- O Globo
“A campanha presidencial de 2014 foi inventada primeiro por mim. Os valores (de doações) foram definidos por mim.” Marcelo Odebrecht, empresário
Governo, Congresso e partidos respiraram aliviados com o fracasso das manifestações marcadas para ontem em defesa da Lava-Jato e contra a anistia ao caixa 2, o voto em lista fechada e a anulação de delações que possam comprometer suspeitos de corrupção. Governo refém do Congresso depende dele para aprovar reformas. Congresso refém de delatores não merece a confiança de ninguém. Vida que segue.
EM DUAS OCASIÕES, na semana passada, talvez por descuido, o PT tirou a máscara ao tratar do uso de dinheiro sujo nas eleições. Relator da reforma política na Câmara, o deputado Vicente Cândido (SP) defendeu que o Congresso enfrente o desgaste de discutir anistia aos alvos da Lava-Jato como forma de “distensionar o país”. Em seu site, o partido postou um estudo que justifica o uso do caixa 2.
“O QUE É MELHOR para a sociedade neste momento? Até aprovar uma anistia, seja criminal, financeira, tudo isso é possível, não é novidade no mundo”, justificou Cândido. O estudo da seção mineira da corrente “Construindo um Novo Brasil”, majoritária dentro do PT, pretende “contribuir para o exercício reflexivo” às vésperas do 6º congresso do partido, a ser realizado até junho próximo.
“AS ELEIÇÕES BRASILEIRAS foram feitas mediante contribuições não contabilizadas. O PT, provavelmente, se utilizou das mesmas regras que os demais usavam. (...) Como o PT poderia disputar eleições sem recursos, enquanto todos os partidos neoliberais o tinham de sobra? Seria impossível disputar com chances de vitória sem os instrumentos necessários”, sustenta o estudo.
NEM CÂNDIDO NEM O ESTUDO se detiveram sobre a verdade universal de que não existe estado de direito sem Justiça e sem eleições livres e democráticas. E que eleições corrompidas por qualquer meio, sobretudo pelo abuso de poder econômico, podem ser tudo menos democráticas, livres e justas. Inexistem o bom e o mau ladrão, a não ser na cena da morte de Jesus. Mesmo assim, por excesso de bondade do Nazareno.
EM 1994, A POUCOS MESES de disputar a segunda eleição que perderia, Lula avisou de público: “Em princípio, nós não aceitaremos dinheiro da Odebrecht”. Por que a princípio? E por que da Odebrecht? Porque a construtora, na época, já estava envolvida em escândalos, e Lula queria marcar distância dela. Em 2002, Lula chamou José Dirceu e disse: “Só disputo outra vez se for para ganhar.”
GANHOU, COM A AJUDA da Odebrecht. O “partido limpo” beijou a cruz e chafurdou na lama, como os demais partidos. Se os neoliberais podiam chafurdar, por que o Partido dos Trabalhadores não? Tudo por uma boa causa, a de melhorar a vida do povo. Melhorou — e também a vida dos que se diziam destinados pela Providência a tirar o povo da miséria, do analfabetismo e das doenças.
O “ESTADO ODEBRECHT” foi uma invenção do PT para permanecer no governo por, no mínimo, 20 anos. Com Lula durante os oito primeiros (deu certo), com Dilma durante quatro (deu certo) e com Lula por mais oito. Aí, Dilma estragou tudo. Quis ficar por mais quatro. E afundou o país na maior recessão econômica de sua História, dos anos 30 do século passado para cá. O resto se sabe.
O QUE NÃO SE SABIA com detalhes se torna conhecido com as delações de executivos da Odebrecht. É de arrepiar. Fora da Lava-Jato não haverá salvação. Ou melhor: só haverá se promovermos em 2018 um expurgo político extraordinário que limpe governos, Congresso e Assembleias Legislativas.
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