- O Globo
O esgarçamento da relação do PT com o PMDB, que já ficara patente na campanha presidencial do ano passado, é promessa de crise política nos próximos anos, à medida que as forças políticas, ainda sob a tutela petista, começam a buscar seus espaços para a reorganização do poder — que por um triz não ocorreu, mas está prestes a acontecer neste que pode vir a ser o último dos governos petistas em sequência.
O desgaste partidário vem ficando evidente nas sucessivas crises políticas em que o PT se vê envolvido desde 2005, e a permanência no poder só foi possível na eleição de 2014 pelo uso abusivo dos instrumentos que todo governo tem, mas deveria se abster de usar para não conspurcar sua vitória. O que já parecia a todos um escândalo de alta octanagem durante a campanha demonstrou ser mais que isso, pois o petrolão está se revelando um desdobramento do mensalão, uma confirmação de que a base aliada governista vem sendo montada desde o início do primeiro governo de Lula na base da compra pura e simples de apoio político, com o Estado aparelhado servindo de provedor para fins de manutenção de poder .
Mas o que parecia uma solução fácil para manter sob suas asas a maioria do Congresso mostra-se, a cada ano, que é insuficiente, pois os partidos aliados têm suas próprias ambições e já não se sujeitam mais às imposições petistas. O principal partido da base aliada, o PMDB, descobriu que a cada dia que passa perde poder de fato , embora na aparência esteja mais forte , com seis ministérios . Que, somados, não dão o Ministério das Cidades, lamentam- se. O fato é que o Palácio do Planalto armou um esquema político para dar mais força a partidos aliados antes periféricos, como o PSD de Gilberto Kassab, o PROS de Cid Gomes, o PP e o PTB. Todos eles receberam ministérios importantes e com verbas, enquanto o PMDB ficou com quatro com status de ministério, mas verbas de secretaria — Pesca, Portos, Aviação Civil e Turismo —, e dois ministérios importantes, escolhidos pela própria presidente Dilma: Kátia Abreu, na Agricultura, e Eduardo Braga, no de Minas e Energia.
E, para dar mais espaço para os partidos aliados, também o PT foi sacrificado na partilha dos ministérios, o que faz com que o partido governista dispute o segundo escalão com o PMDB e busque mais espaço no Congresso, tentando impedir que o PMDB domine as duas Casas. OPMDB do Senado, leia-se senador Renan Calheiros, assumiu como seus ministérios de escolha pessoal de Dilma num gesto de boa vontade, mas já anunciou que não dará apoio irrestrito ao governo, negociará caso a caso. Calheiros, sob risco de ter seu nome na lista oficial dos envolvidos no petrolão (extraoficialmente, ele já aparece), sente movimentos internos ameaçando seu posto, com o incentivo do PSDB, mas também teme que o PT tente fragilizá-lo.
E, na Câmara, o favorito Eduardo Cunha sentiu até onde pode ir a disputa pela presidência da Casa, ao ver seu nome envolvido em uma denúncia desmentida depois pelo advogado do próprio doleiro Alberto Youssef, denúncia essa que Cunha tratou como "alopragem" — numa referência a membros do primeiro escalão do Palácio do Planalto, como o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, homem forte do governo Dilma que teve um assessor entre os envolvidos no escândalo que o próprio Lula, em 2006, classificou de "aloprados".
Com as dificuldades econômicas que tem pela frente, e a fragilidade política de sua base aliada — corroída pela frustração com a distribuição de cargos e insuflada pela perspectiva de perda de expectativa de poder à medida que a crise avança —, os próximos anos serão difíceis para a presidente Dilma, que parece não ter mudado nada em seus fundamentos pessoais. Não ir a Paris para mostrar sua rejeição ao terrorismo muçulmano — nem mandar um representante de peso — e deixar de ir ao Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, para prestigiar Evo Morales na Bolívia mostram bem para onde aponta a bússola política brasileira sob Dilma.
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