Raymundo Costa | Valor Econômico
BRASÍLIA - O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, costuma dizer que não é candidato a presidente, é presidenciável, mas sua virtual candidatura nas eleições de outubro entrou definitivamente na zona de turbulência eleitoral. Pela própria natureza do cargo que ocupa, o ministro é chamado com frequência a arbitrar demandas com o potencial de atingir interesses eleitorais em todas as esferas de poder. E por isso é cobrado por adversários e eventuais aliados.
Um caso exemplar é o do Rio Grande do Norte, Estado governado por um integrante do partido do ministro, o PSD. Com a folha de pagamentos do funcionalismo atrasada e a Polícia Militar em greve, o governador Robinson Faria pediu R$ 600 milhões de ajuda federal, recusada pela equipe econômica. No extremo oposto, o governador da Bahia, Rui Costa, que é do PT, levou R$ 660 milhões do Banco do Brasil, sob os protestos do Democratas (DEM), partido do prefeito de Salvador, ACM Neto.
Os dois casos resultaram em ameaças de retaliação ao governo na votação de projetos de interesse do Palácio do Planalto no Congresso, como a reforma da Previdência. Meirelles, no entanto, não vê incompatibilidade entre a função de ministro da Fazenda e a possibilidade de vir a se candidatar a presidente. Para o ministro, o fato de se reconhecer "presidenciável" não significa necessariamente que será candidato. "Estou 100% do tempo concentrado na Fazenda", diz. "tenho dito reiteradas vezes que só decidirei sobre candidatura em abril", publicou o ministro, ontem, em seu perfil no Twitter.
Na prática, o ministro tem dedicado uma boa parte de seu tempo para atividades típicas de candidato. Em agosto do ano passado, por exemplo, Meirelles esteve em Juiz de Fora (MG) para um encontro da Assembleia de Deus. Em setembro, gravou um vídeo em que pede orações pela economia brasileira aos integrantes da mesma denominação evangélica. Na semana do Natal foi a principal estrela do programa partidário do PSD no rádio e na televisão com "repercussão muito boa", segundo o presidente da sigla, Gilberto Kassab, ministro da Ciência e Tecnologia. "Vamos aguardar os desdobramentos", diz o ministro.
Meirelles soube que ia estrelar o programa partidário por volta de novembro de 2016 e contratou o publicitário Fábio Veiga para ajudá-lo na empreitada. A partir de então, uma equipe de televisão passou a registrar os passos de Meirelles para o programa. Veiga, indicado a Meirelles pelo governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSD), continua com o ministro, agora encarregado de seu perfil no Facebook. Além do publicitário, trabalha com Meirelles o jornalista Thomas Traumann, ex-ministro da Comunicação Social do governo Dilma Rousseff, que o acompanha como consultor desde o banco Original. Todos bancados por Henrique Meirelles, dono de reconhecida fortuna.
Meirelles é presidenciável, como prefere dizer, a partir da constatação que não há um candidato natural do governo e do centro político. As pesquisas apontam que há um enorme contingente eleitoral que é contra o PT, não aceita o pré-candidato Jair Bolsonaro e se desiludiu com o PSDB por causa de Aécio Neves (MG), flagrado pedindo R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, da J&F. O ministro também sabe que somente conseguirá viabilizar sua candidatura se o sentimento de satisfação das pessoas, por causa da economia, estiver em alta.
O problema de Meirelles é o pouco tempo que tem para decidir - até 7 de abril, quando nem todos os efeitos positivos esperados da recuperação econômica já serão sentidos pela população. Outros pré-candidatos têm até julho (mês das convenções partidárias para se decidir. Meirelles registrou 1% no principal cenário eleitoral da última pesquisa Datafolha. O tucano Geraldo Alckmin (SP) ficou 8%, embora já esteja no quarto mandato de governador de São Paulo e ter disputado uma vez a Presidência. As próximas pesquisas dirão se o programa do PSD vai ajudá-lo nas pesquisas. São os "desdobramentos" de que fala Kassab.
Até lá, Meirelles terá de conviver com o fato de que é visto como candidato, por mais que diga ser apenas um presidenciável, pelos agentes políticos. A participação do ministro no programa partidário do PSD, não o ajudou em nada entre os integrantes da base aliada do governo no Congresso: noviço no ramo, o ministro esqueceu de agradecê-la pela aprovação das reformas econômicas. O que é ruim para alguém que pode precisar do abrigo e das alianças numa empreitada presidencial. Os partidos aliados, inclusive, já agitam o slogan de que o eventual sucesso na economia "não tem dono".
Meirelles está convencido de que a votação da reforma da Previdência não será afetada por sua eventual candidatura, pois sua aprovação interessaria a todos os candidatos. Seus auxiliares dizem que também é bom Meirelles não atuar em certa sintonia política, como usar o cargo para agradar aliados, pois somente será candidato se for um bom ministro da Fazenda. Mas na zona de turbulência eleitoral o ministro se desgasta e não deixa de desgastar o governo.
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