Roberto Freire, ministro da Cultura: "Até hoje só existiam estudos que falavam de empresas e empregos"
Por Jacilio Saraiva | Valor Econômico
SÃO PAULO - Os setores econômicos criativos representam cerca de 2,6% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, tiveram crescimento acumulado de quase 70% nos últimos dez anos e constituem 3,5% da cesta de exportação brasileira. Os dados constam do "Atlas Econômico da Cultura Brasileira", que será apresentado hoje, e levam o ministro da Cultura, Roberto Freire, a defender que o setor cultural também pode ajudar o país a sair da crise.
No estudo, elaborado pela pasta em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a economia criativa engloba negócios que se originam de produtos ou serviços ligados à cultura, moda, design, música e artesanato, além de tecnologia e inovação.
Os dois primeiros volumes da série, inédita no país, apresentam números de setores como audiovisual, editorial, jogos digitais, museus e música, além de pesquisas de outros países, como Espanha e Holanda. O investimento no projeto é de R$ 1,3 milhão e inclui a criação de uma plataforma digital para acesso e atualização de dados on-line. "Com esse material, poderemos medir o impacto das indústrias criativas sobre o crescimento econômico", diz Freire.
A coleção completa terá seis volumes. Os próximos serão publicados em julho (empreendimentos culturais) e outubro (mercado de trabalho). Os dois últimos cadernos, sobre investimento público e comércio internacional de bens e serviços, saem em 2018, ano em que o Brasil sedia o congresso Mercado de Indústrias Culturais do Sul (Micsul), considerado o principal encontro de agentes culturais da América do Sul.
A edição do evento em 2016, na Colômbia, realizou cerca de 5 mil rodadas de negócios, entre empresários de dez países.
"É a primeira vez que uma pesquisa aborda quatro eixos que nunca foram trabalhados juntos: empreendimentos culturais, mão de obra, investimentos públicos e comércio exterior", diz Freire. "Até hoje só existiam estudos que falavam de empresas e empregos." A ideia é que o conjunto forneça subsídios para a tomada de decisão de novas iniciativas culturais.
Segundo o ministro, apenas 21 países já produziram documentos similares. Do total, 7 são da América Latina. O trabalho brasileiro começou a ser pensado em 2014 e ganhou força em novembro de 2016. "É quase senso comum achar que, em momentos de crise, a primeira coisa a ser cortada nos orçamentos são as atividades culturais", diz. "Esse Atlas prova que a cultura sempre movimentou a economia."
O levantamento também ajuda a acabar com a onda de "achismos" que ronda a área, diz o secretário de Economia da Cultura do ministério, Mansur Bassit. "Ele estrutura as cadeias do mercado e fornece números reais que podem atrair investimentos."
Os volumes do Atlas, baseados em artigos de pesquisadores e economistas, apontam números positivos em nichos como o audiovisual, mas de estagnação no mercado editorial. No primeiro, entre 2009 e 2014, os recursos públicos federais liberados aumentaram de R$ 149,1 milhões para R$ 356 milhões, crescimento de 138,7%, totalizando R$ 1,3 bilhão no período.
Os principais resultados mostram que o setor é responsável por cerca de 0,4% do valor agregado da economia, com receita estimada de R$ 42,7 bilhões.
Em 2015, foram lançados 129 filmes nacionais, um salto de 63% em comparação a 2008. No período 2008- 2015, a produção e o lançamento de títulos foram concentrados, principalmente, no Rio de Janeiro (340 filmes, ou 42,9% da produção nacional) e São Paulo (286 filmes, 36,1% do total).
Para Dora Freitas, sócia da Lumiar, empresa de consultoria de incentivos fiscais e projetos culturais, qualquer novo mapeamento do mercado é bem-vindo, principalmente se ajudar na maior pulverização de investimentos.
"Se é um Atlas, precisa dar um norte para empresários e governo, indicar para onde os aportes estão indo e quais os resultados obtidos", diz. A Lumiar tem projetos executados em cinco Estados do Norte e Nordeste e 50% do total é viabilizado com a Lei Rouanet, de incentivo à cultura.
Já no mercado editorial, entre 2013 e 2014, o crescimento real do faturamento das editoras foi negativo, segundo o Atlas, chegando a -5,1%. Entre 2005 e 2014, o faturamento das empresas engordou apenas 5,7%. Análise recente da Câmara Brasileira do Livro (CBL) e do Sindicato Nacional dos Editores (Snel) destaca que o segmento sofreu uma queda de 12,5% ao longo da última década, considerando a inflação. "Temos uma grande preocupação de enfrentar os poucos índices de leitura do Brasil", diz Freire.
Segundo o ministro, o orçamento da pasta para 2017, avaliado em R$ 700 milhões, deve receber um corte de 46% por conta das políticas de ajuste das despesas públicas. Mesmo com o contingenciamento, Freire afirma que vai relançar, ainda este ano, dois projetos criados na década de 70: o Pixinguinha, de shows musicais a preços populares, em 60 cidades; e o Mambembão, de teatro, com mais de mil apresentações, em todo o país.
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