• Levy concorda com a tese de que a elevação do salário real muito acima do PIB, ou seja, maior do que o aumento de produtividade da economia, acaba por ser um dos fatores de inflação
- Correio Braziliense
A presidente Dilma Rousseff, quando nem sonhava em morar no Palácio da Alvorada, abriu uma lojinha de utilidades domésticas vendidas a R$ 1,99, mas o negócio não deu certo. Pois bem, parece que a vingança veio agora, no ajuste fiscal, que começou a ser anunciado na segunda-feira com a revisão das pensões e do seguro desemprego. Contra todas as expectativas, na antevéspera do ano-novo, Dilma resolveu tungar o salário mínimo, que deveria ser de R$ 790 e foi reduzido para R$ 788, em decreto publicado ontem.
Como diria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, só quem vive do mínimo sabe o que uma dona de casa pode fazer com R$ 2 num fim de feira ou na lojinha de utilidades domésticas. Parece pouco, mas essa diferença vai impactar a economia em R$ 752,8 milhões em 2015. O Congresso Nacional estimava o valor do salário mínimo em R$ 790 para fixação do Orçamento de 2015, ainda não aprovado.
O piso é reajustado conforme o crescimento da economia de dois anos atrás, mais a variação da inflação deste ano, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que ainda não está apurado. O governo usou uma estimativa. Ironicamente, a decisão simboliza a mudança de rumos na economia, com a entrada em cena do novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
A política anterior era focada na expansão dos gastos públicos e na transferência de renda para as camadas mais pobres da população, via elevação do valor real do salário mínimo e programas sociais, como o Bolsa Família. Levy concorda com a tese de que a elevação do salário real muito acima do PIB, ou seja, maior do que o aumento de produtividade da economia, acaba por ser um dos fatores de inflação. Essa é a nova linha da política econômica.
Os jabutis
Mas vamos esquecer a lojinha de R$ 1,99 e tratar de outro assunto do momento: a montagem da equipe de governo. A nova fornada de ministros reforça a tese de que a presidente da República está mais preocupada com a blindagem do governo no Congresso do que com a implementação de políticas públicas. Segundo a velha tese de Vitorino Freire, um pernambucano que fez política no Maranhão, “jabuti não sobe em árvore”. Ele dizia que, ao se avistar um quelônio num galho, é melhor não mexer, porque pode ter sido mão de gente. O que não falta são jabutis no novo ministério.
Estão muito bem representados na Esplanada, por seus apadrinhados, o vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB); o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL); o senador Jader Barbalho (PMDB-PA), uma espécie de vice-rei do Norte; o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI); o ex-prefeito de São Paulo Paulo Maluf (PP), milagrosamente salvo de cassação numa controvertida decisão do Tribunal Superior Eleitoral; o líder da Igreja Universal do Reino de Deus, Bispo Edir Macedo; e o ex-deputado Valdemar Costa Neto, que, mesmo preso, continua dando as cartas no PR. Só o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) não foi contemplado na reforma, mesmo assim — sem que Dilma saiba —, deve ter aliados bem instalados em alguns ministérios.
Dilma fez, ainda, uma manobra de flanco para atazanar a oposição, fortalecendo aliados que foram derrotados nos estados com uma posição robusta na equipe de governo. Também está criando um polo de poder no PT, o que é uma espécie de ajuste de contas com a turma do “Volta, Lula”. Os petistas gaúchos nunca mandaram tanto no Palácio do Planalto. Entretanto, a 24 horas da posse, claudica para fechar a composição do ministério. Ontem, anunciou a volta de Juca Ferreira para a pasta da Cultura, frustrando os paulistas, que defendiam o nome do escritor Fernando Morais contra a volta do agitador cultural baiano. Pode ter sido um gesto de prudência, pois ele desestabilizou Ana de Hollanda e trabalhou contra a senadora Marta Suplicy (PT-SP), que ocuparam a pasta no governo Dilma. Faltam ainda 14 ministros.
Ano velho
Os presos da Operação Lava-Jato receberam ontem a última visita do ano de familiares na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. Seria hoje, mas foi antecipada. Os diretores de algumas das maiores empreiteiras do país, como a OAS, a Camargo Corrêa e a Mendes Júnior, foram impedidos de receber comidas especiais ou bebidas alcoólicas. O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Francisco Falcão, negou ontem pedido de liberdade do lobista Fernando Antonio Falcão Soares, conhecido como Fernando Baiano, suposto operador do PMDB no esquema de corrupção na Petrobras.
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