• PT não terá trabalhadores em sua bancada federal
- Valor Econômico
O segundo mandato de Dilma Rousseff começou marcado pela inflexão na política econômica, coroada pelo simbolismo do primeiro ministro da Fazenda não petista em 12 anos. Mas há outro dado, despercebido nos resultados da eleição de outubro, que reflete a transformação progressiva do PT. Pela primeira vez, o Partido dos Trabalhadores não terá trabalhadores em sua bancada de deputados federais, que toma posse em fevereiro.
O fato inédito é um dos achados de um levantamento feito pelo cientista político da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Luiz Domingos Costa. No estudo, trabalhadores são considerados os candidatos que declararam ao TSE exercer 111 ocupações: de motoristas a carpinteiros, de petroleiros a auxiliares de escritório. De torneiro mecânico - origem do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - a bancário - como o atual ministro das Comunicações Ricardo Berzoini. Foram analisadas as profissões dos 23.220 candidatos que concorreram nas últimas cinco eleições à Câmara dos Deputados.
A principal conclusão, afirma Costa, é que o PT "abandonou", "largou a mão" de recrutar trabalhadores para suas fileiras. É um processo de aburguesamento de seus filiados, semelhante ao descrito pelo sociólogo Robert Michels, há cem anos, na análise do SPD alemão, e expresso em sua "lei de ferro da oligarquia".
E que inclui casos como o de Vicentinho, que se reelegeu, mas pela primeira vez se declarou como político, e não metalúrgico.
Em 1998, entre os candidatos petistas a deputado federal, 21% eram trabalhadores, índice que caiu a menos da metade, 9,8%, na disputa do ano passado. No mesmo período, a presença de trabalhadores na eleição à Câmara teve um crescimento moderado. Passou de 10,6% do total de concorrentes para 13,1%.
Para onde, então, foram os trabalhadores? Espalharam-se para a miríade de pequenas legendas que nos últimos anos levaram o Brasil a bater o recorde mundial de fragmentação partidária.
"A queda de candidatos trabalhadores no PT é muito alta, principalmente quando levamos em consideração que este é o período em que o partido cresce. O PT, quando se profissionaliza, expurga os trabalhadores", diz Luiz Costa.
Uma vez no poder, acrescenta o pesquisador, o partido passou a confiar mais em práticas eleitorais tradicionais. Por exemplo, utilizar intermediários políticos, como prefeitos e vereadores, para alcançar o eleitor. Ou confiar no poder das emendas parlamentares individuais. Deixou de botar a mão na massa e fazer o trabalho de "formiguinha", de contato direto com as bases eleitorais.
Com a retirada, os demais partidos ocuparam o espaço - embora ainda não consigam eleger trabalhadores com a mesma eficiência que o PT fazia. Apesar de uma leve recuperação desde 2006 (de 1% para 1,9%), a proporção de eleitos ainda é menor do que em 1998 (3,1%).
A mudança, porém, está em curso, e o que se vê hoje seria apenas a ponta de um iceberg. Ou de uma arena em que o PT vem "apanhando" nas periferias das regiões metropolitanas, afirma o pesquisador.
O recrutamento dos trabalhadores, antes conduzido tipicamente pelos sindicatos, deu lugar à mobilização essencialmente por meio de três canais: pelas igrejas, pelas rádios e pelas brechas aproveitadas por candidatos que "surfam" nas deficiências dos serviços públicos e constroem carreiras políticas movidas a assistencialismo.
Luiz Costa cita o caso do vereador mais votado de Curitiba, em 2012, Cristiano dos Santos (PV). O motorista conseguiu seu próprio mandato depois de trabalhar para um vereador, que tinha contatos privilegiados e oferecia atendimento médico para seus eleitores. "Ele carregava gente em sua Belina. São esses os candidatos do povão. Escoram-se num deputado, num vereador, que depois os mandam embora porque montam sua própria rede", afirma Costa.
Os métodos e a competitividade, compara o pesquisador, diferem dos utilizados pelos petistas. "No PT não tem essa. Só se é candidato depois de ter sido secretário da juventude, vereador etc. É uma escadinha, que não tem nos outros partidos", diz.
Uma das consequências é que os trabalhadores migraram para outras legendas, pequenas e mais conservadoras, favorecendo o recente fenômeno da popularização da direita - também apontado por Costa e seu colega Adriano Codato, também da UFPR.
Em 2014, "nanicos" como PHS (4,8%), PEN (4,5%) e PTdoB (4%) lançaram mais trabalhadores do que o grande PMDB (3,8%). O PT, apesar da queda, ainda é o quarto (4,9%), porém bem atrás do líder PSOL (11,7%) - o que indica que seu nome de batismo pode perder sentido, ou ser ameaçado, à direita e à esquerda.
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