- O Estado de S. Paulo
Para Doria ser viável em 2018, sua candidatura tem que parecer um clamor popular, não um desejo seu; fazer-se de difícil é parte fundamental dessa estratégia
Quanto mais João Agripino Doria Júnior afirma, menos gente acredita. "Não sou candidato a nada", repetiu semana passada, do alto de uma cadeira, dirigindo-se a poucas centenas de vizinhos seus nos Jardins. "Meu candidato à Presidência é Geraldo Alckmin". Tudo bem que o governador estava ali, a seu lado, e os convivas pareciam querer puxar um "Doria presidente". Mas não foi só para evitar o constrangimento. Timing é tudo, Doria sabe.
O prefeito paulistano é recém-embarcado no trem eleitoral e não deve passar a impressão de que já quer sentar na janelinha. Na fila tucana, está atrás do padrinho Alckmin, de Aécio Neves e até do sempre presidenciável José Serra. Os três dedicaram muito mais anos ao PSDB, venceram mais eleições e controlam as engrenagens da máquina partidária. Se quiser pular para a janela, Doria precisa do aval de um ou dois deles, ao menos.
Não tem, ainda. "Aprendi com meu pai a ser leal", disse aos festeiros, mirando o governador. No começo de 1989, Doria foi escalado para a equipe que escreveu o programa de governo do primeiro candidato a presidente pelo PSDB, Mario Covas. Era reciprocidade. Ele devia a Covas sua entrada na política - ou na carreira de gestor, como prefere. Presidiu a Paulistur e organizou o carnaval da cidade por ato do presidenciável quando este ainda era prefeito nomeado de São Paulo, alguns anos antes.
Mais à frente naquele mesmo 1989, Doria e seu pai endereçaram carta a Covas dizendo tchau ao PSDB. Ainda antes do primeiro turno, colloriram. Não adiantou Covas, FHC e demais caciques tucanos subirem no palanque de Lula no segundo turno. Fernando Collor bateu o petista, e Doria escreveu: "O Brasil ganhou. Refiro-me à vitória da consciência livre deste país sobre o discurso canhestro e superado da extrema esquerda de Lula".
Trinta anos depois, Doria tem a chance de repetir a escrita. Desta vez, os Covas estão no seu palanque. O neto de seu primeiro padrinho político é seu vice e eventual sucessor na Prefeitura de São Paulo. Se a fila andar e o prefeito virar o que diz não ser - candidato -, a família Covas voltará à cadeira de onde começou. E Doria, ele próprio filho de deputado, poderá sentar em outra, naquela em que seus padrinhos não conseguiram.
Como, se ele não é candidato e ainda depende de outros tucanos?
Seu marketing de antipolítico - de quem não faz campanha, mas conversa; não gasta, administra - cala fundo em parte do público desencantado com os políticos tradicionais. E isso vai muito além dos salões festivos dos Jardins paulistanos.
Nenhum outro político brasileiro tem provocado mais engajamento no Facebook do que Doria. Nem Lula, o líder nas pesquisas - segundo a plataforma Social Monitor. É comum publicações suas alcançarem mais "likes", comentários e compartilhamentos do que as dos grandes veículos de comunicação. Doria tem potencial para viralizar - pelo menos no mundo virtual. No real, começa a receber uma mãozinha de empresários, como o que cedeu espaço publicitário no Brasil x Uruguai para a propaganda doriana.
A exemplo de Trump - outro milionário autofinanciado que saiu da apresentação de "O Aprendiz" para as urnas -, o antipolítico Doria está em não-campanha permanente. Seu marketing de relacionamento não acaba após a eleição: é contínuo, com vídeos diários nos quais a propaganda é apresentada como bate-papo. Ele se dirige sempre ao internauta como se falassem em particular. Robôs à parte, a maioria dos comentários que recebe é positiva.
Quem interage com seu perfil costuma receber resposta. Ficam no ar, porém, os críticos mais duros e os que cobram que ele permaneça na Prefeitura por quatro anos, como prometeu. Por isso, para Doria ser viável em 2018, sua candidatura tem que parecer um clamor popular, não um desejo seu. Fazer-se de difícil é parte fundamental dessa estratégia. Timing é tudo.
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