- Valor Econômico
O governo Temer tem uma agenda dura e com ela ficará
Há coerência e relação de causa e efeito na declaração do presidente Michel Temer, feita ao Valor, de que decidiu enfrentar os problemas do país e deixar que seu curto governo se registre na história como um governo de reformas, sem paralisantes tensões com baixa popularidade. Para aprová-las, precisa do Congresso, onde construiu uma base de apoio inédita, formando um sistema de governo que denomina semiparlamentarista.
As reformas, porém, são, por natureza, impopulares, o que piora os conceitos atribuídos ao governo e ao presidente na avaliação da sociedade manifestada em pesquisas de opinião.
Teoricamente, essa combinação de fatores, ou choque, sempre foi uma explosiva combustão a minar o apoio de bases aliadas no Parlamento. Deputados e senadores não gostam de governos impopulares. Sem o seu apoio, não se aprovam as reformas.
Mas o círculo vicioso, no momento, está quebrado. E não se espera que ele gire este ano. A impopularidade deveria afastar deputados e senadores que disputarão as próximas eleições, mas numa espécie de fidelidade à ideia de governar em conjunto, e sentindo-se incluídos na transição, eles têm apoiado a essência das propostas de Temer, uma característica também única nesse governo.
A tranquilidade aparente, e não indiferença, do presidente com a impopularidade é traduzida em um comentário, dele próprio, segundo o qual "medidas populistas são maculadas pela irresponsabilidade", enquanto medidas populares, as preferidas, "demandam o reconhecimento posterior". "É um governo das reformas, não vou desfrutar nada, é para quem virá depois".
As reformas são o conteúdo do seu mandato e, este ano, o Congresso governa com ele. Claro que a base vai oscilar, a depender da reforma em questão, criar tensões em questões mais incompreensíveis para o eleitorado, como a reforma da Previdência. Mas o projeto é comum, a impopularidade não é fator de ruptura agora. Em 2018, será outra a história. O jogo passará a ser comandado pela eleição, governo e base entrarão em diferente modo de operação e se o governo não tiver melhorado sua popularidade, verá crescer a oposição no Congresso.
O presidente não perde o sono, também, à procura de iniciativas que elevem a sua popularidade a qualquer preço, exatamente porque tem foco nas reformas e elas são mesmo impopulares. Portanto, irá digerindo a vertigem das quedas sem iniciativa específica para estancá-las.
O cientista político e sociólogo Antonio Lavareda, considerado um dos mais argutos analistas de pesquisas eleitorais do Brasil, foi quem introduziu nos questionários de pesquisas que coordenava para o governo Fernando Henrique, em 1995, uma questão: a percepção do eleitor sobre a direção do noticiário. A pergunta buscava resposta para se, na percepção das pessoas, o noticiário era mais positivo ou mais negativo para o candidato e o governo. E, depois, uma pergunta subsequente, media-se o apelo do conteúdo do noticiário, o que ficava na lembrança do eleitor.
Era uma tentativa, à época, de dar respostas às conjecturas sobre as razões de queda ou elevação da popularidade.
Por volta do ano 2000, na gestão do senador Armando Monteiro na Confederação Nacional da Indústria (CNI), Lavareda deu consultoria para a pesquisa CNI-Ibope e também introduziu essa questão no questionário dessa enquete, que permanece até hoje e podem ajudar a entender como é inevitável a queda e impossível a retomada ascendente se os conteúdos não são populares.
A pesquisa CNI-Ibope divulgada semana passada dá com precisão essas respostas sobre o que ocorreu com Temer e seu governo: 10% de ótimo e bom, 55% de ruim e péssimo; quanto à percepção da direção do noticiário, 54% a reconheceram como mais desfavorável e 12% mais favorável.
Há praticamente uma superposição dos números da avaliação do governo e do presidente com os números da percepção da direção do noticiário. Quanto à lembrança dos pesquisados sobre esse noticiário, o que memorizaram das notícias, explica tudo, principalmente o conceito de noticiário desfavorável. Em primeiro lugar, com 26%, a uma grande distância do segundo, estão na lembrança as discussões sobre reforma da Previdência; em seguida, com 9%, notícias sobre a Operação Lava-Jato; em terceiro, com 5%, notícias sobre corrupção no governo; em quarto, notícia sobre manifestações de rua; em quinto, notícia sobre greves e paralisações, e só na sexta posição vai aparecer, com 2%, saque das contas inativas do FGTS, finalmente uma notícia boa no ranking, mas, nesta posição inferior, com a força das demais difícil de ser lembrada.
É uma agenda muito dura a do governo Temer, agravada pelo fato de que até a campanha de esclarecimento sobre a reforma da Previdência, para reduzir o desconhecimento - não esta, mas outras pesquisas, apontaram que 41% apenas já ouviram falar na reforma - foi impedida pelo Ministério Público. De outro lado, a oposição à proposta mobiliza amplos setores organizados.
Temer não está disposto a mudar seu projeto, pelo qual espera ser reconhecido, para ceder ao apelo da popularidade. Sua opção é clara.
Antonio Lavareda, que concebeu essa medição das razões que levam à queda ou à subida da popularidade, lá atrás, acredita mesmo ser incompatível o reformismo com o apoio popular. "Popularidade é administrar boas notícias, agenda de reformas é mexer em interesses, os mais diversos", afirma.
Temer não vê outro caminho. O governo está firme na direção das reformas. O Congresso, este ano, não estica a corda da relação com o governo por causa de popularidade. Suas reações são pela própria natureza da reforma em pauta. Ano que vem o Congresso há de querer outros cenários, mas lá adiante, também, o governo não tem expectativa de aprovar impopularidades em ano eleitoral.
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