No amplo repertório de problemas políticos que terá de enfrentar a curto e a longo prazos, dois certamente incomodam de modo especial o governo petista: a candidatura do incômodo aliado peemedebista Eduardo Cunha à presidência da Câmara dos Deputados e a perspectiva de enfrentar no Senado, nos próximos quatro anos, uma oposição mais aguerrida e competente do que nunca sob a liderança de Aécio Neves, cacifado pelo bom desempenho nas urnas de outubro.
No dia 8 vazou na imprensa depoimento prestado na Operação Lava Jato, em novembro, pelo policial federal Jayme Alves de Oliveira Filho, o Careca, acusado de integrar o esquema do doleiro Alberto Youssef. O policial revelou ter sido o portador de dinheiro entregue a Eduardo Cunha e a Antonio Anastasia, do PSDB, senador por Minas Gerais, ex-governador daquele Estado e estreitamente ligado a Aécio Neves.
Na segunda-feira, o advogado de Youssef, Antonio Figueiredo Basto, contestou o depoimento do policial, negando que seu cliente tenha ordenado a entrega de dinheiro aos dois políticos. E referiu-se especialmente ao caso mineiro: "Meu cliente deu dinheiro a ele (o policial) para entregar em Minas Gerais. Mas em momento algum meu cliente soube ou tinha relacionamento com o Anastasia".
A preocupação do advogado de negar o envolvimento de Youssef com Cunha e Anastasia tem uma explicação lógica. O doleiro é beneficiário de um acordo de delação premiada já homologado no STF pelo ministro Teori Zavascki, que supervisiona o desenvolvimento da Lava Jato no que diz respeito a investigados que dispõem de foro privilegiado. Esse acordo só é homologado quando o beneficiário é capaz de comprovar os fatos que delata ou fornecer indícios sólidos para seu esclarecimento. Uma informação falsa ou não comprovada pela qual Youssef venha a ser de alguma maneira responsabilizado pode comprometer a validade de sua delação premiada.
As investigações da Polícia Federal confirmaram que Jayme Careca atuava como intermediário de Alberto Youssef na distribuição de dinheiro, tendo feito 31 entregas no valor total de quase R$ 17 milhões, entre 2011 e 2012. Durante o interrogatório a que foi submetido em novembro, teria revelado, sem fornecer maiores detalhes, que duas dessas entregas teriam sido feitas a Cunha e a Anastasia. Ambos, como era de esperar, repeliram veementemente as acusações. Anastasia chegou a requerer uma acareação com seu acusador e seu advogado solicitou ao STF acesso ao depoimento do policial. Eduardo Cunha atribuiu o episódio a "interesses políticos".
A Operação Lava Jato investiga um amplo esquema de corrupção com foco na maior empresa brasileira, a estatal Petrobrás, e, embora o envolvimento de figurões da política só deva vir oficialmente a público mais à frente, é mais do que evidente que por detrás da farra da propina predominam interesses de partidos políticos. É claro, portanto, que o vazamento de informações sobre as investigações, que correm sob segredo de Justiça, atendem a interesses políticos. Os jornalistas só têm acesso a essas informações quando alguém, por qualquer motivo, tem interesse em revelá-las sub-repticiamente. E quando as recebem, tomadas as devidas precauções, têm o dever de divulgá-las.
E assim permanecem no ar, como neste caso do vazamento das acusações contra Eduardo Cunha e Antonio Anastasia, as inevitáveis suspeitas a respeito de quem possa estar por detrás delas. É uma questão que só a Justiça pode elucidar. Mas é inevitável que suspeitas se solidifiquem quando se impõem evidências a respeito de uma questão essencial: a quem aproveita a informação vazada?
Pois é exatamente para evitar que, no interesse de todos, mas principalmente do País, o gravíssimo escândalo da Petrobrás permaneça indefinidamente no cediço e nocivo campo das especulações que conviria à Polícia Federal, ao Ministério Público e ao Judiciário, sem negligenciar os ritos legais a que estão submetidos, abreviar no limite das possibilidades o curso desse episódio que cobre a Nação de vergonha.
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