- Folha de S. Paulo
Para os petistas, a gravação estrelada por Romero Jucá revela que o impeachment de Dilma Rousseff não passou de um golpe de Estado com o objetivo de pôr um fim à Operação Lava Jato. O propósito escuso se somou à fraude para derrubar um governo popular e salvar os verdadeiros bandidos da cadeia, segue o raciocínio.
Obviamente, numa democracia, cada um é livre para compreender o mundo como preferir. Há quem acredite que a mulher foi criada a partir da costela de um macho e que a Lua é feita de queijo. Não se pode proibir ninguém de pensar assim nem de ensinar essas ideias a quem queira ouvi-las. Só o que se pode fazer é tentar mostrar que as narrativas mais fantasiosas não se ajustam bem ao que normalmente aceitamos como fatos.
Minha interpretação do "affaire" Jucá é um pouco diferente. Não é preciso ser capaz de ler mentes para saber que políticos, em especial os mencionados em delações premiadas, não estão muito felizes com as investigações e, se pudessem, as sobrestariam. Isso vale para Jucá e boa parte do governo Temer, é claro, mas também para petistas, que em diversas ocasiões não apenas imprecaram contra a Lava Jato, mas trabalharam para atravancá-la. O que nunca fez sentido foi acreditar que a maioria dos parlamentares tirou Dilma pensando em promover a ética.
Avançando um pouco mais, acho que a queda do ministro não só não contribui para sustentar a versão de que o impeachment foi golpe como esvazia um dos pontos-chave da narrativa petista, que é o de que o partido seria vítima de um sistema parcial, que centra seu fogo sobre membros da legenda, deixando políticos de outros grupos em paz. O fato de Jucá ter sido apeado seguindo um roteiro de gravações vazadas muito parecido com o que abateu petistas sugere que a Lava Jato não se pauta tanto por partidos, mas mira em quem está no poder. Os próximos capítulos deverão corroborar essa tese.
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