mudança nas regras de concessão do seguro-desemprego, passam a valer em 60 dias.
— Segundo a nossa área jurídica, não (é inconstitucional) - disse o diretor.
Ao lado de representantes dos ministérios do Planejamento, Trabalho e Previdência, Pires detalhou as duas medidas provisórias publicadas em edição extra do Diário Oficial da União — uma na área trabalhista e outra na previdenciária. Ele reiterou que o pacote vai gerar uma economia de R$ 18 bilhões em 2015, mas não soube informar o impacto isolado de cada medida. No caso do seguro-desemprego, o governo elevou de seis para 18 meses o período exigido de carteira assinada e ajustou o número de parcelas, que varia de três a cinco. Na avaliação da Fazenda, a curto prazo, essa é a medida de maior impacto na redução de despesas.
No que diz respeito às pensões, a proposta do governo prevê o fim do benefício vitalício para cônjuges jovens. Foi estipulada uma tabela que assegura o benefício pela vida inteira para quem fica viúvo com 44 anos ou mais e que tenha expectativa de sobrevida de até 35 anos. Abaixo dessa idade, o beneficio será temporário, conforme a expectativa de vida. Entre 39 e 43 anos, por exemplo, o prazo é de 15 anos; entre 22 e 32 anos, de seis; e, abaixo de 21 anos, de três. O cálculo do benefício também muda. Por exemplo, uma viúva sem filhos passará a receber 60% do valor do beneficio, não mais 100%. Cada filho terá direito a uma cota de 10%, que termina aos 21 anos de idade.
Miguel Torres, presidente da Força Sindical, disse que a entidade estuda entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF):
— A Força Sindical é contra as medidas anunciadas. Vamos mobilizar o movimento sindical, até porque todo mundo foi pego de surpresa. Estamos estudando a possibilidade de entrar com a Adin e também vamos trabalhar dentro do Congresso.
Jogo de empurra para fazer o anúncio
O anúncio das primeiras medidas de controle de gastos para garantir o ajuste fiscal, a partir de 2015, virou um verdadeiro jogo de empurra entre a atual e a futura equipe econômica. Extremamente insatisfeitos com a forma como vêm sendo tratados pelo Palácio do Planalto, os técnicos da Fazenda não quiseram participar da divulgação das medidas. Embora tenha trabalhado na elaboração das mudanças, a equipe do ministro Guido Mantega considera que foi "atropelada" pela futura equipe, que vem sendo tratada como "salvadora da pátria".
Já a futura equipe, capitaneada pelos futuros ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, também não queria anunciar as medidas, por dois motivos: são fruto do trabalho da equipe anterior e são impopulares. Eles avaliaram que não deveriam ficam na conta de quem está chegando ao governo.
Assim, sobrou para o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, lançar as medidas no Planalto, com outros ministros como coadjuvantes. Foram convocados o secretário-executivo da Fazenda, Paulo Caffarelli, encarregado de fazer a transição entre as novas equipes, e Nelson Barbosa, que pouco falou.
— Havia uma urgência em anunciar as medidas por causa da anualidade. O problema é que Mantega já está fora. Ele já não está nem em Brasília. Só assina as medidas. O pessoal da Fazenda também está aborrecido e não quis falar das medidas. A futura equipe acha que esse trabalho cabe à atual, que afinal foi quem elaborou as ações. Virou uma confusão de hora de anunciar — disse um interlocutor do Planalto.
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